Em terras brasileiras, lamentavelmente alguns poucos avanços se misturam aos muitos retrocessos
A busca da paridade de gênero nos espaços de poder e decisão tem sido uma bandeira muito presente, se não a mais forte, dos movimentos feministas. Uma prioridade na luta das mulheres.
Enquanto o Brasil patina nesse quesito e segue ostentando os piores índices, assistimos às mulheres avançarem na sua presença nos parlamentos de diversos países, como no Chile, por exemplo, onde, nas eleições para a Assembleia Nacional Constituinte, foi estabelecido não apenas a paridade de gênero, como elegeram uma mulher, indígena mapuche, para a sua presidência.
Por aqui, em terras brasileiras, lamentavelmente vivenciamos um momento diferenciado, onde alguns poucos avanços se misturam aos muitos retrocessos.
Avançamos sim, quando garantimos mudanças na lei de cotas de candidaturas, assim como quando o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu percentuais proporcionais entre os gêneros quanto ao acesso à propaganda e aos recursos eleitorais.
::Não pode haver dúvida: o impeachment é pra já::
Medidas que levaram a um aumento de 51% da bancada de deputadas federais em 2018, fato esse que, lamentavelmente, não se repetiu em 2020, quando o crescimento na eleição de vereadoras ficou em apenas 18,5%. Foram eleitas 9.196 vereadoras, 16% do total, contra 13,6% de 2016.
Em 2020, foram eleitas 658 prefeitas, 13% do total, contra 11,57% de 2016. Apenas uma mulher elegeu-se prefeita de capital (Palmas), o mesmo que em 2016 (Boa Vista).
Assim como na política, as mulheres sofrem discriminação em todos os setores da sociedade. No mercado de trabalho, segundo a pesquisa “Estatísticas de gênero: indicadores sociais das mulheres no Brasil“, divulgada pelo IBGE no início de março deste ano, as mulheres estão retrocedendo na ocupação dos cargos gerenciais, em 2019 eram 37,4%, contra 39,1% em 2016.
Em 2020, o saldo, entre o fechamento e abertura de vagas com carteira assinada ficou negativo para as mulheres, mas positivo para os homens. A pesquisa comprova portanto que impera, ainda com muita força no Brasil, a divisão sexual do trabalho, que liga as mulheres aos cuidados e os homens ao poder.
Com a experiência que tive, de 30 anos como parlamentar, registro que o nosso grande desafio sempre foi como chegarmos à paridade entre gêneros nas casas legislativas. Mas, esbarramos sempre numa maioria de homens, conservadores e machistas, que decidem tudo, e jamais aceitaram essas propostas. Nunca aceitaram nem mesmo as mais tímidas, que ampliam a participação feminina no parlamento brasileiro.
::O Fora Bolsonaro não é uma hashtag! É uma necessidade! ::
É dentro dessa realidade, e na iminência de uma Reforma Política Eleitoral, que se instala um debate sobre a defesa ou não da reserva de cadeiras para as mulheres.
Algumas estudiosas sobre as questões de gênero têm dito que não deveríamos trocar o que se tem agora (30% das vagas de candidaturas e o acesso proporcional aos recursos públicos e à propaganda eleitoral) por vagas de cadeiras, caso o percentual não inicie com 30%.
Ocorre que o ideal nem sempre é o real e portanto precisamos destacar que um passo importante para o avanço da nossa luta política por paridade e equidade, é promovermos uma correta leitura dos resultados das batalhas já travadas assim como sobre a atual correlação de forças.
Precisamos nesse momento nos unir em torno de uma proposta plausível e que garanta avanços. Creio ser possível resguardar as conquistas alcançadas e avançar ainda mais.
Conquistar a reserva de vagas de cadeiras, com percentuais progressivos e superiores ao que temos hoje, pois assim estaremos não só reforçando a necessidade de ações e leis afirmativas, como garantiríamos, na prática, um maior crescimento da participação das mulheres no Parlamento.
De acordo com estudos da Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados, se tivéssemos hoje uma reserva de cadeiras de 15%, chegaríamos a ocupar um espaço efetivo superior a 19% das vagas, e assim sucessivamente, tendo em vista que a eleição das parlamentares se dá em cada unidade da Federação. Necessário se faz destacar também que a reserva de cadeiras, trata-se de um piso, e jamais de um teto.
Por fim destaco a importância dos movimentos feministas, emancipacionistas, progressistas apoiarem e se juntarem à bancada feminina na busca de avanços que visem uma maior presença das mulheres no Parlamento, e registro e minha certeza absoluta que jamais as mulheres parlamentares permitirão votar algo que retroceda nas nossas conquistas.
*Vanessa Grazziotin é ex-senadora da República e membro do Comitê Central do PCdoB. Leia outros textos.
*Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Rebeca Cavalcante