O estado de São Paulo concentra 3.970 (28%) de todos os 14.301 despejos durante a pandemia no Brasil, segundo a Campanha Despejo Zero.
O número é quase quatro vezes maior que o do Estado do Rio de Janeiro, com 1.042. Outras 84.092 famílias estão ameaçadas, sendo 34.454 paulistas. O período corresponde a 1º de março de 2020 ao último dia 6 de junho.
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A situação poderia ser revertida caso o governador João Doria (PSDB) sancionasse o Projeto de Lei (PL) 146/2020, de autoria da deputada Leci Brandão (PCdoB).
Apresentada à Assembleia Legislativa em 24 de março de 2020, só foi incluída na pauta neste ano, e aprovada em 9 de junho. Mas ficou quase um mês parado na Comissão de Constituição, Justiça e Redação até o último dia 6, quando foi entregue ao governador, que tem prazo de 15 dias úteis para sancionar ou vetar.
A lei determina a suspensão do cumprimento de mandados de reintegração de posse e imissão na posse, despejos e remoções judiciais ou extra-judiciais.
Isso enquanto medida temporária de prevenção ao contágio e de enfrentamento da propagação decorrente do novo coronavírus (covid-19).
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Atingidos pela pandemia
“Nos países que foram atingidos pela epidemia do coronavírus, ficou claro que a diminuição do número de novos afetados depende da redução circulação de pessoas nas cidades. Para isso, uma das medidas essenciais é evitar ao máximo as saídas de casa.
No entanto, milhares de famílias estão hoje ameaçadas de despejos e remoções forçadas. Os processos de remoção, além de gerar deslocamentos de pessoas, também as obrigam a entrar em situações de maior precariedade e exposição ao vírus, como compartilhar habitação com outras famílias e, em casos extremos, a morarem na rua”, justificou a deputada.
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Além disso, há o aspecto da perda de renda na pandemia, que impede o pagamento do aluguel. “Quando não tem solução, vai ter ocupação. Quando as famílias têm de escolher entre comer e pagar o aluguel, e vão optar por comer, não sobra dinheiro para o aluguel. Vão acabar abrindo ocupações”, disse na segunda-feira (20) o advogado popular Benedito Roberto Barbosa, o Dito, do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos e da Central de Movimentos Populares (CMP).
Ele participou de live que marcou a adesão da Defensoria Pública da União à Campanha Despejo Zero.
Nesta última sexta-feira (16), foi criada a Ocupação Jorge Hereda, no Aricanduva, zona leste da capital. Organizada pelo Grupo Terra Prometida, filiada à Unificação das Lutas de Cortiços e Moradia (ULCM), União dos Movimentos de Moradia (UMM) e Central dos Movimentos Populares (CMP), reúne mais de 200 famílias.
A área ocupada, atrás do shopping Aricanduva, está abandonada há muitos anos e nunca atendeu a sua função social.
Referência para os movimentos de moradia em todo Brasil, Hereda foi homenageado por sua militância sindical e popular em favor dos Sem Teto, que manteve mesmo ocupando postos no poder público local, estadual e federal.
Despejos na pandemia
“Enquanto movimento e Campanha Despejo Zero, a gente vem se mobilizando em atividades internas e externas, por meio das redes sociais, reivindicando ao governador que sancione a lei contra os despejos na pandemia”, disse Marta Araújo, da coordenação da ULCM.
Segundo destacou, os despejos e remoções forçadas, em plena pandemia, ferem princípios básicos da dignidade humana dessas famílias que estão sendo removidas.
“A gente tem uma recomendação da Comissão de Direitos Humanos da ONU contra o despejo nesse momento.
Ao demorar na sanção do projeto, Doria dá demonstrações dos pesos e medidas que leva em consideração. Projeto de sua autoria, o PL 529/2020 foi apresentado cinco meses após o de Leci Brandão, em 13 de agosto.
No dia seguinte já entrou na pauta do Legislativo. Apesar da pressão da oposição ao projeto, que uniu direita e esquerda, a aprovação se deu em sessão extraordinária, em 14 de outubro, sob suspeita de compra de votos. A sanção veio dois dias depois. Trata-se do projeto que praticamente autoriza o desmonte do estado.