No Brasil de hoje, segundo o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional, quase 12% das crianças de 5 a 10 anos e que estão na atenção primária do SUS, têm peso elevado para a faixa etária. Mais do que um problema isolado, a questão está relacionada às condições do meio em que jovens cidadãs e cidadãos vivem.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que, até 2025, o número de crianças obesas no planeta pode chegar a 75 milhões. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a obesidade aumentou mais de quatro vezes entre 1989 e 2009 no Brasil.
Em um estudo de doutorado, a pesquisadora em nutrição da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Ariene Silva do Carmo, aponta que a situação social tem peso direto no desenvolvimento desse quadro. Em locais mais violentos e com menos opções de lazer, o problema é mais grave.
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Ela realizou um levantamento com 717 estudantes do 4º ano do ensino fundamental, matriculados em escolas municipais de Belo Horizonte (MG). Realizada antes da pandemia, a pesquisa observou que 12% das crianças, com idades entre 9 e 10 anos, apresentavam quadro de obesidade.
Ariene, que já tinha experiência em estudos sobre o impacto do ambiente familiar na obesidade infantil, decidiu dar um passo além e avaliar a relação com a comunidade ao redor. Ela notou que a segurança da vizinhança, a proximidade de pontos de venda de ultraprocessados e o tempo de uso de aparelhos eletrônicos estão ligados à obesidade.
Os fatores ambientais observados pela pesquisadora são determinantes na mesma medida que o contexto familiar. "O principal fator que fez aumentar a prevalência da obesidade em quatro décadas é o ambiente obesogênico", alerta a pesquisadora.
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Ariene explica que esses ambientes não favorecem os comportamentos saudáveis, não oferecem locais seguros para exercício e convivência e têm acesso facilitado ao comércio de alimentos ultraprocessados.
"No ambiente familiar, as crianças cujos pais tinham comportamento não saudáveis tinham uma chance maior de obesidade. Em relação ao entorno das casas, eu descobri que as crianças que moram em regiões com um conjunto de fatores tinham uma prevalência maior", conta.
A pesquisadora concluiu que os espaços públicos para atividades físicas são fatores protetores apenas em bairros seguros. "Não adianta ter aquele espaço ali sem um ambiente seguro. As famílias não se sentem à vontade de permitir que as crianças frequentem esses espaços", pondera.
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Ariene aponta as políticas intersetoriais como solução para o quadro. "Não é só a política de educação, que fala para o indivíduo comer melhor. Isoladamente, isso não adianta. A gente precisa de políticas que tornem as cidades saudáveis", argumenta.
A tese da pesquisadora sinaliza que as ações de educação, a atuação dos sistemas de saúde regionais, as medidas de infraestrutura e de segurança precisam caminhar em conjunto pra enfretamento do cenário. " É importante que os gestores tenham essa responsabilidade. É possível fazer políticas em nível das cidades", destaca.
A entrevista completa com a pesquisadora foi ao ar no Programa Bem Viver. Ouça na íntegra no tocador de áudio logo abaixo do título desta matéria.
Edição: Vivian Virissimo