Natural de Imperatriz, no sul do Maranhão, a medalhista olímpica de prata no street skate Rayssa Leal, a Fadinha, conquistou as atenções do mundo não apenas pela idade e talento, mas pela naturalidade e inocência com que trata tudo o que está acontecendo.
Sem fórmulas mágicas, a garota de apenas 13 anos explica a todo o momento que só está se divertindo. E é com esse mesmo espírito que ela vive os seus dias quando está na cidade natal, entre os estudos e os rolês na pista de skate da Praça Mané Garrincha, única da cidade e que passou por reformas em 2019, graças ao seu desempenho e a mobilização da sua família de sangue e de skate.
Na pista de Imperatriz, os pais Haroldo Leal e Lilian Mendes levavam a pequena Rayssa, ainda aos seis anos de idade, para brincar no presente que havia ganhado. No início a brincadeira não foi tão bem aceita, nem mesmo entre a família, como conta Rayssa durante coletiva do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) em Tóquio, em resposta à jornalista Ludmila Candal, da CNN.
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“Quando eu comecei sofria bastante preconceito por ser uma menina e muito jovem a começar de skate. Boa parte da minha família dizia que não ia dar certo, que eu não ia conseguir, e estar mudando a mente deles é muito importante. Você vai conseguir, basta sonhar, persistir e confiar em Deus”, disse.
É o que ela também destaca em uma publicação nas redes sociais, na qual, com orgulho, a bisavó Joana Rodrigues segura o troféu da bisneta, a mais nova campeã da história do Street League Skateboarding (STS), campeonato mundial no ano de 2019 em Los Angeles, aos 11 anos de idade: “o skate não é como eles imaginavam, hoje todos mudaram sua visão”.
No ambiente dominado por meninos, logo ela se tornou maninha da turma e desconstruiu o estigma de que ali não era lugar para meninas. Hoje a pista da Mané Garrincha reúne não apenas amigos, mas uma grande família.
“Os meninos super se davam bem com ela, não tivemos nenhuma dificuldade, até porque a Rayssa sempre gostou de andar com os meninos, para ter mais um gás. Ela é essa pessoa que vocês veem. Ela gosta de estar com a galera, não separa seu ciclo de amizade, sempre gostou de todo mundo”, conta um dos parceiros de skate e amigo da família, Maksuel Mendes.
Para acompanhar ao vivo a disputa, foi montado inclusive um telão na cidade e, ao lado do pai Haroldo Leal e do irmão mais novo Arthur, que aos 10 anos já segue os passos da irmã sob as rodinhas, a família vibrou unida por Rayssa.
Respeitada no meio, a família Leal como um todo é inspiração para os jovens que praticam o esporte, pela persistência com que buscou a realização desse sonho.
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“Só de ela estar lá, para a gente já é uma menina de ouro, já é medalha de ouro. Porque foi ela que quis ir, ela que teve determinação, só de ela querer ir já é uma grande conquista para a gente. Como amigo da família, sinto muito orgulho tanto dela, quanto dos pais dela que tiveram essa determinação. São em pessoas e pais como os dela que temos que nos inspirar”, conta Mendes.
Um dos meninos que praticam com a Rayssa desde os primeiros passos na cidade é Felipe Gustavo, que acolhido pela família, já ganhou festa de aniversário e parceria em viagens a São Paulo e ao Rio de Janeiro em 2018 para competir e conhecer alguns ídolos do skate como Sandro Dias, Letícia Bufoni e o também medalhista olímpico, Kelvin Hoefler.
Duas vezes campeão maranhense, Felipe vibrou com a conquista da maninha pelas redes sociais e agradeceu o apoio que tem recebido ao longo dos anos.
“Você sempre foi guerreira, seu pai e sua mãe sempre correram atrás de fazer o melhor para você. Agradeça muito a papai do céu por ter um pai e uma mãe tão apoiadores que nem os seus. Parabéns família e obrigado por me acolher tão bem. Obrigado por tudo o que fizeram por mim!”, publicou.
Voar mais alto
Com o desempenho da pequena após viralizar nas redes sociais como Fadinha em 2015 e a certeza de que Imperatriz não garantia as condições necessárias para os treinos, os pais de Rayssa abraçaram a causa do skate na cidade e passaram a bater de porta em porta para pedir melhorias no espaço público, mais segurança na praça e valorização dos jovens atletas.
Apesar da reforma em 2019, pouco foi feito pelo esporte na cidade, mas assim mesmo Rayssa voou. Hoje premiada, patrocinada e referência no esporte, conquistou o sonho de ter sua própria pista de skate no quintal de casa durante a quarentena. Para isso ela contou com o suporte técnico de Cristiano Fernandes, criador do Brasil Skate Camp, que passou uma semana acompanhando as obras.
E Rayssa vai continuar a voar cada vez mais alto. Com um salto de pouco mais de 800 mil seguidores para mais de 5 milhões, até mesmo o país ficou pequeno. Os olhares do mundo estão voltados para a fada que mostrou, com a leveza e o sorriso de criança, que é possível.
O mascote da olímpiada, Miraitowa, apelidado por ela de Herex por não saber pronunciar o nome real, foi quem acompanhou sua última noite de sono em Tóquio. Noite essa que será seguida por dias de muitas realizações e mais sonhos a serem realizados – dela, de sua família e de todos os brasileiros.
Edição: Rebeca Cavalcante