O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), ordenou que o governo federal apresente dentro de 15 dias um cronograma para a conclusão dos processos de titulação de terras quilombolas no país. A determinação também fixa que a União deve apresentar metas e incremento de recursos necessários à execução da ordem.
O despacho do magistrado foi publicado na última segunda (23), no âmbito da Petição 9698, apresentada pela Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) e pelas siglas PT, PSOL, PCB, PSB e Rede Sustentabilidade.
No documento, a entidade e os partidos pediram a proteção territorial dos povos remanescentes de quilombos como forma de prevenir e combater a proliferação da covid-19 entre as comunidades.
Dados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) apontam que há cerca de 1.700 áreas do tipo com processo de titulação em aberto. A Conaq, no entanto, suspeita que o número seja exponencialmente maior porque nem todas as comunidades já reconhecidas como quilombolas conseguiram abrir processo dessa natureza no órgão.
“Apesar de a titulação dos territórios se tratar de política anterior à pandemia, é fato que a ausência de reconhecimento formal agrava a vulnerabilidade física das comunidades quilombolas”, argumentou Fachin no despacho dado na ultima segunda.
A questão sanitária é alvo, por exemplo, da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 742/2020, em cujo âmbito o ministro já havia dado uma decisão determinando que a União elaborasse um plano de combate à doença para ser aplicado junto à população quilombola.
Pela decisão dada pelo ministro nesta semana, o governo deve esclarecer, também dentro de 15 dias, quais serão os recursos humanos e materiais, bem como os critérios adotados para se efetivar os procedimentos ligados ao Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID).
Elaborado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), esse tipo de documento é produzido para identificar os territórios quilombolas e constitui parte importante do processo de titulação de terras dessas comunidades.
Fachin determinou que sejam intimados a União, os ministros da Cidadania e da Agricultura, cargos aos quais estão submetidos o Incra e a Fundação Cultural Palmares, instituições com atribuições nos processos de titulação, bem como a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
Repercussão
Entidades civis que acompanham o tema no país acusam o governo Bolsonaro de se omitir diante das necessidades da população quilombola, especialmente durante a pandemia. É o que considera, por exemplo, a ONG Terra de Direitos, uma das organizações que atuam como amicus curiae no processo referente à Petição 9698.
Nesse sentido, a assessora jurídica Vercilene Dias, que atua junto à ONG e também à Conaq, aponta que a decisão de Fachin tem grande relevância para a defesa e a garantia dos direitos territoriais das comunidades quilombolas.
“É muito simbólico, do ponto de vista jurídico, esse reconhecimento pelo STF. Há tempos estamos denunciando essa omissão. O reconhecimento disso pela Corte nos dá a força, ou melhor, abre um leque para disputas em outro poder da República na luta quilombola para ter suas terras tradicionais tituladas”.
Edição: Leandro Melito