Emergência climática

Como problemas ambientais agravam conflitos

Países afetados por problemas ambientais e conflitos sofrem com um círculo vicioso de destruição

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Na Califórnia, nos EUA, incêndios são cada vez mais comuns e devastadores - Robyn Beck / AFP

Países afetados por problemas ambientais e conflitos sofrem com um círculo vicioso de destruição. E as mudanças climáticas pioram ainda mais a situação, afirma estudo de instituto australiano.

Problemas ambientais levarão a conflitos generalizados e à migração em massa a menos que esforços significativos sejam feitos para limitar os estragos, afirma um estudo publicado nesta quinta-feira (07/10).

O documento foi divulgado dias antes da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP26), em Glasgow, na Escócia, onde líderes mundiais esperam chegar a um acordo sobre medidas concretas para combater as mudanças climáticas.

Para seu segundo Relatório sobre Ameaças Ambientais, o Instituto para a Economia e Paz (IEP), da Austrália, avaliou 178 Estados e territórios para encontrar aqueles mais suscetíveis a conflitos gerados por problemas ambientais.

O relatório analisou os riscos alimentar e hídrico, o rápido crescimento populacional, anomalias de temperatura e desastres naturais e cruzou esses dados com medidas nacionais de resiliência socioeconômica – tais como governos que funcionam bem, ambiente de negócios sólidos e aceitação dos direitos dos outros – para produzir o relatório de 2021.

"Queremos entender melhor a relação entre dano ambiental e conflito. E ela se mostrou muito mais forte do que esperávamos", explicou o fundador e presidente-executivo Steve Killelea. "Dano ambiental e conflito estão intimamente ligados."

A espiral de conflito e danos ambientais

A pesquisa descobriu que as regiões ameaçadas por conflitos e danos ambientais (como desastres naturais, escassez de recursos e anomalias de temperatura) entram numa espécie de círculo vicioso.

"Os recursos são degradados, e há luta por eles. Esse conflito então enfraquece toda a infraestrutura e sistemas sociais e também destrói ainda mais os recursos, que aí geram mais conflitos", disse Killelea. "Há ainda os diferentes grupos étnicos ou religiosos e antigas animosidades de conflitos passados, por isso é fácil voltar a cair nessa linha."

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Uma região que está entrando nesse círculo vicioso é a do Sahel – localizada na fronteira sul do Deserto do Saara –, onde problemas sistêmicos, tais como agitação civil, instituições fracas, corrupção, alto crescimento populacional e falta de alimentos e água, estão alimentando uns aos outros.

A pesquisa do IEP mostra que esses problemas aumentaram a probabilidade de conflitos e favoreceram o surgimento de muitas insurgências islâmicas na região.

Grupos terroristas islâmicos têm alavancado disputas locais sobre recursos cada vez mais escassos, como água e pastagens, para promover sua causa e ganhar poder.

Infografik Map countries most at risk PT

Regiões sob maior risco

O diretor do IEP para a Europa, Oriente Médio e Norte da África, Serge Stroobants, disse que o relatório identificou 30 países que enfrentam altos níveis de ameaças ambientais. Eles também se caracterizam por altos níveis de corrupção, instituições fracas, ambientes de negócios ruins e má distribuição de recursos.

As três regiões em maior risco de colapso social são o cinturão do Sahel, que se estende da Mauritânia à Somália, o cinturão da África Austral, que vai de Angola a Madagascar, e o cinturão do Oriente Médio e Ásia Central, que compreende a região entre a Síria e o Paquistão.

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E esses países, além de correrem o risco de novos conflitos, também tendem a passar por uma emigração em massa. Mais de 50 milhões de pessoas foram deslocadas à força devido a conflitos e violência na África Subsaariana, no Oriente Médio e no Norte da África em 2020.

"Hoje, cerca de 1,26 bilhão de pessoas vivem nesses 30 países e elas correm um alto risco tanto de conflito como de deslocamento devido a danos ambientais", disse Stroobants.

A mudança climática é um fator?

O relatório concluiu que, embora muitas ameaças ambientais – como a escassez de água e de alimentos – existam sem as mudanças climáticas, aquelas são inevitavelmente exacerbadas por estas, empurrando os países para conflitos novos ou mais profundos e expulsando os habitantes. Até 2050, espera-se que as mudanças climáticas desloquem mais 86 milhões de pessoas somente na África Subsaariana.

"A mudança climática é definitivamente um agravante e um acelerador dos efeitos e do impacto dessas ameaças ambientais nesses países muito específicos", disse Stroobants, referindo-se às nações em maior risco.

A pesquisadora Nina von Uexkull, do Departamento de Pesquisa sobre Paz e Conflitos da Universidade de Uppsala, na Suécia (que não esteve envolvida no estudo do IEP), observa que algumas regiões estão em risco de conflito devido às mudanças climáticas.

"Em particular, pesquisas sugerem que regiões com conflitos em andamento, marginalização política e dependência econômica da agricultura apresentam elevados riscos de conflito decorrentes de  problemas relacionados ao clima", disse.

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E os países desenvolvidos?

Os países da Europa e de outras regiões altamente desenvolvidas enfrentam ameaças de desastres naturais e mudanças climáticas, mas são resistentes aos piores problemas causados ​​por ameaças ambientais, concluiu o relatório. Isso se deve a uma governança robusta, redes de segurança social, riqueza e outros fatores.

Ao se referir às recentes inundações na Alemanha e Bélgica, Stroobants disse: "Sim, houve um impacto, mas ambos os países já estão se reconstruindo. Apenas algumas poucas pessoas foram deslocadas, receberam assistência e poderão voltar para suas vilas."

"Isso é completamente diferente de outras partes do mundo, onde tanto o impacto é maior como também se pode estar exposto a múltiplas ameaças – e não apenas a uma ou duas".

Von Uexkull observa que, embora esses países apresentem ampla resiliência, eles enfrentam riscos de agitação civil, bem como de imigração. "Mas os países mais ricos e resilientes dificilmente verão violência em larga escala", ressalvou.