A Colômbia prova que há espaço para todo mundo se manifestar e expressar suas demandas. Além dos jovens que começaram a formar organizações de primeira linha para conter a repressão policial e dos grupos de autodefesa popular, como a Guarda Indígena, Camponesa e Cimarrona, em Bogotá também surgiram as Mães da Linha de Frente.
"Ao invés de seguir na miséria, decidimos sair às ruas para ajudar um pouco nesse processo de mudanças, porque não somos só nós as "Mães da Linha de Frente", nem somente os jovens, são milhões de colombianos que estão nas ruas dizendo que não queremos mais este governo. Necessitamos e exigimos mudanças já. Um governo com políticas e leis que favoreçam aos mais vulneráveis", relata Lucía Villegas*, uma das mães do grupo.
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E essas mães se encontraram no dia 28 de abril, quando iniciou a greve geral na Colômbia. Todas residem na região sul da capital, perto de um dos pontos de concentração, o terminal de ônibus Portal das Américas, agora batizado como "Portal da Resistência" por ser o cenário diário de manifestações.
As mães começaram a participar dos atos para apoiar nos primeiros socorros e, mais tarde, decidiram formar seu próprio grupo de elite.
"Não há noite que a polícia e o Esmad não ataquem os manifestantes. Lançam gases lacrimogênos, bombas de efeito moral. Em outras cidades da Colômbia vimos que disparam com arma de fogo, sem se preocupar se há mulheres ou crianças", conta Villegas.
Até o momento foram registrados 76 homicídios, 70 vítimas de lesão ocular, 28 casos de estupro e 4.285 denúncias de abuso policial, segundo levantamento de organizações defensoras de direitos humanos.
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E quem acompanha os atos de perto sabe que a repressão atinge todos: homens, mulheres e crianças. Ainda que as Mães da Linha de Frente assegurem que sua tarefa é proteger os manifestantes, também terminaram sendo alvo da ação policial.
"A noite mais impactante foi o dia 19 de maio, estávamos sozinhas e nos atacaram. Até que a multidão, ao ver que nos atacavam, uniu-se. E é assim todas as noites. Então às vezes nos perguntamos: quem são os inimigos? Por que eles também são filhos dessa pátria, mas nos veem como o inimigo", questiona Lucía.
Todas as mães já demonstram sintomas como tosse e dificuldade para respirar por inalar diariamente gás lacrimogêneo e das bombas de efeito moral. Em muitas situações elas protestam lado a lado com seus filhos.
"Você sempre sai com medo, porque não sabe se vai retornar a sua casa. Mas é sempre maior o amor e a força que temos, sabendo que a Colômbia precisa de uma mudança. Por que, como te digo, aqui não há direito ao trabalho, educação de qualidade, não há um bom sistema de saúde. Então isso é o que nos mantêm nas ruas. Estamos cansadas da vida medíocre que levamos neste país", afirma Suzana Rivas*, outra mãe da linha de frente de Bogotá.
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Apesar de que as centrais sindicais que compõem o Comitê Nacional de Paralisação se retiraram dos protestos, em assembleia popular, os colombianos decidiram manter as convocatórias de atos nacionais todas as quartas-feiras.
"A paralisação não para até que possamos chegar a um acordo com a população, mais do que com as pessoas que estão no Comitê Nacional de Paralisação. A greve vai parar quando realmente escutarem a voz das pessoas que estão nas ruas protestando. Mas por agora não vejo isso acontecer", garante Suzana Rivas.
"Porque já são muitos anos com esse governo matando todas as pessoas que se rebelam contra o Estado. Então querem nos forçar a ser o país da felicidade, porque todo aquele que protesta, mandam silenciar. E isso não é agora. Há muito tempo vivemos com a violência no campo e agora vemos na cidade. Isso fez com que perdêssemos o medo. Dizemos que é nosso país, nossa pátria, são nossos filhos, é o futuro da nossa vida adulta", conclui Lucía Villegas, mãe da linha de frente.
Edição: Vivian Virissimo