se eles conseguiram tirar as impurezas da água, então eu vou conseguir também", disse Sara
Conviver com as estiagens no semiárido nordestino exige criatividade e muito esforço. Um exemplo dessa experiência coletiva é o trabalho da agricultora Sara Maria Constâncio, do assentamento São Domingos, em Cubati (PB). Ela consegue deixar o seu quintal produtivo verdinho o ano inteiro.
Sara juntou seus conhecimentos agroecológicos com uma reportagem que assistiu na televisão.
"Viver e conviver no semiárido é coisa muito difícil. Às vezes, eu vejo pessoas dizendo que vão trazer políticas de combate à seca, mas não existe isso. O que existe são políticas de convivência com o semiárido”, explica.
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Foi por meio da associação de mulheres, da qual ela faz parte, que Sara conseguiu implantar na sua propriedade um sistema transformador de reúso de águas de uso doméstico.
"Eu vi que tinha uma universidade que estava reaproveitando água e conseguindo fazer hortas comunitárias dentro da própria universidade. Eu fiquei curiosa: 'se eles conseguiram com esse filtro tirar o sabão e as impurezas da água, então eu vou conseguir também'", disse a agricultora.
O sistema que Sara implantou no próprio quintal é o reúso da água cinza, ou seja, a água que é utilizada no banho, na pia que lava pratos e de outros espaços da casa. Ela é filtrada e depois direcionada para irrigar a plantação.
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"O problema passou a ser a solução. A gente visualizou que essas águas cinzas já foram utilizadas dentro da residência e, após essa utilização, ela tem uma serventia, a partir do tratamento dessa água cinza e, posteriormente, o reúso agrícola", explica Clérisson dos Santos, zootecnista da Bahia.
Com a adesão ao sistema, as agricultoras do semiárido nordestino têm conseguido irrigar o quintal produtivo com regularidade o ano inteiro, garantindo assim uma produção perene. Isso faz com que estas famílias tenham alimento e renda de forma estável.
O sistema de reúso de água cinza funciona de forma simplificada e eficiente. A água passa por uma estrutura simples, formada por uma caixa de gordura, um filtro natural e uma caixa coletora. Por fim, a água vai para um tanque de onde é retirada para irrigar a plantação, por meio de gotejamento, com total segurança.
"Essa água era toda desperdiçada, apesar de a gente sempre aparar nos baldes, para colocar nas plantas, principalmente no final do ano que é a época que mais falta água por aqui", conta agricultora Evanice Pereira, da cidade Itapetim, em Pernambuco.
O reúso de águas cinzas é apenas uma das técnicas de saneamento que ajuda na perspectiva de boa convivência com semiárido, permitindo a estas agricultoras mais autonomia e fartura nos quintais produtivos o ano inteiro.
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Além desta técnica, outras iniciativas e políticas públicas, como a instalação de cisternas de placas nas propriedades, tem revolucionado a favor da segurança hídrica na região nas últimas décadas. Porém, a redução de ações e políticas governamentais para a convivência com o semiárido nos últimos anos está impactando os processos para conquistas de direitos das famílias.
Edição: Daniel Lamir