E os jornalões anunciaram, com fanfarras e manchete triunfal, a morte do “serial killer do DF”. Estava encerrada a caçada a Lázaro Barbosa.
Os policiais que dela participaram explodiram em ovação. O governador goiano saudou a Polícia Militar, “a mais preparada do país”, pelo gran finale ao cabo de quase três semanas de cerco.
As gentes aplaudiram.
Aquele que cancelou 500 mil CPF´s zombou e ironizou. É, já se disse mesmo que a hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude.
::Tenente-coronel critica PM de Goiás no caso Lázaro: “Operação foi uma catástrofe”::
Lázaro tombou crivado de balas, algumas dezenas. Ao que consta, após troca de tiros, na qual o péssimo atirador errou todos os disparos. A PM de Goiás, sempre tão eficaz no socorro a corpos, enfiou-o numa ambulância, mas ele, contrariando todas as expectativas, chegou já sem vida ao hospital.
O Caso Lázaro é daqueles emblemáticos. Primeiro, porque de serial killer, segundo especialistas na matéria, não se tratava. Segundo porque evidenciou que nossas forças de segurança melhor sabem algemar preto e pobre com gramas de maconha do que localizar, capturar e prender um desequilibrado à solta.
Dizem que ele resistiu à prisão e ameaçou policiais; bom, quem provará o contrário?
Mais do que tudo, o Caso Lázaro indica que o bolsonarismo instituiu de vez a comemoração explícita e sem pudor da morte. O que antes se fazia às ocultas, agora se faz sem nem sequer corar. Descemos ao mais baixo nível da degradação humana.
Dizer que houve um confronto e que Lázaro foi ainda socorrido com vida é zombar da inteligência.
O aplauso ou a indiferença à morte é a legitimação da violência policial, que, cedo ou tarde, pode bater à porta de cada um e que se repete, silenciosa, no canto da periferia. “Aqueles que ainda pretendem encerrar-se em seu campo fechado, eriçados contra os outros, macerando em seu próprio fanatismo, condenam-se a si mesmos” (Voltaire).
Leia também: Com Lázaro morto, polícia quer descobrir se bandido atuava como jagunço de empresário
Lázaro é morto. Cidadãos de bem celebram Brasil afora. Comemoram os machos masculinos que correriam léguas intermináveis se se deparassem com Lázaro em qualquer esquina.
Beba-se o sangue, coma-se a carne. Um novo e melhor tempo há de raiar. Foi-se o tinhoso por força e gatilho da tropa. Carcará, pega, mata e come.
Fez-se festa no lar da tradicional família sacra-cristã brasileira. Bíblia numa mão, rifle na outra.
Este agnóstico escriba, que não é íntimo do Livro Sagrado, se lembrou de uma específica e elucidativa passagem: “Então Jesus lhe respondeu: ‘Eu te asseguro hoje, estarás comigo no paraíso’” (Lucas 23:43).
*Promotor de Justiça
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Rebeca Cavalcante