O presidente da Guatemala, Alejandro Giammatei, decretou estado de sítio no município El Estor, no estado de Izabal, leste do país, no último domingo (24), após 17 dias de manifestações indígenas. A comunidade maia Q’eqcxhis protesta há mais de duas semanas contra um projeto de mineração que busca desalojá-los do seu território.
A medida ainda deve passar por aprovação do Legislativo em até três dias para ter validade. O Congresso discute nessa tarde se chancela ou não a decisão do Executivo. A bancada opositora, composta pelos partidos Winaq, Semilla e Movimento para a Libertação se opuseram ao estado de exceção, acusando criminalização da resistência comunitária.
"É pouco provável que o Congresso invalide a decisão, porque possui uma direção totalmente pró-governamental", aponta Carlos Barrientos, diretor do Comitê de Unidade Camponesa da Guatemala (CUC), ao Brasil de Fato.
O partido governante Vamos possui a segunda maior bancada parlamentar com 17 do total de 160 deputados.
No al estado de sitio en El Estor, no a la criminalización de la resistencia comunitaria. La @BancadaWinaq no avalará en el Congreso esa decisión gubernamental. pic.twitter.com/4yoR0ABxJX
— Bancada Winaq (@BancadaWinaq) October 24, 2021
O decreto proíbe qualquer tipo de manifestação pública, prevê que o Exército controle o município e possa realizar detenções sem ordem judicial prévia. Segundo meios locais, nesta segunda-feira (25), um contingente de 500 soldados e 350 policiais já chegou ao local, enquanto agentes do Ministério Público realizam mandatos de busca e apreensão.
"Consideramos que é inconstitucional porque é uma ação desproporcional. O estado de sítio é um estado de exceção anterior a entrar num estado de guerra, segundo a Constituição. O que houve na região são manifestações por decisões governamentais e empresariais", declara Carlos Barrientos.
O líder camponês também destaca que a regulamentação sobre estados de exceção é uma herança da Constituição de 1965, que já não está mais vigente e foi aprovada durante a ditadura militar guatemalteca.
Os movimentos indígenas já vinham denunciando há dias a presença de pessoas infiltradas nos protestos que geravam distúrbios para justificar o posterior controle do Estado.
Vídeos publicados em redes sociais mostram a violência das forças policiais guatemaltecas contra a comunidade indígena.
Fuerzas represivas del Estado de #Guatemala atacaron directamente al pueblo maya q'eqchi' de las comunidades del municipio de El Estor, Izabal, quienes estaban en resistencia para rechazar la explotación minera; se registran personas intoxicadas. pic.twitter.com/YlriU2GEKR
— Santiago Botón 🇬🇹 (@SantiagoteleSUR) October 22, 2021
A comunidade maia Q’eqcxhis rechaça o projeto mineiro Fenix, da Companhia Guatemalteca de Níquel (CGN), paralisado desde fevereiro deste ano por resolução da Corte de Constitucionalidade - tribunal independente - , justamente por não cumprir com o requisito de consulta pública. Em junho deste ano, o Ministério de Energia e Minas realizou uma consulta pública, atendendo a decisão da Corte, no entanto, sem incluir os sindicatos de pescadores e as autoridades indígenas.
A sentença também diminuía a zona de exploração de 247 km² para 6,29 km². Segundo a CGN, seria possível extrair cerca de 120 mil toneladas de níquel por mês da região.
Apesar da decisão judicial, os indígenas denunciam que as empresas CGN Pronico e Mayaniquel, que disputavam a concessão com a CGN, estão extraindo níquel de maneira ilegal no seu território, contaminando a única fonte de água doce da região.
Há 17 dias as lideranças indígenas bloqueiam as principais vias de acesso ao município, impedindo o tráfico de caminhões das mineradores e exigindo que o Estado cumpra com o Convênio 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que prevê que qualquer ação no território indígena deve passar por autorização dos povos originários segundo seus próprios costumes e hierarquia.
Em julho de 2021, o chefe da Procuradoria Contra a Impunidade da Guatemala foi destituído do cargo. Mais tarde, em asilo político, Juan Francisco Sandoval afirmou que havia coletado provas que demonstravam que o presidente Alejandro Giammatei teria recebido em janeiro propina de uma das empresas que iriam executar o projeto Fenix e por isso era perseguido pelo Estado.
* Com informação de Prensa Libre, Quorum, Telesur e La Hora.
Edição: Thales Schmidt