ENTREVISTA

Apenas 2% do território da Caatinga é ocupado por áreas de conservação

Bioma têm sido o menos priorizado em termos de investimentos dentre outros, aponta biólogo Severino Ribeiro

Brasil de Fato | Petrolina (PE) |

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Caatinga possui inúmeras espécies de plantas e mais de 500 espécies de animais - Foto: Mateus Pereira/Governo da Bahia

Na Semana do Meio Ambiente, o programa Prosa e Fato tratou sobre a importância da preservação da caatinga, bioma exclusivo do Brasil. Apesar de muitas vezes ser vista como improdutiva por estar em lugares de clima quente e seco, a caatinga possui inúmeras espécies de plantas e mais de 500 espécies de animais. 

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A região compreende de 750 mil a 1 milhão de km² - cerca de 10% do território brasileiro, e está presente nos estados do Maranhão, Rio Grande do Norte, Bahia, Ceará, Piauí, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Minas Gerais. Mas apenas 2% desse território é ocupado por áreas de conservação, o que mostra o quanto o bioma é pouco valorizado. 

Para falar sobre os impactos da destruição deste bioma, a edição do programa entrevistou Severino Ribeiro, presidente do Centro de Pesquisas Ambientais do Nordeste (CEPAN) e pós-doutor em Biologia. 

Confira os principais trechos:

Distribuição de investimentos para a preservação do bioma

O presidente do CEPAN destaca que a caatinga é um ecossistema que historicamente sempre recebeu poucos investimentos de preservação no âmbito do Governo Federal. “A caatinga é categorizada como ‘o patinho feio dos ecossistemas’”. Segundo ele, existe uma dificuldade de atribuir ao bioma a mesma importância que se dá aos demais.

Além disso, Severino pontua que o protagonismo dos investimentos é dos governos estaduais. "Os estados do Nordeste vem liderando os investimentos das ações de combate a desertificação, de enfrentamento à seca, de restauração e recuperação de áreas degradadas e de criação e ampliação do sistema de áreas protegidas”, explica.

Restauração da Caatinga

Quando se fala sobre conservar o bioma, Severino afirma que a melhor estratégia é manter a caatinga em pé. "A caatinga é um ecossistema frágil. Toda vez que a gente perturba ela, retira da vegetação nativa, a gente abre possibilidades para, por exemplo, o início de um processo muito difícil de restaurar, que é o processo de desertificação", pontua.

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Apesar disso, quando não há outra alternativa, a restauração é necessária. Nesse sentido, Severino vê com bons olhos iniciativas dos próprios moradores, como o reflorestamento da caatinga, no qual agricultores cultivam plantas naturais da vegetação para garantir um solo fértil. 

Mais uma vez, porém, Severino ressalta que ainda há uma diferença quando se compara com outros biomas.

"Quando comparado com a mata atlântica, por exemplo, a gente ainda tem uma capacidade instalada em poucos protocolos tecnológicos e metodologias de restauração. Temos lacunas no conhecimento importantíssimas a serem preenchidas para que a agenda de restauração de fato aconteça", e enfatiza a necessidade de pesquisa, desenvolvimento e instituições que trabalhem na "escala executiva". 

Restauração Integrada

Essa restauração, Severino ressalta, ainda tem mais um aspecto importante. "Ela tem que ser pensada de uma maneira diferente da restauração nos outros ecossistemas brasileiros".

Para além de pensar no aspecto ecológico, partindo do restabelecimento da flora nativa ou de incremento de cobertura florestal, essa restauração deve ser uma ação integrada, que visa geração de renda, oportunidades sociais, manutenções de segurança hídrica, energética e alimentar.

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"Essas ações [ecológicas] têm que vir associadas à compreensão do sistema socioecológico. Tem que ter uma integração, por exemplo, entre lavoura, pecuária e floresta. Tem que entender o papel do bode, tem que desenvolver metodologias que para além da restauração florestal, geram segurança alimentar", argumenta. 

Impacto do Governo Bolsonaro 

Após cortes severos na pauta ambiental, houve um aumento no número de queimadas, não apenas no Pantanal, mas também na região da caatinga durante o governo Bolsonaro.

Um dos exemplos é o sertão do Araripe, onde ocorreu um incêndio de grande proporção em 2020. Sobre isso, Severino diz que a característica desse governo é a de afrouxamento no sistema de fiscalização. 

"O que presenciamos ano passado, da epidemia que foram as queimadas, foram atos criminosos, frutos de crimes ambientais e de ilegalidades". Ele destaca, ainda, que no pico dessas ilegalidades e da perda de biodiversidade, foi quando houve a menor quantidade de multas. "É uma coisa que não tem explicação’. 

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Essas queimadas já estavam sendo apontadas por estudos. “Todos os sistemas apresentaram a mesma tendência de uma explosão no número de queimadas e das fronteiras de desmatamento", afirma. “E uma retórica muito frequente é politizar esse debate. Querem politizar satélite. Satélite não é de direita, de esquerda, de centro; satélite orbita sobre a terra", completa. 

Brasil na contramão do mundo

Severino finaliza com a afirmação de que o Brasil está na contramão de todo o planeta. "Todo o mundo está discutindo descarbonização da economia, ampliação de matrizes renováveis de energia, investimento em conservação de floresta, agenda ambiental e climática. Aqui as coisas estão tudo indo ao contrário", comenta. 

Para Severino, é necessário que todos percebam que os efeitos das mudanças climáticas, da perda de floresta, já são realidade e ficam cada vez mais perceptíveis. Cita, por exemplo, o deslocamento e a intensificação do período de chuvas no Recife. 

"Floresta literalmente é água. Se eu perco cobertura florestal, perco capacidade de gerar água. Se desmato a Amazônia, São Paulo vai sofrer com crise hídrica", contextualiza Severino. Para ele, é urgente que se acabe a ideia de que mudança climática é coisa de ficção científica. "Já está acontecendo", finaliza. 

Fonte: BdF Pernambuco

Edição: Monyse Ravena