No campo a gente viu uma disparidade: as plantas no gongocomposto cresceram absurdamente
Gongolo ou piolho-de-cobra. Um bichinho que é encontrado no Brasil todo, tanto na área rural quanto na urbana. E que pode ser um aliado importante da produção agroecológica através da gongocompostagem.
No Brasil, essa técnica começou a ser desenvolvida em 2008 por Maria Elizabeth Correia, pesquisadora da Embrapa. Ela explica a diferença da gongocompostagem para a compostagem tradicional, feita com minhocas.
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“Ele tem um triturador, digamos assim, na sua mandíbula, muito mais rígido. Por isso, ele é capaz de fragmentar pedaços de vegetais que são mais rígidos. A gente já testou, por exemplo, sabugo de milho, que a gente dá uma primeira picada. Galhos finos, bagaço de cana, que são materiais bastante fibrosos, bastante rígidos”, conta.
A pesquisadora ressalta que não é uma questão de comparar se o gongolo é melhor do que a minhoca. Cada um cumpre uma função decompondo um tipo de resíduo diferente, e gerando um composto com características próprias.
Pesquisas têm mostrado que o gongocomposto é muito eficiente para o cultivo de mudas. E basta plantar a semente direto no composto, nem precisa misturar com terra ou com outros adubos.
Luiz Fernando de Sousa Antunes estuda gongocompostagem desde 2013. No seu doutorado em fitotecnia, comparou as mudas produzidas no gongocomposto com mudas produzidas em um substrato comercial orgânico.
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“Elas eram praticamente do mesmo tamanho, visualmente na badeja. Mas quando a gente levou pro campo, a gente viu uma disparidade: as plantas no gongocomposto cresceram absurdamente. E as plantas do substrato comercial se desenvolveram, mas a diferença na taxa de produção foi na casa de 40%”, ressalta.
Usos na agroecologia
Na plantação de bananas do Perci Frantz, no município gaúcho de Santa Cruz do Sul, os gongolos são grandes aliados. Toda sobra da bananeira vai para o pé da planta, e é ali mesmo que os bichinhos fazem seu trabalho. Após três anos, não é preciso adicionar mais nenhum adubo.
“Como é região de morro, a gente ia num local mais alto e dava pra ver claramente onde o piolho-de-cobra já estava se instalando. A bananeira ficava mais verde. Então eu calculo na faixa de 30, 40% de aumento de produção. E o mais interessante é a diminuição de custo: porque eu não gasto combustível, não gasto mão-de-obra pra trazer um produto, pra comprar um produto de fora. É produzido com a sobra da própria bananeira”.
Os gongolos são parceiros de negócio do permacultor Guilherme Rocha Dias, em São Sebastião, litoral de São Paulo. Ele comercializa gongocomposto feito com resíduos de poda do próprio quintal e dos vizinhos.
“Esse resíduo de poda, quando é compostado de forma convencional, sem o gongolo, você acaba levando de 6 a 8 meses entre o processo trituração até chegar à colheita de uma terra vegetal ou de um composto orgânico. Com o gongolo, a gente encurta esse tempo pra coisa de 4 meses”.
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Se o gongolo é um bicho tão abundante, que produz um composto super rico e ainda evita que resíduos orgânicos acabem indo para aterros sanitários, o que falta para essa técnica ser mais utilizada? Para a pesquisadora Maria Elizabeth Correia, são dois fatores: a falta de informação e a dúvida sobre como começar. Ao contrário das minhocas, não é possível comprar gongolos.
A boa notícia é que é super fácil atrair esses bichinhos. Basta reunir sobras de poda e folhas secas em um canto sombreado do jardim e manter o material levemente úmido.
“O que a gente recomenda é que as pessoas montem essas pilhas pra atrair os gongolos e fazer a partir de um processo natural, que é perfeitamente adaptável às condições de pequenos agricultores, de agricultores urbanos. É uma lógica que funciona”.
E funciona mesmo: depois de alguns meses, o gongocomposto vai se formar embaixo da pilha, já pronto para ser usado.
Edição: Douglas Matos