As universidades federais brasileiras podem ter que paralisar as atividades em cerca de três meses se não houver uma suplementação orçamentária que recomponha os recursos pelo menos ao patamar de 2020. A avaliação é da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino (Andifes). Este ano, a rede federal de educação superior possui R$ 4,3 bilhões previstos para gastos discricionários, como água, luz, segurança, investimentos e pagamentos de bolsas a estudantes vulneráveis. O valor, no entanto, é 18% menor do que o orçamento de 2020, o que corresponde a cerca de R$ 1 bilhão.
"Muitos contratos não serão honrados e a gente corre risco de interrupção de serviços essenciais. Com esse orçamento de 2021, admitindo que ele seja liberado integralmente, a nossa projeção é que as universidades conseguem sobreviver, no máximo, até setembro. É uma situação mais ou menos generalizada entre todas as instituições", afirmou Edward Maduereira Brasil, reitor da Universidade Federal de Goiás (UFG) e presidente da Andifes, em conversa com o Brasil de Fato. Ao todo, a rede federal de ensino possui 69 universidades federais, que reúnem 1,3 milhão de estudantes.
Uma parte desse recurso de R$ 4,3 bi, no valor de R$ 789 milhões, está bloqueada aguardando liberação por parte do governo. Há cerca de 10 dias, o ministro Pauo Guedes (Economia) foi cobrado por parlamentares durante uma audiência pública na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados e prometeu que iria descontigenciar R$ 1 bilhão para o Ministério da Educação (MEC), mas a medida ainda não foi efetivada. Mesmo liberando toda a verba prevista para o ano, ainda não seria suficiente.
"O orçamento precisa ser recomposto no mínimo ao patamar que nós tivemos em 2019, porque o do ano passado já foi mais defasado", diz Iago Montalvão, presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE).
Procurado pela reportagem, o MEC recoheceu a "situação de redução dos recursos discricionários da pasta para 2021, em relação à LOA [Lei Orçamentária Anual] 2020, e consequente redução orçamentária dos recursos discricionários da Rede Federal de Ensino Superior, de forma linear, na ordem de 16,5%". Sem apontar perspectivas de recomposição orçamentária, a pasta afirmou ainda que "não tem medido esforços nas tentativas de recomposição e/ou mitigação das reduções orçamentárias das IFES [Instituições Federais de Ensino Superior]".
Estudantes prejudicados
Além de um eventual apagão no funcionamento das universidades, com cortes no fornecimento de água, energia e outros insumos, por falta de verbas, a situação orçamentária atual é mais dramática para os estudantes que dependem de programas de assistência para permanecerem estudando. Em todo o país, milhares de estudantes estão tendo as bolsa permanência cortadas. Esses auxílios fazem parte do Plano Nacional de Assistêcnia Estudantil (Pnaes).
Na Universidade de Brasília (UnB), por exemplo, o orçamento deste ano teve um corte de 100% nos investimentos e e 4,6% nos recursos discricionários. O recursos atuais estão em patamares de quatro anos atrás, mas com o custo de vida muito mais encarecido. Reflexo disso, em abril foram cortadas cerca de 150 bolsas. O benefício, recebido por estudantes de famílias de baixa renda, é crucial para mantê-los estudando.
"Com os cortes orçamentários, a universidade é levada a restringir a política, a criar obstáculos para a concessão e a renovação das bolsas", afirma Gabrielly Araújo, estudante do 7º período do curso de Serviço Social da UnB, uma das estudantes afetadas pelo corte. Aluna de baixa renda, moradora de Planaltina, região periférica do Distrito Federal, Gabrielly recebia R$ 465 de Bolsa Permanência. Somada à um outra bolsa de iniciação científica, esta era a única renda da sua família.
"Moro com minha mãe, um tio que é pessoa com deficiência e dois irmãos. A única renda fixa que tínhamos eram as bolsas. Esse corte piorou muito nossa situação econômica", relata.
"O orçamento que a gente tem para 2021 na UnB é o equivalente ao de 2017, segundo a a própria reitoria, mas as demandas aumentaram bastante, principalmente com a pandemia", explica Adda Luísa, coordenadora-geral do Diretório Central dos Estudantes da universidade (DCE-UnB).
Há pouco mais de um mês, em artifo publicado no jornal O Globo, a reitora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Denise Pires de Carvalho, apontou que a instituição corre risco de fechar as portas por dificuldades financeiras.
“A UFRJ fechará suas portas por incapacidade de pagamento de contas de segurança, limpeza, eletricidade e água. O governo optou pelos cortes, e não pela preservação dessas instituições", denunciou.
Edição: Vinícius Segalla