Durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid do dia 8 de julho, a ex-coordenadora do Programa Nacional de Imunizações (PNI) do Ministério da Saúde, Francieli Fantinato, disse que o ex-secretário-executivo Elcio Franco barrou que as pessoas privadas de liberdade fizessem parte da lista de prioridades na vacinação.
De acordo com ela, era necessário que a população carcerária fosse tida como prioridade pelo fato das condições insalubres das cadeias brasileiras e da vulnerabilidade do grupo e de todos aqueles que têm contato com ele. Porém, em reunião realizada em dezembro de 2020, Franco solicitou que presos fossem retirados da lista. Fantinato negou a determinação.
“Eu fui para uma reunião e me foi solicitado que retirasse a população privada de liberdade, e eu me neguei a retirar. Eu falei, 'olha, se vocês quiserem tirar a população privada de liberdade, vocês vão tirar sem o aval do programa, vocês vão fazer uma cópia agora do plano, vão ficar com essa cópia e eu vou levar a minha cópia de volta’ ”, disse em depoimento à CPI.
Ela disse também que a Secretaria Executiva tinha autonomia para fazer a mudança, mas "pelo Programa Nacional de Imunizações não sairia". Em 16 de dezembro, na primeira versão do PNI, era possível constatar que a população carcerária era considerada como parte do grupo prioritário. Uma semana depois, o grupo tinha sido retirado em versão enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Segundo o advogado criminal André Lozano, a decisão tomada por Franco mostra um desrespeito à vida pelo fato de as pessoas que estão privadas de liberdade serem uma responsabilidade do Estado. “Uma vez que a pessoa não tem opção de sair de lá para procurar um médico, ela não pode agir em seu próprio nome. O Estado tem que garantir a saúde dela”, explica.
“Apesar de não ser um crime, mostra uma desumanidade enorme uma vez que são pessoas que estão em condições insalubres e que estão aglomeradas, amontoadas”, argumenta o advogado.
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Além disso, ele lembra que não vacinar essa população coloca em risco os agentes penitenciários que precisam entrar em contato com os presos todos os dias e também os familiares que vão fazer visitas.
“Ainda existe, principalmente, em relação às saidinhas, um contato com as famílias. E também tem uma outra questão. Não parou-se de prender. As pessoas continuam sendo presas. Então, elas podem levar o vírus lá pra dentro. E também, quando elas são soltas, elas podem levar esse vírus para fora”, afirma.
De acordo com o professor e advogado Yuri Felix, doutor e mestre em ciências criminais, mesmo quando preso e condenado, o cidadão continua tendo direitos e a situação mostrou, mais uma vez, como o atual governo despreza os direitos fundamentais de seus cidadãos.
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Sobre o caso, ele diz que, quando não vacinada, a população carcerária pode iniciar uma cadeia de contaminação preocupante. “O vírus não escolhe quem está preso e quem está solto. O governo já demonstrou toda uma maneira atabalhoada de lidar com a questão da vacina, esse, lamentavelmente, é mais um episódio”, diz.
“A partir do momento que isso é apresentado no Plano Nacional de Imunização e, de forma deliberada, é retirado, isso demonstra não só um acaso, mas uma política. É uma política orientada a desprezar direitos fundamentais”, explica.
Edição: Rebeca Cavalcante