A Venezuela exigiu respeito aos direitos humanos de imigrantes venezuelanos no Chile após uma agressão na cidade de Iquique, norte do país. No último sábado (25), cerca de 3 mil chilenos organizaram uma manifestação "anti-imigrantes" para desalojar um acampamento com cerca de 16 famílias venezuelanas, queimando todos seus pertences.
Antes disto, na sexta-feira (24), os imigrantes já haviam sido desalojados pela polícia militar chilena - os chamados Carabineros - quando acampavam na Praça Brasil, centro de Iquique.
Iquique é considerada uma cidade de trânsito migratório. Segundo a Organização Internacional de Migração (OIM), apenas 18% dos imigrantes que entram no Chile pela fronteira norte permanecem na região, a grande maioria busca viajar até a capital Santiago.
"Venezuela repudia a xenofobia e agressões contra imigrantes venezuelanos e exige às autoridades nacionais e locais do Chile respeito à integridade física e psicológica dos nossos compatriotas", afirmou a vice-presidenta Delcy Rodríguez no domingo (26).
Venezuela repudia la xenofobia y agresiones contra migrantes venezolanos y exige alas autoridades nacionales y locales d Chile respeto a la integridad física y sicológica de nuestros connacionales. Pdte @NicolasMaduro ordenó activar el Plan Vuelta ala Patria de nuestros herman@s! https://t.co/UshXZgQOls
— Delcy Rodríguez (@delcyrodriguezv) September 26, 2021
O governo bolivariano também anunciou que irá habilitar um voo humanitário do Plano Vuelta a la Patria (De volta à Pátria) para os cidadãos que queiram retornar ao país. O programa criado em 2019 repatriou cerca de 25.200 venezuelanos de maneira gratuita, segundo dados oficiais.
O Ministério Público do estado chileno de Tarapacá anunciou que abrirá uma investigação para apurar o caso e emitiu uma medida de proteção às vítimas. No entanto, meios de comunicação locais noticiam que durante o fim de semana os migrantes tiveram que dormir em outras praças públicas com o que conseguiram resgatar de seus pertences.
O governador do estado, José Miguel Carvajal, disse estar de "mãos atadas" pela falta de recursos e que tudo depende do Ministério do Interior. Ainda declarou que os imigrantes estão sendo atendidos por ONGs e uma rede solidária que é monitorada pelo governo.
"O governo não dá respostas. Solicitamos transporte para enviar uma parte dessa população migrante a outras partes do país", disse em entrevista a meios locais.
O vice-presidente chileno, Rodrigo Delgado, qualificou de repudiável a situação e que, como governo, não iriam apoiar o uso da força. No entanto não assegurou suporte imediato, afirmando que a demora para ativar programas de interiorização seria justificada pela situação irregular dos imigrantes.
"Temos que criar um protocolo de transporte, temos que ver de que maneira essas pessoas podem se inserir em lugares de destino, que efetivamente tenham um alojamento, mas também devemos solucionar administrativamente para que possam se inserir em postos de trabalho. Devemos ter uma proposta esta semana", afirmou Delgado.
Rechaço internacional
"Inadmissível humilhação contra imigrantes especialmente vulneráveis. o que afeta o aspecto mais pessoal. O discurso xenófobo, igualando a migração à delinquência, infelizmente cada vez mais frequente no Chile, alimenta esta classe de barbárie", declarou o relator especial para direitos migratórios da ONU, Felipe González.
Inadmisible humillación contra migrantes especialmente vulnerables, afectándolos en lo más personal. El discurso xenófobo, asimilando migración a delincuencia, que por desgracia se ha ido volviendo cada vez más frecuente en Chile, alimenta esta clase de barbarismo. https://t.co/WwCRGIbFxu
— UN Special Rapporteur Migration Felipe González M (@UNSR_Migration) September 25, 2021
A Unicef Chile também expressou preocupação pela condição dos imigrantes, que incluem crianças e adolescentes. "Pedimos ao Estado garantir e proteger seus direitos, cumprindo com os tratados internacionais assinados pelo país", declarou em comunicado.
De mesma forma, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (Cidh) instou a administração de Sebastián Piñera a "adotar medidas urgentes para prevenir e eliminar práticas de xenofobia, assim como observar os princípios de não discriminação".
Interesses eleitorais
Apesar da condenação internacional, o candidato de extrema direita José Antonio Kast incentivou as manifestações, reiterando sua campanha para as eleições presidenciais de 21 de novembro.
"Nosso compromisso é claro: fechar as fronteiras e acelerar a expulsão de imigrantes ilegais", publicou nas suas redes sociais.
Kast, presidente do partido Republicano do Chile, possui um capítulo do seu programa eleitoral chamado "se atreva a frear a imigração ilegal", incentivando os chilenos a atos xenófobos contra migrantes.
Mudança de postura
Logo no início do mandato, em 2018, o presidente Sebastián Piñera promulgou o visto de "responsabilidade democrática", que incentivava a imigração dos venezuelanos. No entanto, somente 27% dos pedidos de visto foram aceitos neste ano.
Em fevereiro de 2019, Piñera foi um dos chefes de Estado que participou do "Venezuela Live Aid", na cidade Cúcuta, fronteira entre Colômbia e Venezuela, novamente reforçando o discurso de que o governo de Nicolás Maduro teria provocado uma crise humanitária e que o Chile estaria disposto a receber a imigração venezuelana.
No entanto, com o início da pandemia, Piñera suspendeu o programa de vistos especiais e, já em fevereiro de 2021, o governo iniciou um programa de expulsão de estrangeiros indocumentados, assinando um contrato milionário com a empresa Sky Airlines.
Edição: Arturo Hartmann