“O desgaste é imenso e a vontade de desistir também. Sempre há o receio de ficar rotulada, de que a situação seja distorcida. Porém, não mais é possível fingir que o machismo e a misoginia não nos massacram cotidianamente, inclusive num tribunal considerado de vanguarda como o TRF4. Não é aceitável naturalizar comportamentos intimidadores e predatórios no ambiente de trabalho. Quando houver o reconhecimento de que situações dessa natureza acontecem sim, um trabalho consistente poderá ser feito e colegas que estão iniciando suas carreiras talvez não passem por situações como as reportadas, ou pelo menos saibam que tem a quem recorrer.”
A declaração acima é de uma das três mulheres que se uniram para denunciar situações de assédio moral e sexual no ambiente de trabalho em um dos tribunais mais conhecidos do país, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), de Porto Alegre. As denúncias foram feitas ainda em 2019 e chegaram a ser arquivadas pelo tribunal, sem que nenhuma das partes fosse ouvida. Só no final de setembro de 2020, em decisão a recurso interposto pelas servidoras, o Conselho de Administração do TRF4 determinou a abertura de sindicância contra o denunciado, reformando a decisão anterior do então presidente, Victor Luiz dos Santos Laus.
Em março, no entanto, a comissão recomendou, em seu relatório final, o arquivamento do caso, sem abertura de processo administrativo. Responsável por assessorar as servidoras ao longo do processo, o Sintrajufe/RS aponta preocupação com o fato de que a decisão signifique “sinal verde” para o desrespeito e a naturalização de comportamentos impróprios no tribunal.
Pesquisa divulgada em outubro do ano passado e realizada em parceria pelo Think Eva e pelo LinkedIn aponta que 47% das mulheres ouvidas já sofreram assédio sexual no ambiente de trabalho. A situação se mostre ainda mais grave sob recortes de raça e classe: o percentual sobe para 52% entre as mulheres negras e 49% das entrevistadas ganhavam entre dois e seis salários mínimos.
A mesma pesquisa mostra que o tema é recorrente entre as mulheres. Do total de entrevistadas, 51,4% disseram conversar frequentemente sobre isso e 95,3% afirmam saber o que é assédio sexual no ambiente de trabalho. No entanto, as próprias mulheres ouvidas no levantamento indicam dificuldade em identificar o que configura o assédio. Questionada, a maior parte delas mencionou solicitação de favores sexuais ou contato físico não solicitado como ações relacionadas a assédio.
“Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”. Assim é definido o assédio sexual no Código Penal Brasileiro, com pena prevista de um a dois anos de detenção.
Luciane Toss, advogada, professora, sócia fundadora da Ó Mulheres e da Escola Trabalho e Pensamento Crítico, lembra que, no direito do trabalho, considera-se também o assédio por intimidação. “Nessa modalidade, eu não preciso nem de toque, nem de superior hierárquico, nem de favorecimento sexual”, afirma. Ainda de acordo com Luciane, se houver manifestações verbais ou físicas, que façam com que a vítima se sinta ofendida, intimidada ou indigna, isso já é considerado assédio sexual por intimidação. “Aquele assédio sexual por chantagem, que está lá no código penal, ganha um contorno diferente na esfera trabalhista”, explica. “O lugar de trabalho não é um lugar para se brincar com o corpo das pessoas, no caso, das mulheres”, completa a advogada.
Outra das servidoras que denunciaram o colega do TRF4 detalha o episódio, ocorrido no restaurante do tribunal, onde ela aguardava uma colega pagar a conta. “No início ele se dirigiu à mesa das bandejas, mas de repente mudou de direção e veio até mim, chegou bem próximo e me falou em voz baixa: ‘se precisar de roupa, eu tenho lá embaixo’. Essa frase foi o mesmo que um soco no estômago. Jamais poderia imaginar ouvir dele esse tipo de observação, até mesmo em razão do cargo que ocupa.”
Carla* conta que respondeu, “meio sem acreditar na situação, que não estava precisando de roupa e agradeci. Aos poucos, comecei a me sentir inadequada, envergonhada e humilhada”. Logo na sequência, ela relata também ter perguntado à amiga que a acompanhava se sua blusa estava muito “chamativa ou indecente”. “Enquanto caminhava de volta ao meu setor, a sensação de humilhação crescia. Aos poucos fui percebendo que, o que acabara de acontecer, tratava-se de uma agressão gratuita e covarde. Nesse momento me senti revoltada e com raiva, pois me sentia impotente diante do ocorrido.”
De acordo com a pesquisa do Think Eva, nos casos em que a mulher reconhece ter sido vítima de assédio, existe uma distorção entre a identificação e a reação. Os principais sentimentos que as vítimas relatam são raiva, nojo, medo, impotência, vergonha, humilhação e culpa. Em 15% dos casos, sentem-se confusas e em dúvida. E 10% acham que a culpa pela violência é delas.
Roberta* conta que, a princípio, sequer cogitou reportar os fatos. “Sempre considerei um caso perdido: ‘Fazer o quê numa hora dessas?’, ‘Falar para quem?’, ‘Dei motivo porque fui simpática demais?’.” Ela conta que levou um tempo para processar tudo. Ficou muito tempo repassando os fatos mentalmente e se sentindo desconfortável. “Passei a sair do meu local de trabalho apenas em situações excepcionais, para minimizar o risco de me deparar com ele em corredores ou elevadores. Por outro lado, percebi o quão horrível é passar a vida toda sofrendo todo tipo de abuso e não tomar uma atitude. Tenho duas filhas e preciso dar o exemplo, sob pena de que elas também aprendam a ‘cartilha do silêncio’ e não exerçam os seus direitos quando necessário.”
Para Luciane Toss, a decisão de recomendar o arquivamento do caso já dá uma boa pista de porque as mulheres têm resistência em denunciar. “Isso tudo ainda está muito relacionado com o estereótipo de gênero. O fato da mulher ‘exagerar na reação à brincadeira’, ‘não entender’, ‘ter uma incapacidade de entender as brincadeiras no meio ambiente de trabalho’. Isso tudo está relacionado com esses estereótipos. O assédio sexual está colocado numa das formas de exploração do trabalho, no meu entendimento”, afirma.
Roberta lembra que, nas duas ocasiões em que esteve sozinha com o acusado sentiu dificuldade em manter o rumo da conversa, pois ele começava com excessiva descontração, passando, a seguir, aos constrangimentos. “Pessoalmente, sempre tive o costume de pensar que ‘sou boa em me fazer de desentendida’, mas ele é tão insistente que fica difícil se esquivar. Ainda, ao mesmo tempo em que eu percebia que ele estava passando dos limites (embora eu não desse um nome para isso), eu tinha sentimentos confusos, como achar que eu poderia estar vendo maldade enquanto ele apenas tentava ser ‘bem-humorado’; mas também me sentia irritada e impotente, pois ele estava agindo com uma intimidade que eu nunca dei.”
Para 78,4% das respondentes à pesquisa do Think Eva, a impunidade é a maior barreira para a denúncia, seguida de políticas ineficientes (63,8%) e medo (63,8%). De acordo com o levantamento, a sensação de impotência faz com que o silêncio e a solidão sejam os resultados mais recorrentes. Metade delas prefere dividir o ocorrido apenas com pessoas próximas; 33% não fazem nada e 14,7% optam pela demissão. “Os ambientes laborais não estão dispostos a mudar sua cultura, nem sua linguagem, nem os esquemas de favorecimento entre o masculino”, diz Luciane.
No TRF4, embora pudessem desfrutar de um grau de segurança maior do que em muitos outros ambientes, onde o temor de demissão acaba por silenciar as mulheres, as servidoras não encontraram respaldo. “Um ano depois, após muito desgaste e sofrimento decorrentes da exposição, recebemos uma decisão ridícula e machista, a qual respalda a agressão gratuita por parte de homens contra mulheres no serviço público, e o que é pior, dentro do Judiciário. O sentimento, agora, é de vergonha. Vergonha de fazer parte de uma instituição machista e preconceituosa”, diz Carla.
Para Luciane Toss, os problemas e opressões que as mulheres sofrem podem ter diferentes nuances na iniciativa privada ou no serviço público, mas destaca: “Quando tu lidas com estruturas hierárquicas de poder muito demarcadas, e isso acontece muito no serviço público, muito mais do que na iniciativa privada, eu acho que os níveis de opressão são maiores.”
O levantamento do Think Eva aponta que 63,8% das mulheres afirmam que há um ciclo de descaso e que as pessoas diminuem os casos de assédio sexual. Com um percentual exatamente igual, outro fator que faz com que as mulheres evitem denunciar é o medo de serem expostas.
No caso das servidoras do TRF4, a recente recomendação de arquivamento não foi o primeiro obstáculo encontrado. Antes de procurarem a assessoria jurídica do Sintrajufe-RS, elas tentaram resolver a questão por conta própria. “Elas não se conheciam, o que as uniu foi a situação vivida. Entraram com pedido de apuração na corregedoria, com a esperança de que o órgão não deixaria isso passar. Elas tinham uma crença na Justiça. Quando viram que o pedido sequer foi processado, elas entenderam que não dava”, relembra Mara Weber, diretora Sintrajufe/RS e da CUT/RS. Ela destaca, no entanto, o esforço da corregedora Luciane Amaral Corrêa Münch, que abriu o processo, embora não tenha conseguido que ele avançasse.
Os favorecidos
Os relatos das três servidoras do TRF4 repetem expressões frequentes em denúncias de assédio no trabalho. Além do constrangimento, do desconforto, do temor em ser culpabilizada ou simplesmente ver a denúncia não dar em nada, a naturalização dos mais diversos tipos de violência aos quais as mulheres estão expostas se repetem. Todas elas destacam o fato de o servidor, um alto funcionário do tribunal, agir de maneira completamente diferente quando não havia outras pessoas no mesmo ambiente, abordar temas pessoais, sobre relacionamento ou com conotação sexual, que nada tinham a ver com o trabalho ou simplesmente descabidos em razão de não haver qualquer intimidade entre eles.
Cibele* narra o episódio, ocorrido em 2016: “Eu sei que tu te abalas é com as questões afetivas… me diz, tu andas ficando com alguém?”, disse ele. “Eu, chocada: Não”. “Ah, mas por que não? Faz bem, relaxar… Mas tem que fazer assim, como se fosse um parque de diversões. Vai lá, te diverte, depois fecha o parquinho, recolhe as chaves, e é isso aí”, teria continuado o acusado. “Não recordo bem como a conversa seguiu, e sei também que minha mente divagou a partir de então, chocada e constrangida diante da abordagem totalmente inesperada de um chefe, com o qual eu jamais havia permitido intimidade semelhante.”
Conforme explica a advogada Luciane Toss, não se trata de mera coincidência. “Esses ambientes têm normas que favorecem o comportamento masculino”, diz. “Linguagem sexista, reforço de estereótipo de funções femininas, broderagem masculina, tudo isso faz com que os homens se sintam absolutamente confortáveis no ambiente de trabalho e as mulheres tenham que se adaptar a esses ambientes.”
Luciane traz exemplos para explicar seu argumento de que os homens vão pro mercado muito mais livres. “Eles não têm que desmarcar uma reunião porque têm que cuidar do filho, não precisam desmarcar um compromisso porque têm uma questão familiar, estão livres pra ser bem sucedidos no mercado”. Conforme explica a advogada, os ambientes de trabalho vão reforçar esses papéis, vão reforçar o papel de que a mulher não está disponível e por isso tem que se submeter mais e a mais regras do que os homens.
Conselheira do Conselho Nacional de Justiça e Coordenadora do Comitê de Prevenção e Enfrentamento do Assédio Moral e do Assédio Sexual e da Discriminação no Poder Judiciário, a desembargadora Tânia Regina Silva Reckziegel também entende que a cultura patriarcal predominante em nossa sociedade impõe desafios às mulheres. “Essa cultura infelizmente ainda repercute, por vezes, no modo de tratamento de uma denúncia de violência de gênero. Mas é preciso dizer que a naturalização da violência contra a mulher vem sendo combatida com as ações de conscientização e diálogos, havendo, inclusive, introdução do estudo de gênero nas diferentes esferas de âmbito nacional e internacional”, defende.
Cibele, apesar de todo desgaste que o episódio já lhe trouxe, afirma que a vontade de prosseguir nesse embate não passa por desejar a punição do acusado. “Minha vontade é de fazer com que a conduta em si, que ora denunciamos, siga sendo debatida em outros âmbitos; essa conduta, machista e misógina sim, que para muitos ainda parece inofensiva, mas que molesta e que é causadora de feridas seculares nas mulheres. O objetivo é que essa luta, que é um grito de ‘basta!’, não seja descredibilizada, que as mulheres não saiam envergonhadas, de cabeça baixa mais uma vez. Que essa causa seja levada a sério e discutida onde isso se mostrar possível, que se propague. Que se aceite e que se afirme, enfim, que, se são tantas as que reclamam (e que seguirão reclamando), então a solução não está em calar o ‘barulho’, e sim em corrigir a postura que agride.”
A diretora do Sintrajufe/RS diz que, formalmente, essas três colegas são pioneiras em denunciar casos de assédio no Judiciário gaúcho. “Que a coragem delas inspire outras. Muitas vezes, as mulheres dizem ‘não vai dar em nada’, mas não é assim. Esse processo de denúncia é curativo, porque tu vai ter um desfecho, alguma coisa nesse caminho sempre vai avançar”, acredita.
Enfrentamento ao assédio no trabalho
No final de 2020, o Conselho Nacional de Justiça, por meio do gabinete da conselheira Tânia Reckziegel, instituiu a resolução nº 351/2020 determinando que cada tribunal crie uma comissão de prevenção e enfrentamento ao assédio moral e à discriminação no poder Judiciário, com participação de magistrados, servidores e colaboradores. Nacionalmente, o CNJ coordena esse trabalho por meio do Comitê de Prevenção e Enfrentamento do Assédio Moral e do Assédio Sexual e da Discriminação no Poder Judiciário. A política de enfrentamento ao assédio e à discriminação determina a abertura de canal de escuta e de acolhimento nos tribunais, assim como a criação de programas de capacitação sobre o tema.
No entendimento da desembargadora, essas comissões criam um canal de diálogo mais acessível às vítimas. “A multirepresentatividade que se exige na composição das comissões, aliás, tem por fim justamente facilitar esse canal de comunicação entre vítima e integrante da comissão, pois há entre eles e elas uma padronização horizontal – de mesmo nível na estrutura organizacional -, conferindo, portanto, uma maior sensação de confiança para denúncias e combate aos casos de violência”, explica.
Procurado, o TRF4 informou que, no tribunal, os integrantes da comissão foram nomeados em setembro do ano passado: o desembargador federal Luiz Fernando Wowk Penteado como presidente, uma juíza federal indicada pela Ajufergs, um servidor indicado pelo Sintrajufe e MPU, outro pela Comissão Permanente de Acessibilidade e Inclusão, além de outros dois servidores eleitos pelos pares. Ainda de acordo com a entidade, os trabalhos ocorrem conforme o previsto pelo CNJ e foram realizados “vários eventos de capacitação e discussão sobre a temática”.
O caso no TRF4 foi parar no CNJ. “Apresentamos, no Conselho Nacional de Justiça, um Procedimento de Controle Administrativo, denunciando como ilegais diversos encaminhamentos dados pela Presidência do TRF4 desde a apresentação da denúncia pelas três funcionárias”, explica o advogado Felipe Neri, representante das servidoras.
O advogado também apresentou recurso ao Conselho de Administração do TRF4. O pedido é para que as investigações sejam delegadas para outro órgão do Poder Judiciário, na forma prevista no art. 143, §3o da Lei no 8.112/1990, assegurando-se, ainda, a oitiva das denunciantes e das testemunhas sem a presença do investigado. Outra representação também foi feita junto ao Ministério Público Federal.
Entre as irregularidades apontadas pelo advogado está o fato de que o denunciado não só esteve presente em todas as audiências, como inquiriu as servidoras que denunciaram assédio e as testemunhas.
Mara Weber destaca que o Sintrajufe/RS não vai voltar atrás. “Não estamos nem no meio do caminho. O processamento dessas denúncias só aconteceu porque a gente foi pro MPF e exigiu a instauração da comissão. Agora, estamos levando essa discussão pro CNJ e vamos continuar fazendo pressão. De qualquer jeito, não vai passar em branco”, diz.
O Sintrajufe/RS observa ainda que, em seu relatório final, a comissão de sindicância reconhece que houve “situações de comportamento inadequado” por parte do denunciado. A mesma comissão também qualifica as falas e comentários do denunciado como “brincadeira desagradável”, “gosto duvidoso”, “impróprio”, “reprovável”.
Já sobre os depoimentos das servidoras, a comissão afirma entender, no mesmo relatório, que sejam fruto da “sensibilidade pessoal de cada um”. Há, inclusive, questionamento sobre o comportamento nos dias seguintes ao assédio, que “não sugerem um quadro de abalo de quem tenha sido assediado”.
“Em 2021, com uma convenção da OIT que estabelece assédio moral e assédio sexual em vários níveis e de várias formas, é inconcebível que um tribunal arquive um procedimento usando o argumento de que não se pode nem brincar. Isso não deve ser aceito de forma nenhuma”, defende Luciane Toss.
Convenção 190
Embora seja signatário da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Brasil não ratificou até agora a Convenção 190, que indica regras e parâmetros para coibir a violência e o assédio no mundo do trabalho, com destaque para o recorte de gênero.
A Convenção 190 foi assinada em 2019, nos 100 anos da OIT, durante conferência realizada em Genebra. Debatida por cerca de quatro anos, é considerada histórica no caminho para proteger trabalhadoras e trabalhadores de todas as formas de assédio e violência nesse ambiente.
Luciane Toss lembra, no entanto, que enquanto não é ratificada, a convenção “fica apenas na discussão”, no Brasil. “Quando se aprovou a convenção 190, no discurso de abertura, Guy Ryder (diretor-executivo da OIT) disse que as violências e os assédios contra as mulheres acontecem em todos os ambientes, mas que encontram, no meio ambiente de trabalho, um ambiente de favorecimento da ocorrência.”
Luciane destaca ainda que a composição desses espaços de trabalho também impacta na maneira como as situações de assédio são conduzidas. Diagnóstico sobre a participação feminina no Poder Judiciário, divulgado pelo CNJ em 2019, traz alguns dados importantes. Embora sejam mais da metade das servidoras, 56,2% de acordo com o levantamento, as mulheres vão ficando pelo caminho na escalada aos mais altos postos do Judiciário. Elas correspondem a 44% dos juízes substitutos, 39% dos juízes titulares, 23% dos desembargadores e apenas 16% dos ministros de tribunais superiores. No TRF4, dos 27 desembargadores apenas seis são mulheres.
É exatamente esse ambiente que precisa ser modificado, segundo explica a advogada. “É muito difícil uma mulher que está sofrendo assédio sexual procurar o seu chefe pra resolver isso. Muitas vezes, porque o seu superior tem uma relação com esse chefe muito melhor do que ela. A gente tem que desmasculinizar o ambiente de trabalho, o mercado de trabalho e os espaços laborais das mulheres. As mulheres não se sentem confortáveis porque elas não são acolhidas pelo meio ambiente de trabalho. Elas entram no meio ambiente de trabalho quase como intrusas. A mulher fica numa incumbência de provar o tempo todo que ela supera as dificuldades, e uma delas é essa convivência masculinizada.”
Para a diretora do Sintrajufe/RS, a estrutura patriarcal do Judiciário vem da formação do Estado, em que as mulheres não tinham vez nem voz. “É uma conquista que a gente vai construindo aos pouquinhos e o combate a essas violências inclui a discussão da democratização do Judiciário, do papel dele na sociedade. Vai ser o papel de garantidor das elites, do mercado financeiro ou ele vai ser um promotor de cidadania, garantidor de direitos? Isso tudo está em discussão.”
Procurado para falar sobre a sindicância, o TRF4 respondeu à reportagem que “é tema sigiloso e não podemos informar nada a respeito para a preservação da identidade e intimidade de todos os envolvidos”.
*Os nomes foram alterados para preservar a identidade das servidoras