a gente quer expressar a América Latina da melhor forma possível através da música
A banda Macumbia, de João Pessoa (PB), tem como essência o intercâmbio entre latinidades. Com oito integrantes, iniciou com um venezuelano no vocal, e tem hoje músicos do Brasil e da Argentina, além de um estadunidense.
"Se tornou algo engraçado e bem diferente que virou o ponto da banda, bem forte. O pessoal começou a curtir demais essa questão da dupla nacionalidade, uma hora fala espanhol, uma hora fala português. E a tentativa de se fazer uma salsa, uma cumbia misturada com carimbó, já pensou? E quando a gente junta, dá aquela coisa dançante que a gente pode chamar de música latina", define Chico Vasconcelos, baterista e diretor executivo da banda.
Linguagem para além da língua
A integração latina na banda Macumbia vai na contramão do isolamento cultural brasileiro em relação aos vizinhos hispanoamericanos. A diferença de idioma tem papel fundamental, mas a explicação para o muro simbólico vai além disso.
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"Eduardo Lourenço, filósofo português, fala de uma soberba brasileira. É meio antipático um português dizer isso, mas a gente falando aqui fica mais aceitável, que seria essa visão autocentrada do Brasil. O Brasil se pensa como um país continental, um país do futuro, então toda essa mitologia em torno da nacionalidade bloqueia esses contatos que são tão importantes, tão ricos", aponta Marcelo Ferraz, professor de Teoria Literária, da Universidade Federal de Goiás (UFG).
Entre as décadas de 1960 e 1970, alguns movimentos da música brasileira desafiaram fortemente esse isolamento. Impulsionados pela Revolução Cubana e a luta em comum contra ditaduras, artistas expressaram a ideia de uma identidade latinoamericana.
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"Belchior quando grita, quando proclama essa identidade latinoamericana, 'Sou apenas um rapaz latinoamericano', esse rapaz latinoamericano é também um retirante nordestino. E isso vai aparecer de uma forma muito forte nos mineiros, no Clube da Esquina. Várias canções emblemáticas do grupo falam desse latinoamericano, e o próprio Milton Nascimento vai ter muitas parcerias, com a Mercedes Sosa, principalmente, mas também com outros compositores da América Latina e vai ser uma figura assim, chave nessa circulação", contextualiza Marcelo.
Indústria cultural
O contexto político que fortaleceu a união cultural entre Brasil e América hispânica foi esvaziado com a ascensão neoliberal e o domínio dos Estados Unidos na indústria cultural, a partir dos anos 1990.
Atualmente, a internet pode ser um meio para que pontes sejam retomadas e fortalecidas, na opinião de Chico Vasconcelos.
"Hoje a gente tem ouvintes na América Latina inteira, o país que mais escuta a gente é o México. A gente tem aquele statuszinho no Spotify, México, Argentina, Venezuela, toca muito e a latinidade traz isso. Traz a luta do povo brasileiro, traz a luta do povo latinoamericano que no final quer dançar, quer desafogar alguma coisa, quer curtir, quer interagir. E a gente quer expressar a América Latina da melhor forma possível através da música, entre linguagens e ritmos a gente tenta combinar", afirma Chico.
Edição: Daniel Lamir