SOBERANIA ALIMENTAR

Terreno abandonado e cheio de lixo vira horta agroecológica em comunidade de Vitória (ES)

Projeto é aposta da Rede Urbana Capixaba de Agroecologia (RUCA) para ajudar no combate à fome em áreas de baixa renda

Ouça o áudio:

Durante a pandemia, a RUCA tem apostado nos "mutirinhos" em hortas comunitárias - RUCA
Não é só segurança, é soberania alimentar. É escolher o que plantar, poder colher o próprio alimento

Na comunidade da Capixaba, em Vitória, Espírito Santo, uma área abandonada hoje é uma horta. Ione Duarte, que é moradora da comunidade e faz parte de um coletivo que desenvolve diversas atividades no local, conta como nasceu o desejo de ter um espaço que produz alimentos. 

“O primeiro desejo é que a gente tivesse independência em produção de alimentos para nutrição mesmo. Embora na comunidade cheguem alguns projetos de cesta básica, a gente sabe que na cesta básica não vêm todos os elementos para nutrir uma família com qualidade". 

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Ainda de acordo com Ione: "o segundo motivo foi que a gente utilizou um espaço improdutivo, onde a comunidade jogava muito lixo. Então tinha muito acúmulo de lixo ali. Nós tivemos um primeiro momento em que houve uma colheita farta de abóbora, aipim, leguminosas, feijão”, ressalta. 


Ione Duarte, da Comunidade da Capixaba: a horta garante alimentos e combate o descarte irregular de lixo / RUCA

Para manter esse projeto e poder atender cada vez mais famílias, a comunidade fez uma parceria com a RUCA, a Rede Urbana Capixaba de Agroecologia.

Uma das vertentes de ação dessa rede é oferecer assessoria técnica popular para projetos agroecológicos na Grande Vitória, como as hortas urbanas.

A iniciativa é importante em um cenário de avanço da fome. Segundo o relatório mais recente da Organização da ONU para Agricultura e Alimentação, a FAO, quase um quarto da população brasileira vivenciou insegurança alimentar moderada ou severa entre 2018 e 2020.

Vitor Taveira, que é integrante da RUCA, aponta que o plantio urbano não é suficiente para resolver o problema, mas é uma ferramenta importante. 

“A gente sabe que existe esse debate do 'nutricídio'. Pessoas que não têm acesso a alimentos saudáveis e acabam consumindo porcarias que são muito baratas, industrializados, ultraprocessados, e não têm acesso ao alimento de qualidade. Então a gente tem o desafio de ocupar espaços para produzir alimentos. Não é só segurança, é soberania alimentar: é escolher o que plantar, poder colher o próprio alimento”.  

No Morro do Quadro, também em Vitória, a parceria entre as hortas comunitárias que já existiam no local e a assessoria da RUCA tem dado resultados para além da alimentação, como conta a líder comunitária Viviane Rodrigues da Vitória. 

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“Nós trocamos receitas de remédios com as plantas medicinais. Muitas receitas de saladas, conservas. Pessoas cardíacas têm mostrado um melhor desempenho. Isso vem ajudando no psicológico e na autoestima de cada uma das famílias. Pessoas que viviam a poder de remédios procuram agora plantar, viver melhor, com saúde”, afirma. 


Em um cenário de avanço da fome, o plantio urbano é uma ferramenta importante para garantir acesso à alimentação saudável / RUCA

Mas a ação da rede não para por aí. A RUCA também quer transformar a agroecologia em políticas públicas.

Nas eleições municipais de 2020, ela criou um documento com 21 propostas: ações muitas vezes simples, mas que podem ter impactos benéficos, principalmente nos bairros mais pobres, como explica Vitor Taveira.

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“A gente vê que tem viveiros públicos de plantas ornamentais. Aqui em Vitória também tem um viveiro de plantas medicinais, de reflorestamento de restinga. E uma política muito simples seria que eles passassem a produzir produtos alimentícios, mudas, que pudessem ser doados para essas hortas". 

Taveira acrescenta que a ideia da RUCA é continuar se manifestando politicamente e abrindo um pouco mais as possibilidades para que todos os benefícios da agroecologia urbana sejam de fato transformados em políticas que tenham continuidade e consistência.  

Agora, a RUCA quer avançar na questão pedagógica, criando materiais que possam servir de referência para projetos agroecológicos no espaço urbano.

E, quando a pandemia chegar ao fim, a rede pretende promover trocas de conhecimento, trazendo pessoas do campo para oficinas nas hortas urbanas e levando pessoas da cidade para conhecer o campo. 

Edição: Douglas Matos