Ao fim desta semana, o Brasil completa sete meses do início do Plano Nacional de Imunização (PNI) contra a covid-19. No entanto, o país ainda está distante de alcançar o mínimo de 70% da população totalmente vacinada, o que é considerado essencial pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para o controle do coronavírus.
Atualmente, menos de 15% das brasileiras e dos brasileiros tiveram acesso às doses necessárias para imunização completa. Sobram dúvidas sobre a vacina, que vão desde o esclarecimentos sobre a importância do retorno segunda dose até questionamentos sobre a eficácia dos imunizantes.
A falta de informação gera uma lista de obstáculos para o bom andamento do PNI no Brasil. Segundo o próprio Ministério da Saúde, 3,5 milhões de pessoas estão atrasadas para a conclusão do processo de imunização.
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Entre os que chegam aos postos de saúde, há quem tente escolher a marca da vacina que vai tomar e até mesmo pessoas que cometem fraudes para conseguir uma terceira dose, acreditando em uma imunização mais efetiva.
O Brasil de Fato conversou com a pesquisadora Karine Lima Lourenço, doutora em virologia e que atua no CT Vacinas da Universidade Federal de Minas Gerais. Em entrevista para o programa Bem Viver, ela esclareceu as principais dúvidas sobre o tema.
Terceira dose
O debate sobre a necessidade de mais uma dose de reforço da vacina contra a covid-19 foi reforçado pelo posicionamento de dois laboratórios na semana passada. BioNTech e Pfizer confirmaram os estudos para avaliar a necessidade de uma terceira aplicação, frente ao crescimento de variantes.
Nesta segunda-feira (12), o governo de Israel começou oferecer essa possibilidade para pessoas com risco imunológico. Mas ainda não há consenso sobre o assunto. A OMS é contra a aplicação de uma terceira dose enquanto houver escassez de vacina e a imunização não estiver acessível para todas as nações.
No Brasil há casos de pessoas que burlaram o sistema para tomar o reforço. Em Minas Gerais, o Ministério Público de Minas Gerais ajuizou uma Ação Civil Pública por indenização de R$ 2 milhões contra um casal que viajou para conseguir uma terceira dose do imunizante.
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Em São Paulo, uma mulher comemorou nas redes sociais o fato de ter enganado uma equipe de uma Unidade Básica de Atendimento na periferia de Guarulhos para conseguir mais uma aplicação da vacina.
Karine explica que os estudos sobre a necessidade de revacinação ainda não foram concluídos e alerta que esse tipo de postura tem potencial para prejudicar a totalidade do PNI.
"Por enquanto não há nada certo, a gente ainda não sabe se vai haver uma reforço ou um terceira dose. É preciso aguardar e não sair por aí burlando o sistema".
Segundo a pesquisadora, a postura é um "absurdo humanitário". Nas palavras de Karine, a postura atrapalha todo o ciclo de imunização, "Dessa forma, a gente acaba impedindo quem não tomou nenhuma dose de tomar a vacina. Essa pessoa pode servir de veículo para o vírus".
A importância das duas doses
Se por um lado há quem tente tomar mais doses do que o necessário, na outra ponta, o Brasil encara um contingente grande de pessoas que não retornaram aos postos para completar o processo de imunização. Quase todas as vacinas em aplicação no país precisam ser aplicadas em duas doses.
Sem a proteção total, ainda há risco alto de infecção e aumentam as dificuldades de controle da propagação do coronavírus. "Quando a pessoa não volta para a segunda dose, não há garantia nenhuma de que ela está imunizada", afirma Karine Lima.
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A pesquisadora nota no próprio cotidiano de trabalho um aumento no número de pessoas contaminadas depois da primeira dose, "A gente tem visto no laboratório muitas pessoas com covid, porque tomam a primeira dose e, logo após essa vacina, elas acham que estão protegidas, se descuidam e acabam infectadas".
Sommeliers de vacina
Tentar escolher a marca da vacina que vai tomar ou se recusar a tomar o imunizante de determinado laboratório também é um fenômeno que tem permeado a vacinação no Brasil.
A postura tem motivações diversas. Pelas redes sociais se espalham relatos de preferências por substâncias que já foram autorizadas em outros países, trazem menos efeitos colaterais até mesmo escolhas com justificativas xenofóbicas.
"Todo mundo que tem a carteira de vacinação completa sabe que várias vacinas apresentam efeitos adversos. Mas esses efeitos não tem absolutamente nada a ver com o adoecimento pela covid-19", explica a cientista.
"Não há a necessidade de escolher. A melhor vacina é que está no braço da gente, a vacina que nos deu oportunidade de proteção contra a covid-19", completa ela.
Edição: Leandro Melito