O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) do Rio Grande do Sul inaugura oficialmente o Armazém do Campo Porto Alegre nesta sexta-feira (4), às 19 horas. Desde o dia 1º de junho, o espaço na Rua José do Patrocínio, nº 888, na Cidade Baixa, já está atendendo a população com todos os cuidados sanitários.
Além do atendimento aos clientes na loja física, também está com tele-entrega pelo WhatsApp, Instagram, Facebook, e-mail e telefone. Segundo o coordenador do Armazém do Campo Porto Alegre, Sidnei dos Santos, os clientes que compram os produtos da reforma agrária gostam de ser atendidos por alguém, gostam de ter um feedback, querem dialogar.
“Por isso que a gente optou em permanecer com esses canais, o canal do WhatsApp, do e-mail e do telefone, enfim, essas ferramentas que a gente consegue dar um feedback mais direto.”
Inauguração terá ato político cultural virtual
O ato Político Cultural será realizado de forma online e transmitido pelo YouTube da Rede Soberania e o Facebook do Armazém do Campo Porto Alegre e do Brasil de Fato RS.
O evento contará com a participação de representantes da sociedade civil, política e cultural, como João Paulo Rodrigues, dirigente nacional do MST; Benedito Tadeu César, cientista político e membro do Comitê em Defesa da Democracia; Catia Grisa, professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Manuela D'Ávila, jornalista, escritora e política brasileira; Matheus Gomes, vereador de Porto Alegre (PSOL); e Bela Gil, culinarista e apresentadora. Também haverá manifestações dos outros Armazéns do Campo do país.
O momento cultural trará um show direto do armazém com o Grupo Unamérica, criado há 38 anos pelos músicos Dão Real e Zé Martins. Também participam através de vídeos MC Pereira e as Cantadeiras.
Livraria presta homenagem a Marielle Franco
Além da comercialização de alimentos, o Armazém do Campo terá uma pequena livraria que recebeu o nome de Espaço Marielle Franco, em homenagem à vereadora carioca assassinada em 2018. Segundo Sidnei, a princípio, serão expostos livros da Editora Expressão Popular, mas estará aberto para obras de autores do campo progressista.
Além da livraria, também haverá um café-bar, onde será oferecido o café, a cerveja, a cachaça. “Será um espaço para as pessoas que quiserem comemorar seu aniversário ou estar com amigos, e, quem sabe, se desafiam a cozinhar, teremos uma cozinha equipada”, destaca Sidnei.
Segundo ele, a ideia é promover atividades do armazém, uma vez por semana, assim que as condições sanitárias permitirem.
“Queremos oferecer algum tipo de prato para que a comunidade possa compartilhar conosco. A gente também vai ter aqui um espaço para reuniões. Só chegar aqui, vai ter mesa, vai ter um espaço bem tranquilo para as pessoas conversarem, tomar um café, enfim. E também teremos a realização de eventos como lançamento de livros, exposição de fotos, oficinas...”
Sidnei destaca que a intensão é agregar valor não só aos produtos da reforma agrária e da agricultura familiar comercializados, mas agregar valor às relações humanas e principalmente às articulações do campo de esquerda.
“Nosso objetivo é fortalecermos a luta contra esse governo genocida, e na busca da construção de políticas estruturantes para as organizações sociais e a classe trabalhadora.”
Concepção dos Armazéns do Campo teve origem em Porto Alegre
Segundo um dos coordenadores nacionais dos Armazéns do Campo, Ademar Paulo Ludwig Suptitz (Schusky), a concepção dos espaços nasceu em Porto Alegre com a Loja da Reforma Agrária, localizada desde 2002 na banca 13 do Mercado Público. “Toda a nossa logística e gestão foi pensada a partir dessa primeira experiência.”
Graduado em História pela UFPB e Especialista em Agroecologia pela USP/ENFF - Escola Nacional Florestan Fernandes, Schusky, como é conhecido, coordena também o primeiro Armazém do Campo, criado em 2016, em São Paulo.
“Atualmente temos lojas em São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Recife, Caruaru, São Luís e Porto Alegre. Além disso, criamos sites de e-commerce e funcionamos como atacado. E já há umas 50 lojas na fila para abrir nos próximos anos. A ideia é que as lojas que existem hoje ajudem a ampliar para outras cidades dos estados”, explica.
Schusky define os armazéns como o lugar onde se coloca na prateleira o fruto da Reforma Agrária. “Buscamos fazer um contraponto à visão do MST divulgada pela grande imprensa, como um movimento de invasores, vagabundos" ,explica.
"Pra isso, construímos uma articulação com a luta do campo, da agricultura familiar, mas também com indígenas, ribeirinhos, movimentos sociais da cidade. Não queremos só uma loja, mas sim um espaço onde quem se identifica com a proposta se sinta acolhido. Espaço para confraternização com dimensões culturais, como a música, o teatro, a literatura, a culinária, etc.”.
Ele também lembra as diversas ações de solidariedade realizadas pelos armazéns no país. “Os armazéns de Recife e Rio de Janeiro tem o projeto Marmitas Solidárias. No Recife já foram doadas 500 mil marmitas desde o ano passado. No Rio foram umas 300 mil marmitas. Em São Paulo distribuímos cerca de 50 mil cestas básicas. Em São Luís são servidos cafés da manhã para a população em situação de rua. Em Porto Alegre, a Loja da Reforma Agrária também distribuiu cestas básicas e envia alimentos para a comunidade Mirabal, somente de mulheres.”
O coordenador nacional afirma que o objetivo é tornar os Armazéns do Campo uma referência no debate agroecológico e orgânico.
“Estamos vendo um novo comportamento individual com mais pessoas optando pelo alimento orgânico. Cerca de 15 produtos mais vendidos nas nossas lojas são mais baratos que no sacolão, apesar da agricultura familiar não ser subsidiada pelo governo federal como o Agronegócio, que recebe cerca de R$ 300 bilhões por ano e tem 100% de suas dívidas perdoadas.”
Produtos dos assentamentos com vendas on-line
Uma das principais iniciativas para conseguir vender seus produtos durante a pandemia foi a criação dos sites de compras on-line, o E-commerce, um aplicativo que proporciona a compra dos produtos na palma da mão e entrega na porta de casa.
O Armazém do Campo em Belo Horizonte lançou o seu em fevereiro deste ano. Café Guaií, Arroz Orgânico Terra Livre, Feijão agroecológico dos assentamentos e acampamentos, Suco Agroecológico, Chocolate Terra Justa, são algumas das mais de 600 variedades de produtos.
E todos os produtos têm uma história de luta e resistência, assim como o MST. O chocolate Terra Justa, por exemplo, é fruto das antigas fazendas falidas de cacau por conta da vassoura de bruxa e resgatadas após as ocupações do MST e o desenvolvimento da produção agroecológica, no Baixo Sul da Bahia.
Já o famoso Guaií, é o café de primeira linha nas trincheiras da resistência do acampamento Quilombo Campo Grande, no Sul de Minas Gerais. O arroz vem das cooperativas gaúchas, que solidariamente seguraram o preço deste alimento tão básico na mesa brasileira, mesmo pressionadas pelos aumentos abusivos causados pelos desmandos de Bolsonaro.
“O Armazém do Campo trabalha para que os frutos da luta pela terra cheguem a toda classe trabalhadora, essa é nossa contribuição para que o país supere este tempo de genocídio, volta da fome e desequilíbrio ambiental causado pelos fascistas. Toda população merece se alimentar sem veneno, este é o resultado da nossa luta', defende Schusky
Maranhão
A capital do Maranhão, São Luís, também tem seu Armazém do Campo. Seu funcionamento teve início em 6 de julho de 2019, no espaço do MST, conhecido como Espaço Solar Cultural da Terra Maria Firmina dos Reis, que também abriga a Livraria Balaios e o Bar Café Literário, em que são realizados debates sobre questões políticas e análises de conjunturas, regadas à cerveja e poesia.
É impossível se referir a um espaço, sem pensar nos demais. Portanto, o espaço foi pensado pelo Movimento abrangendo vários dos seus setores, como garante a dirigente estadual, no setor de produção do MST no Maranhão, Letícia Viana.
“Tem parte do Armazém do Campo, que foi pensado pela coordenação do Solar Cultural da Terra, com a tarefa mais específica no setor de produção do estado. Então, na questão econômica, para os fornecedores assentados, mas, principalmente para a divulgação e o debate da Reforma Agrária Popular com a sociedade”, diz ela.
Armazém do Campo, um espaço de solidariedade
Quando começou a pandemia, o Armazém do Campo de São Luís iniciou atividades importantes de solidariedade, como o café solidário, juntamente com outros parceiros e voluntários da cidade.
“É por meio das vendas de produtos dos assentamentos e dessas atividades que o Solar Cultural da Terra Maria Firmina dos Reis e o Armazém do Campo têm se tornado referência da produção agroecológica e de arte”, destaca Viana.
Ruth Tereza Rodrigues dos Santos, da coordenação do Armazém do Campo do Rio de Janeiro, inaugurado em setembro de 2018, bem no coração da Lapa, conta que por conta da pandemia, tiveram que se reinventar e se desafiar nas entregas diárias à domicílio. “Trabalhamos de portas fechadas, mas com a possibilidade de agendar visita e retirada de pedidos.”
Segundo ela, a recepção no Rio de Janeiro foi e é muito positiva. Ela afirma que a demanda pela produção oriunda da luta pela terra, sem veneno, sem exploração e em harmonia com a natureza é cada vez mais crescente.
“E nossa tarefa é também popularizar o acesso a esses alimentos à maior parte da cidade e para a classe trabalhadora.”
Mas, pra além da comercialização, Viana ressalta a ação das marmitas solidárias, que dialoga diretamente com a população que mais vem sofrendo com a pandemia e a alta dos alimentos.
“Entregamos as marmitas nas ocupações urbanas, dialogamos também com o Muca, Movimento Unificado dos Camêlos. É um momento que estamos conversando diretamente com a classe trabalhadora da cidade sobre a necessidade da Reforma Agrária Popular.”
Para Ruth, o desafio de manter um Armazém do Campo em funcionamento é árduo, mas a beleza de estar fazendo um bom trabalho certamente é maior. Sobre o novo espaço em Porto Alegre, saúda a iniciativa. “Bons ventos, bons trabalhos e viva a Reforma Agrária Popular! Que venham mais Armazéns do Campo por todo o país!”
Pernambuco
O Armazém do Campo de Recife foi inaugurado no dia 30 de maio de 2019, na parte antiga de Recife, no bairro de Santo Antônio. Segundo o coordenador do espaço Ramos Figueiredo, o armazém está de frente pro rio, o que contribui bastante enquanto espaço da cultura.
Como os demais armazéns, também tem o mercado, a livraria e o café-bar, que hoje é o espaço da solidariedade. “Nós estamos com o bar fechado e há um ano a gente atua distribuindo comida para a população em situação de rua. Já doamos mais de 500 mil refeições. Esse tem sido um dos grandes braços de atuação do armazém. Ele extrapolou o limite do espaço de comercialização e se transformou no grande espaço de convivência e organização da esquerda em Recife”, ilustra.
Para a nova experiência de Porto Alegre, Ramos manda uma mensagem de ânimo. “Num momento de tanta crise que a gente vive enquanto sociedade, com esse desgoverno, mais um armazém ser criado, só mostra a força que a gente tem como movimento, mostra a capacidade de articulação e de diálogo com o mundo urbano tão necessário nesse momento.”
Fonte: BdF Rio Grande do Sul
Edição: Marcelo Ferreira