Cantei pra pessoas famosas, inclusive pro Chico Buarque. Ele me respondeu com muita dedicação
Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais: uma terra cheia de histórias e de tradições. É de lá que vêm as famosas esculturas de noivas em barro, o batuque das comunidades quilombolas e a arte de jogar versos.
Marli de Jesus Costa é da comunidade quilombola do Curtume e aprendeu a jogar verso com os pais e os avós. Ela explica como a tradição acompanha o dia a dia das trabalhadoras, seja na roça ou no artesanato.
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“As mulheres cantavam enquanto bordavam, fiavam, etcétera. fazendo todo tipo de serviço. a gente saía da casa da gente pra dormir na casa do vizinho e cantar à noite, pular fogueira. Pra assar abóbora, mandioca, batata doce. A gente varava a noite cantando.
Meu canarinho dourado
bateu asa e avuou
vai levando esse versinho
no bico de um beija-flor
A gente usa muito as plantas e os animais pra cantar nosso canto da terra”, conta.
Os versos misturam estrofes tradicionais, passadas de geração a geração, com outras criadas na hora, de improviso.
É comum que haja desafios entre as jogadoras, ou jogadeiras, como também são conhecidas. E assim a brincadeira segue durante a jornada de trabalho ou nas festas que reúnem a comunidade.
Agora, a tradição de jogar versos também virou uma fonte de renda para as mulheres do Jequitinhonha.
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O projeto Versinhos de Bem-Querer foi criado pela Associação Tingui em março de 2020, bem no início da pandemia. Quem conta essa história é a Elisângela Pedroso Lopes, coordenadora da ONG.
“A gente já começava a sentir aquele clima de tristeza, de isolamento das pessoas. Então como a gente poderia fazer uma ação que poderia levantar recursos e também espalhar alegria? As pessoas que compram enviam uma breve descrição de qual mensagem querem passar para a pessoa presenteada, e aí então a jogadora de verso mescla essas cantigas da tradição com as informações recebidas. Então gera o versinho de bem-querer”.
A pessoa presenteada recebe um áudio com o versinho cantado. Segundo a Elisângela, a iniciativa viralizou. Olha só pra quem a Marli fez um verso.
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"Cantei pra pessoas famosas, inclusive pro Chico Buarque. Ele me respondeu com muita dedicação, com um vídeo muito bonito, me respondeu com um verso também”.
Situações emocionantes não faltam nesse projeto, tanto para quem recebe quanto para quem faz os versos.
Karem Antônia Ferreira é jogadeira da nova geração, tem só 20 anos. Ela comenta quais pedidos mais marcaram.
“O que eu mais gostava de fazer é quando era pra homenagear os avós, porque eu perdi minhas avós. Mas quando começou o projeto, eu tinha minha avó, e ela ficava na casa dela, que é bem pertinho, ela ficava lá escorada no muro me ouvindo cantar. Eu acho que é muito importante porque era uma tradição que estava sendo esquecida. A maioria das pessoas sabe muita coisa, mas ficava ali quietinha no canto, porque estava sendo esquecida. Muitas tinham vergonha de falar do que sabiam, de cantar”.
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Com os saberes valorizados e a arte conhecida no Brasil e até fora, as jogadoras de verso do Jequitinhonha só tem do que se orgulhar. E a gente aqui do Mosaico Cultural também foi presenteado.
Raquel é quem pediu
Ô danado
Com carinho eu vou cantar
Ô danado
Pro Mosaico Cultural
Ô danado
Olha o que eu vou falar
Ô danado, chora
Danado, chora
E se você ficou com vontade de homenagear uma pessoa querida com um versinho como este, basta entrar no site versinhos.com.br e fazer seu pedido.
Edição: Daniel Lamir e Douglas Matos