No último sábado (29), movimentos populares, estudantes e sindicatos realizaram manifestações em todo o país pedindo agilidade na vacinação, pagamento de auxílio emergencial no valor de R$600 e o impeachment de Jair Bolsonaro.
No Recife, o ato que levou cerca de cinco mil pessoas às ruas do centro da cidade, transcorreu de maneira pacífica, mas acabou brutalmente atacado pela Polícia Militar, que deixou dois trabalhadores cegos e muitas pessoas feridas.
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O governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), afirma que a ação não foi autorizada e o comandante da Polícia Militar de Pernambuco foi retirado do cargo.
A militante Vitória Genuíno, que integra a Frente Povo Sem Medo (um dos grupos que organizaram o ato), lembra que os manifestantes se esforçaram para seguir normas sanitárias básicas e respeitar o decreto estadual de restrições nos fins de semana.
“Obedecemos às normas, não colocamos carros de som. Inclusive houve policiamento na concentração do ato. Depois fizemos a caminhada e, no fim, fomos surpreendidos com aquela emboscada realizada na ponte”, lembra ela.
“É necessário descobrir quem ordenou aquela ação. O governador faz a jogada de se eximir da culpa, mas não toma medidas concretas para culpabilizar quem teria ordenado aquilo”, diz.
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Elisa Maria, da Frente Brasil Popular, lembra que a maioria dos manifestantes foram feridos pelas costas. “Os dois homens que perderam a visão estavam só passando pelo local. Muita gente que estava na parada de ônibus ou saindo da igreja e foram atacadas pela polícia. Foi um cerco grande”, diz.
Vitória Genuíno cobra agilidade na punição dos agressores. “De imediato o governador Paulo Câmara (PSB) precisa cumprir o seu papel e ter controle sobre a polícia. Tem que identificar os culpados e punir. E responder para a sociedade quem deu o comando para aquele ataque”, afirma.
Tanto Vitória como Elisa afirmam que as frentes conversaram sobre a possibilidade de uma ação de enfrentamento por parte da polícia, após a recomendação do Ministério Público (MPPE) para não haver o protesto. “Suspeitamos que alguns setores de direita, por dentro das instituições, poderia legitimar uma ação daquela. Da mesma forma que o MP nos notificou, imaginamos que a polícia poderia fazer algo”, diz Elisa.
Ideologia bolsonarista
Sobre a possibilidade de a ação policial ser fruto de indisciplina hierárquica e ideologia bolsonarista infiltrada na corporação, Elisa admite esse temor e cobra ações efetivas do Executivo estadual.
“São vários fatores que apontam para essa possibilidade de ‘comando paralelo’ bolsonarista dentro da Polícia Militar. Caso seja verdade, o Governo do Estado precisa atuar para desmontar isso”, diz ela, que vê a desmilitarização como caminho. “Tem que criar uma outra cultura dentro das polícias para modificar a forma que a polícia age. Tem que ir na raiz do problema. A Polícia Militar é uma herança da ditadura”, lembra.
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Vitória menciona as páginas “não-oficiais” que as corporações possuem nas redes sociais. “Nas páginas ‘informais’ desses batalhões eles publicaram vídeos e fotos, uma hora antes, dizendo que estavam ‘se preparando’. Após a ação também espalharam mentiras, dizendo que nós os atacamos com pedras e que por isso eles teriam reagido”, conta.
Na noite do sábado a página da Rocam – Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas (@rocam_pmpe) chegou a publicar um vídeo de policiais atirando e lançando bombas contra manifestantes. Na legenda, a Rocam escreveu: “combatendo o comunismo”. O vídeo foi apagado horas depois, seguido por uma imagem que diz: “a Polícia não tem lado na política”, o que também foi apagado posteriormente.
Elisa Maria também vê o conteúdo dessas páginas nas redes sociais como elemento que reforça a “ideologia” de milícia e o alinhamento político.
“Eles usam meios de comunicação públicos paralelos, extraoficiais, para divulgar imagens deles matando pessoas, mensagens se vangloriando das suas violências e excessos, totalmente em desacordo com a lei. São fortes os indícios dessa organização paralela, que vem ganhando força e está aliada a um projeto político nacional fascista. Isso nos preocupa demais”, avalia.
Ela lembra que Jair Bolsonaro vocaliza e organiza esses setores. “O fascismo é um movimento político com força social. Não é só Bolsonaro, mas uma parcela significativa da população convencida por essas ideias”, diz ela.
Elisa Maria espera que as punições exponham os grupos bolsonaristas que estão atuando dentro das instituições. “A violência foi da polícia, mas também no Ministério Público tivemos promotores defendendo a ação policial, assim como deputados. Eles precisam ser questionados sobre apoiarem a violação do direito à livre manifestação e o direito à vida”, diz Maria, exigindo ainda que se deixe claro de onde partiu o comando para aquela violência.
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Ela também espera que o fato provoque mudanças a médio prazo. “Um caminho importante é a participação popular, da sociedade civil, em todas as decisões que dizem respeito à segurança pública. É uma estrutura que precisa ser revista como um todo, passando pela formação desses policiais e pelo imaginário do ‘para que serve’ a polícia”, conclui.
Até esta quarta (2), sete policiais foram afastados, segundo o governador Paulo Câmara: quatro envolvidos na agressão à vereadora Liana Cirne (PT) e o comandante da operação foram afastados ainda no sábado; e na noite desta terça (1º) foi a vez dos dois policiais que atiraram nos olhos de dois cidadãos, que perderam a visão.
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Além dos sete, o comandante da Polícia Militar em Pernambuco, Vanildo Maranhão, também perdeu o cargo. O único nome tornado público é o do agora ex-comandante da PM, mas os outros sete seguem mantidos em sigilo.
Atacada por policiais, a vereadora Liana Cirne (PT) falou, em entrevista na segunda-feira (31), sobre a possibilidade de o ataque ter sido uma ação de fundo ideológico por parte da PM.
“Isso acende um sinal amarelo para todo o Brasil. A Polícia não pode desrespeitar o seu comandante em chefe, o governador do estado. Serem afastados é pouco”, diz a vereadora, que cobra que Paulo Câmara (PSB) e Luciana Santos (PCdoB) mostrem com ações que não foram coniventes com aquele ato.
O Governo de Pernambuco
A vice-governadora Luciana Santos (PCdoB), primeira representante do Governo do Estado a falar sobre o caso, condenou a ação da PM e prometeu “tirar as consequências do acontecido”.
O governador Paulo Câmara (PSB) realizou reunião com a Secretaria de Defesa Social (SDS) e prometeu afastar parte dos envolvidos. “O oficial comandante da operação, além dos envolvidos na agressão à vereadora Liana Cirne, permanecerão afastados de suas funções enquanto durar as investigações”, disse o chefe do Executivo estadual, em vídeo.
No domingo (30), após confirmação de perda da visão das duas vítimas mais graves, o governo informou que vai pagar indenização financeira aos dois.
O Governo do Estado e a SDS ainda não informaram nomes dos envolvidos, quem já foi efetivamente afastado e nem foi explicado de onde partiu a ordem para aquela ação. O atual secretário de Defesa Social é o advogado e policial federal Antônio de Pádua Cavalcanti. Nas redes sociais, a SDS mostrou que o secretário e outros acompanhavam a ação por videomonitoramento.
Na manhã desta terça (1º), de Pádua se reuniu a portas fechadas com deputados estaduais na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe). A reunião foi convocada informalmente pelo presidente da Alepe, o deputado Eriberto Medeiros (PP).
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Estavam presentes também o líder do governo, Isaltino Nascimento (PSB); as deputadas Teresa Leitão (PT), Jô Cavalcanti das Juntas (PSOL), Priscila Krause (DEM) e outros. A imprensa sequer foi autorizada a entrar no prédio da Assembleia. Segundo reportagem do NETV/Globo, o secretário Antônio de Pádua entrou pelo estacionamento dos fundos da Alepe e não falou com ninguém.
Desde a segunda (31) o Brasil de Fato Pernambuco também entrou em contato com a SDS, questionando sobre o efetivo afastamento dos envolvidos, seus nomes e a avaliação da secretaria sobre a ação realizada no último sábado. Até o momento, no entanto, a SDS não nos respondeu.
As vítimas
Dois homens perderam a visão de um dos olhos devido a tiros de bala de borracha. Daniel Campelo da Silva, de 51 anos; e Jonas Correia de França, 29; sequer estavam na manifestação.
Estavam no centro da cidade comprando material para trabalho. Daniel Campelo cruzava a ponte em direção ao bairro da Boa Vista, quando um policial disparou um tiro de bala de borracha no seu rosto.
Após cair no chão, manifestantes correram para socorrê-lo, mas a polícia atirou também contra essas pessoas.
Minutos depois, após o protesto já haver recuado, os policiais já estavam na rua da Aurora. Jonas Correia empurrava sua bicicleta cruzando a ponte no sentido Santo Antônio, enquanto filmava a PM disparando tiros e bombas contra manifestantes.
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Um policial a apenas dois metros de Jonas disparou contra o seu rosto. Ambos estão no Hospital da Restauração, devem passar por cirurgia, mas os médicos avaliam que os danos já comprometeram a visão dos olhos atingidos.
A advogada, professora de Direito e vereadora do Recife, Liana Cirne (PT), que teve spray de pimenta disparado diretamente contra seu rosto quando discutia na janela de uma viatura com policiais.
O fotojornalista João Carlos Mazella (“JC Mazella”) fazia seu trabalho na manifestação, fotografou os ataques da polícia contra as pessoas, mas os policiais o cercaram e obrigaram a apagar parte dos registros. Ainda em Pernambuco, houve manifestação de rua também em Petrolina, Sertão do estado, onde a Polícia atuou dentro da lei.
Fonte: BdF Pernambuco
Edição: Monyse Ravena