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O socialismo é a aposta de futuro

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Impasse das transições pós-capitalistas não foi diferente no Leste europeu, na China, Coréia, Vietnam, e mesmo em Cuba - Creative Commons
A longa marcha do socialismo, como versou Maiakowsky, arranca sua alegria do futuro

Por um mundo onde sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres

Rosa Luxemburgo

 

Até na esquerda são muitos os que consideram que o socialismo, como aposta histórica de ir além do capitalismo, fracassou. Não são poucos aqueles que, na esquerda, argumentam que o socialismo seria uma solução, excessivamente, radical. Afirmam que a desigualdade social poderia ser diminuída corrigindo as diferenças da distribuição de renda, sem a destruição da propriedade privada, preservando o capitalismo.

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Afinal, nos países centrais a desigualdade social não foi reduzida no pós-guerra, depois de 1945? Sim, foi reduzida na Europa, nos Estados Unidos e no Japão, enquanto aumentava no resto do mundo. Assim como, no final do século XIX, o padrão de vida médio das classes trabalhadoras elevou-se em alguns países europeus. Mas foi uma experiência histórica excepcional e transitória. No últimos trinta anos aumentou a desigualdade entre o centro e a periferia, e aumentou, também, a desigualdade social dento dos países centrais.

A história do capitalismo refuta a possibilidade de uma gradual, crescente, ininterrupta redução da desigualdade. Somente quando estiveram ameaçados, seriamente, pelo perigo revolucionário – pela Comuna de Paris em 1871, na sequência da revolução de outubro na Rússia, depois da derrota do nazi-fascismo, por exemplo – o capital aceitou fazer concessões. Nenhuma classe proprietária, em nenhuma experiência histórica, renunciou, voluntariamente, aos seus privilégios. Foi a luta pelas revoluções que abriu o caminho das reformas.

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O projeto histórico de reforma do capitalismo tem fracassado repetidas e incontáveis vezes. Todas as experiências de reformas foram passageiras e efêmeras. Assim que o capital conseguiu neutralizar a força social dos trabalhadores, anulou para a geração seguinte as conquistas da geração anterior.

As deformações burocráticas que assumiram os regimes políticos pós-revolucionários desde a primeira experiência do estalinismo na URSS não refutam a premissa de que o socialismo será uma sociedade mais democrática que a mais liberal democracia eleitoral. Confirma somente que a transição ao socialismo não é possível nas condições de pobreza material e atraso cultural das limitadas possibilidades de sociedades de economias agrárias. Mas a transição ao socialismo se revelou muito mais difícil enquanto uma onda revolucionária não atingir os países centrais.

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O socialismo poderá ser um processo de ininterrupta dissolução do Estado, proporcional à elevação da produtividade do trabalho e satisfação das necessidades humanas mais intensas. Tampouco a restauração capitalista prova a superioridade histórica do capitalismo. Os liberais contemporâneos têm argumentado que o socialismo teria fracassado. Mas a restauração capitalista na URSS não prova a superioridade do capitalismo. Demonstra que a burocracia soviética, liderada por Gorbachev e depois por Ieltsin, e seus mais de cinco milhões de funcionários privilegiados, tinham maior interesse estratégico no capitalismo, aspirando a se converterem em proprietários, do que no socialismo, quando perderiam seus privilégios.

Houve luta e resistência à restauração do capitalismo, mas, tamanha a confusão, foi derrotada. Que a União Soviética tenha deixado de existir não significa que a restauração capitalista tenha sido progressiva. Foi reacionária, e a prova irrefutável foi a terrível destruição que ocorreu na Rússia nos anos 1990, uma regressão social só comparável aos efeitos de uma guerra. Existem incontáveis variáveis para comparar a situação na Rússia antes e depois da restauração: as taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), a distribuição de renda, a expectativa de vida da população, a evolução da escolaridade, a dieta da população, as variações do salário médio, etc. Elas foram todas negativas.

As causas do impasse das transições pós-capitalistas devem ser procuradas, em primeiro lugar, nas condições materiais e culturais que limitaram a União Soviética e no seu isolamento. O impasse não foi diferente no Leste europeu, na China, Coréia, Vietnam, e mesmo em Cuba.

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As nações que viveram revoluções sociais eram sociedades muito pobres e possuíam pouquíssimos recursos. Não é possível uma transição nacional ao socialismo na época do mercado mundial. Não surpreende que, mesmo tendo diminuído a desigualdade social nos primeiros anos pós-revolucionários, o isolamento nacional tenha favorecido a burocratização. Não deveria surpreender também que se tenham consolidado regimes ditatoriais, considerando-se o terrível cerco contra-revolucionário que estrangulou China, Coréia, Vietnã ou Cuba.

O problema teórico-histórico colocado pela restauração capitalista tampouco é inusitado. A transição do feudalismo ao capitalismo conheceu, também, inflexões reacionárias e reviravoltas políticas. Lisboa foi, no início do século XV, uma cidade comercial burguesa muito dinâmica, aliviada do peso da dinastia medieval dos Borgonhas, deslocados do poder pela dinastia de Avis, em função da aliança da maioria da grande aristocracia com Castela em 1383. Duzentos anos depois, Lisboa era uma cidade sob ocupação castelhana, sob o domínio de Madri, e a fidalguia medieval tinha recuperado seu peso social e político.

Os liberais acusaram o marxismo de ser uma ideologia autoritária seria o mesmo que culpar o cristianismo – uma doutrina religiosa e moral – pelos crimes da Inquisição do Vaticano; seria o mesmo que atribuir à biologia evolucionista darwinista a responsabilidade pelos crimes de eugenia do nazismo, ou incriminar a física einsteiniana pelo dolo das armas nucleares. Esse recurso polêmico é obtuso e anacrônico.

Os ensinamentos religiosos, as ideologias políticas, assim como as hipóteses científicas certamente exerceram influência no processo histórico, mas não é sequer razoável conferir-lhes um peso tão grande. As ideias são apropriadas pelos sujeitos políticos, arbitrariamente, como as palavras, expressando os conflitos e lutas entre as classes. Assim como não se pode julgar uma época por aquilo que ela pensou sobre si mesma, não se devem julgar as ideias pelos atos dos homens que as reivindicaram.

Foi somente um início. A longa marcha do socialismo, como versou Maiakowsky, arranca sua alegria do futuro.

 

*Valerio Arcary é professor titular no Instituto Federal de São Paulo (IFSP), militante da Resistência/PSol, e autor de O Martelo da história, entre outros livros. Leia outras colunas.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Vivian Virissimo