Enviando uma forte mensagem ao governo do primeiro-ministro Narendra Modi, a suspensão de atividades por toda a Índia em protesto pacífico que durou dez horas (também conhecido no país asiático como Bharat Bandh) marcou os dez meses do movimento de agricultores indianos contra três leis agrícolas. Em vários estados, protestantes bloquearam rodovias e ferrovias, realizando manifestações e atos em apoio aos agricultores.
A convocação para o bandh foi feita pelo Samyukt Kisan Morcha (SKM), organização guarda-chuva para mais de 40 sindicatos agrícolas. Os atos foram apoiados pela maioria dos partidos não ligados ao Bhratiya Janata (ou BJP, partido de Modi), além de organizações sindicais, federações de funcionários, estudantes, jovens, organizações de mulheres, a diáspora indiana e até mesmo estados como Kerala, Tamil Nadu, Andhra Pradesh e Punjab, todos governados por outros partidos que não o BJP.
“A resposta à convocação para o bandh foi mais difundida do que as anteriores... Foi sem precedentes e histórica”, disse o SKM em comunicado, complementando que “o povo da Índia estava cansado das posições do governo irredutível, insensato e egoísta de Modi em relação às legítimas demandas dos agricultores que estão protestando.”
O SKM também disse que o bandh foi marcado, infelizmente, pelas mortes de três agricultores e afirmou que “mais detalhes estão sendo recolhidos”.
Punjab e Haryana: fechamento quase total
Houve fechamento quase que total das atividades no estado de Punjab, tendo os serviços de transporte sido suspensos, e as lojas, estabelecimentos comerciais e instituições educacionais, bem como a maioria dos lugares, permanecido fechados durante o bandh.
Em vários distritos¸ rodovias estaduais e nacionais foram bloqueadas pelos manifestantes, como foi o caso das rodovias em Amritsar, Rupnagar, Jlandhar, Pathankot, Sangrur, Mohali, Ludhiana, Ferozepur e Bathinda.
No estado de Haryana, o bandh também obteve boa adesão em muitos lugares nos quais lojas, instituições educacionais, estabelecimentos comerciais e “mandis” mantiveram suas portas fechadas.
Contudo, os atos falharam ao tentar conseguir apoio em Chandigarh, cidade que é a capital em comum dos estados de Haryana e Punjab e onde a vida continuou normal.
Em vários lugares nos supracitados estados indianos os protestantes usaram seus tratores para bloquear as estradas. Eles também realizaram atos brandindo slogans contra o governo central e exigindo a revogação das leis agrícolas.
Os agricultores ocuparam os trilhos das ferrovias de muitos lugares nos dois estados, incluindo em Shahbad perto de Kurukshetra; Sonipat; Bahadurgarh; Charkhi Dadri; Jind, Hisar; Amritsar; Patiala; Barnala e Lalru, perto de Derabassi.
Expressando solidariedade aos agricultores que protestavam, o ministro-chefe do Punjab, Charanjit Singh Channi, pediu ao governo central que revogue as três leis "anti-agricultores", enquanto que o chefe do Congresso estadual, Navjot Singh Sidhu, disse que o PPCC apoia firmemente a convocação dos sindicatos agrícolas para o "Bharat Bandh" .
A maior parte dos mercados de grãos do distrito de Ambala, o mercado atacadista de tecidos, Sarafa Bazaar [conhecido mercado de joias no período diurno, e praça de alimentação no período noturno], instituições de ensino e diversos estabelecimentos comerciais permaneceram fechados.
As lojas também permaneceram fechadas em outros lugares de Haryana, incluindos os distritos de Karnal, Kurukshetra, Rohtak, Sonipat e Sirsa.
Apoio a agricultores aumenta no entre membros do Parlamento
O Bharat Bandh conseguiu apoio massivo em Madhya Pradesh, o que não ocorrera antes.
Mercados permaneceram fechados das 9h às 14h nos distritos de Gwalior-Chambal, Malwa-Nimar, região de Vidhya e distritos adjacentes à capital estadual Bhopal, incluindo Raisen, Vidisha e Sehore.
Todavia, o Bharat Bandh não teve impacto significativo na rotina e atividades comerciais em Bhopal e em Indore, esta última hub comercial. De maneira geral, o bandh foi pacífico em Madhya Pradesh, afirmou o coordenador estadual do SKM, Badal Saroj.
O bandh conseguiu grande impulso depois do Congresso estender aos protestantes seu apoio total, e muitos líderes seniores do Congresso tomarem as ruas.
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O ex-ministro-chefe e membro do Parlamento indiano (conhecido como Rajya Sabha), Digvijay Singh, juntamente com membros de outros partidos políticos e líderes agrícolas, protestaram no Karondh Krishi Upaj Mandi de Bhopal por quase duas horas.
Em ato com presença de mais de 400 pessoas, Singh disse “Mesmo durante a dominação britânica, quando agricultores eram forçados a pagar o Lagaan, permitia-se a eles que fossem à corte, coisa hoje proibida pelo governo Modi por meio das três leis agrícolas. Estas leis não são somente contra os agricultores, mas também contra os consumidores, já que o imposto sobre o óleo de cozinha aumentou em quase 5%, o que irá gerar lucros para as empresas ".
Em Tamil Nadu, agricultores e trabalhadores bloqueiam estradas e ferrovias
P. Shanmugam, secretário-geral da unidade do AIKS (Índia Kisan Sabha) no estado de Tamil Nadu, disse: "O governo do BJP continua a trair os agricultores ao recusar-se a retirar as três draconianas leis agrícolas. Essas leis empurrarão os agricultores para uma crise profunda."
“O governo central está removendo grãos alimentícios, óleo de cozinha, cebola e sal da lista de commodities essenciais. O governo do BJP está tentando ajudar os acumuladores por meio deste tipo de medida e fazendo com que os cidadãos paguem mais por artigos básicos”, Shanmugan acrescentou.
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Contexto
O último dia 17 de setembro marcou um ano da aprovação no Parlamento indiano das contenciosas propostas de leis agrícolas do governo de Narendra Modi. Em dez dias, as PL’s se tornaram atos após a aprovação presidencial.
As três leis são: a Lei de Comércio de Produtos Agrícolas (Promoção e Facilitação); o Acordo dos Agricultores para Garantia de Preço e Lei de Serviços Agrícolas (Empoderamento e Proteção); e a Lei de Produtos Essenciais (Emenda). Todas são de 2020.
Juntas, essas três leis pavimentam o caminho para a entrada corporativa na produção, comercialização, armazenamento e até mesmo na precificação de produtos agrícolas. Os agricultores temem que poderosas entidades corporativas possam até mesmo adquirir o controle de suas terras. Teme-se também que o atual sistema de suporte de preços [subsídios, cotas de produção ou controle de preços] se dilua e fique sem sentido depois que essas leis entrarem em vigor.
Edição: Thales Schmidt