Além disso, Lira promete aprovar ainda as reformas administrativa e tributária
Olá!
Acossado pela CPI e pela queda de popularidade, Bolsonaro e os militares apostam todas as suas fichas no voto impresso. A CPI, o STF e o centrão conseguirão freá-los?
.Meu amigo Donald. Fruto de conspiração ou por mera coincidência, Bolsonaro só começou a falar em voto impresso depois de sua última visita a Donald Trump em março de 2020. Porém, a decisão da Comissão Especial em recusar a proposta joga por terra a nova “cloroquina” de Bolsonaro, um outro placebo cuja função era manter a base mais fanática mobilizada e disputar a pauta política semanalmente, abafando a CPI da Covid e a queda de popularidade do capitão, que perderia para Lula e empataria com Datena nas intenções de voto. O voto impresso serve ainda para colocar uma perigosa pulga atrás da orelha, apresentando uma justificativa antecipada em caso de derrota em 2022. Para Thaís Oyama não há nenhuma novidade no enredo: assim como fez com os governadores e o Congresso, Bolsonaro aposta que o "seu" Exército irá para as ruas e que, diante de um conflito entre o "povo" e os "inimigos do povo", uma imaginária intervenção das Forças Armadas representaria uma atuação "moderadora'' com vistas à restauração da democracia —e não um atentado contra ela. Para Oyama, o que merece atenção é a fidelidade do agronegócio, mais do que a dos evangélicos, ao projeto bolsonarista. Enquanto intelectuais e o mercado financeiro responderam com um manifesto contundente, a resposta mais dura do STF foi o cancelamento da reunião para pacificação entre os poderes, sinalizando que a paciência acabou e as pontes foram queimadas. É verdade que a inclusão de Bolsonaro na investigação sobre fake news torna real a possibilidade de inegibilidade de sua candidatura à reeleição, mas o caminho é demorado e remoto.
.Braga Netto perde sua alma. A nota dos Clubes Militares em defesa do voto impresso, não deixa dúvidas a respeito de que lado os militares estão. Mas esse posicionamento também agrava seus problemas. Além de terem que esconder sua responsabilidade no rombo da previdência, eles ainda precisam justificar as ações de seus 6.000 integrantes em cargos políticos, alguns dos quais, como o general Pazuello e o coronel Marcelo Blanco, cometeram alguns “deslizes”. As complicações contrastam com o fortalecimento do centrão, representado pela ascensão de Ciro Nogueira à Casa Civil. A bola da vez é o general Braga Netto, que já foi considerado a “eminência parda” do governo, e que agora aparece envolvido diariamente em novos conflitos políticos. Depois de fazer ameaças contra as eleições de 2022 e tentar intimidar Arthur Lira, o general terá que comparecer à Câmara no dia 17 de agosto para prestar esclarecimentos. Na CPI, o senador Rogério Carvalho (PT-SE) acusou Braga Netto de ter dado ordens para espioná-lo, o que pode render uma convocação do Senado, caso a denúncia seja formalizada. Por fim, Braga Netto terá que justificar ao Tribunal de Contas da União o que o Ministério da Defesa fez com os vultuosos recursos que recebeu para o combate à pandemia. Mesmo que o general sobreviva a essas batalhas, isso afeta seriamente a imagem dos militares como desinteressados salvadores da pátria. Enquete feita pelo Paraná Pesquisas mostra que cerca de 48% dos brasileiros não concordam com a presença dos militares no governo contra 45% que apoiam. O quadro não é desastroso para eles, mas já foi melhor e tende a piorar.
.Segunda temporada. De volta do recesso, parece que ainda vai demorar um pouco para a CPI recuperar a iniciativa política e tomar da Olímpiada o seu posto no entretenimento brasileiro. A oitiva do ex-número dois da Saúde, Airton Cascavel, não acrescentou em nada aos trabalhos e, antes dele, o depoimento do ex-militar e reverendo Amilton Gomes de Paula demonstrou apenas a sua intimidade com o governo: sem possuir sequer uma vacina, foi recebido pelo Ministério três horas depois de enviar um e-mail. A Agência Pública relembrou que a inauguração da ONG do reverendo foi repleta de homenagens a Bolsonaro. Pouco afeito ao oitavo mandamento, Amilton de Paula mentiu e foi desmentido na própria sessão por Randolfe Rodrigues sobre suas ligações com a empresa Davati e sobre o conhecimento dos valores das doses. E ainda mentiu sobre não ter oferecido vacinas a Estados e municípios. Assim como o reverendo, o ex-assessor do Ministério da Saúde Marcelo Blanco, participante do choppinho da propina, também negou o apadrinhamento ao policial Luiz Paulo Dominguetti, mas reconheceu que o governo favoreceu a negociação com atravessadores ao invés das farmacêuticas com a desculpa esfarrapada que visava o mercado privado de vacinas. Fora da CPI, outras provas de favorecimentos continuam aparecendo: o tenente-coronel da ativa Alex Lial Marinho, então coordenador do Departamento de Logística, pediu “prioridade máxima” para a compra das vacinas Covaxin, representadas pela Precisa Medicamentos, cujo dono recebeu apoio de Flavio Bolsonaro para avançar também na área das telecomunicações por 5G, apesar de sua empresa ser pequena no setor. Por hora, jogam contra a CPI a ofensiva de Bolsonaro usando a PF novamente para coagir a Comissão e, principalmente, o clima de “normalidade” que o avanço da vacinação parece provocar. Mas, preparem os corações, quinta-feira, dia 12, é a vez da CPI ouvir o deputado Ricardo Barros.
.Semipresidencialismo de fato. Ninguém voltou do recesso parlamentar tão à vontade quanto Arthur Lira. Com linha direta com a Bovespa, impondo uma reforma ministerial e contando com o total desinteresse ou incompreensão de Bolsonaro por assuntos de adultos, Lira sente que falta apenas da faixa presidencial. Em uma semana, fez mais do que o governo em um semestre: aprovou a PL da grilagem, que Rodrigo Maia e a oposição haviam barrado no ano passado, e abriu caminho para a privatização dos correios. Além disso, Lira promete aprovar ainda as reformas administrativa e tributária. Com os desejos da Faria Lima em dia, Arthur Lira tem tempo para se dedicar aos seus projetos pessoais: uma reforma política que revoga toda a legislação eleitoral e estabelece um único código eleitoral. E essa é apenas uma das cinco frentes de mudanças eleitorais na Câmara com outros retrocessos como o esvaziamento de cotas e o afrouxamento da fiscalização e punição dos crimes eleitorais, sem contar os projetos de criação do distritão e o voto impresso. Levando uma vida de general, a única sombra no horizonte de Lira talvez venha do Senado, onde Rodrigo Pacheco não dança exatamente no mesmo passo, o governo é minoritário e, principalmente, onde está a CPI. E o depoimento do deputado Luiz Miranda afirmando que o general Pazuello reclamou da pressão de Lira para liberação de recursos pode acabar comprometendo o semi-presidente com o enredo de problemas do seu colega de cargo, Jair Bolsonaro.
.Pinguim de geladeira. Talvez tenha sido a divisão do antigo superministério da Economia para acomodar Onyx Lorenzoni que despertou Paulo Guedes da letargia. O homem outrora conhecido como Posto Ipiranga acordou em agosto e percebeu que, desacreditado pelo mercado internacional e ignorado pela Faria Lima que o trocou por Arthur Lira, a chance de manter alguma relevância é se somar ao único programa do governo em curso: a reeleição de Bolsonaro. Há dois anos pensando em como criar um Bolsa Família turbinado sem mexer no sacrossanto teto de gastos, Guedes finalmente encontrou a saída: não pagar os precatórios, dívidas do governo reconhecidas pelo judiciário. O pagamento anual total de R$ 37 bilhões cairia para R$ 16 bilhões em 2021, liberando recursos para o único programa social do governo. A proposta também tentaria garfar mais uma vez o Fundo de Educação Básica. O governo sabe que os maiores cabos eleitorais da oposição hoje são o preço da carne, dos combustíveis e a conta de luz, por isso completaria o pacote de bondades para a reeleição com um vale-gás financiado pela Petrobras, anunciado por Bolsonaro na tevê, mas desmentido pela própria estatal. Porém, antes de perder a gerência sobre as políticas de Trabalho, Guedes deixou uma última lembrança de seus tempos de “Chicago Boy”, a Medida Provisória 1045, uma verdadeira “mini reforma trabalhista”. A MP cria um regime especial sem contrato de trabalho e sem direitos, reduz o valor de pagamento de horas-extras; diminui a alíquota do FGTS depositada por empresas; dificulta a emissão de multas e propõe , inclusive, o fim da gratuidade da Justiça trabalhista.
.Ponto Final: nossas recomendações.
.O CoronaChoque e a educação brasileira: um ano e meio depois. Pesquisa do Front - Instituto de Estudos e Contemporâneos e da Tricontinental demonstra como a pandemia foi utilizada para avançar a privatização do ensino e o desmonte da educação pública.
.Ocidente em guerra contra as vacinas inimigas. No Outras Palavras, artigo de Alan MacLeon revela como grandes veículos de mídia e agências de notícias espalham falsas notícias sobre as vacinas chinesas e russas.
.Preço dos combustíveis aperta lucro de motoristas de app e motoboys. No G1, como a alta dos preços dos combustíveis retirou 25% dos motoristas de aplicativos de São Paulo e aumentou o tempo de trabalho dos motoboys.
.A indústria de alimentos ultraprocessados é cringe. No Diplo Brasil, a pesquisadora Teresa Liporace denuncia a presença de agrotóxicos e de irregularidades nos alimentos ultraprocessados.
.Cidade envenenada: a história desconhecida de um dos maiores desastres ambientais do país. A Agência Pública e a Repórter Brasil recuperam a história da cidade da Baixada Fluminense envenenada por décadas pelo governo federal.
.Referência do jornalismo em quadrinhos, Joe Sacco pede resiliência contra Bolsonaro: "Resistam ao bufão". Premiado jornalista e autor de livros sobre áreas de conflito no Oriente Médio e Leste Europeu, fala sobre Bolsonaro, Trump e Biden em entrevista para o UOL.
.Os conflitos de terra em 5 minutos. Assista e compartilhe o vídeo didático da Agência Pública sobre os conflitos de terras no Brasil narrado por Itamar Vieira, autor de Torto Arado.
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Ponto é uma publicação do Brasil de Fato. Editado por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.
Edição: Vivian Virissimo