A 2ª Seção do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) autorizou, nesta quarta-feira (3), a quebra do sigilo bancário e apreensão do celular e documentos do advogado Zanone Manuel de Oliveira Júnior, responsável pela defesa de Adélio Bispo na época do atentado contra o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), durante a campanha presidencial de 2018.
André Lozano, membro da Comissão de Prerrogativas da OAB de São Paulo, avalia a decisão como “absurda e criminosa”. Para o advogado, a quebra de sigilo deve estar expressamente fundamentada de modo a colocar Zanone Júnior sob suspeita.
Em relação ao financiamento da defesa, não há interesse por parte do Estado, mas somente ao cliente e ao advogado, que “pode ele mesmo arcar com os custos, seja porque tem identificação ideológica ou em decorrência da exposição midiática”, ou por um terceiro “por qualquer motivo”.
“Quando você toma uma medida tão gravosa contra o advogado, pelo menos deve demonstrar quais são os motivos. O segredo de Justiça ocorre em casos excepcionais. Não é qualquer caso que pode ser declarado sigilo, somente naqueles casos em que haja o interesse em preservar o sigilo das investigações, o acusado ou a vítima.”
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Para Lozano há, inclusive, um interesse público de que as investigações ocorram às claras, e quando a decisão de quebra de sigilo se dá em um processo que tramita em segredo de Justiça, torna-se “temeroso pela falta de transparência”.
“A publicidade é um valor democrático, existe justamente para que a população possa fiscalizar a atuação do poder público, uma vez que o Poder Judiciário também é um dos pilares da democracia e necessita de fiscalização”, afirma Lozano.
Entenda o caso
Em 2018, o próprio TRF-1 permitiu a quebra de sigilo e as apreensões. Em dezembro, a Polícia federal chegou a apreender os materiais, mas não chegaram a ser utilizados nas investigações.
Um ano depois, entretanto, as diligências foram suspensas pelo desembargador Néviton Guedes, relator do caso no TRF-1, por liminar a pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Segundo a OAB, as diligências iriam contra o sigilo profissional do advogado.
Em junho deste ano, o advogado Frederick Wassef apresentou, em nome de Bolsonaro, uma petição solicitando a revisão da quebra de sigilo.
Na ação judicial, Wassef listou os elementos que colocam o advogado sob suspeita: “(1) um renomado escritório de advocacia é contratado para defender investigado de baixa renda; (2) a contratação do escritório não ocorre a título pro bono; (3) a contratação do escritório ocorre sem conhecimento do investigado; (4) a contratação do escritório não ocorre por solicitação do investigado; e (5) a contratação do escritório não ocorre por solicitação de familiares ou amigos do investigado”.
Nesta quarta, por três votos a um contrário, a Justiça não só autorizou a manutenção das diligências estabelecidas ainda em 2018, mas também a retomada das investigações, com o objetivo de apurar se houve um mandante do crime, uma vez que Zanone Júnior teria defendido Adélio Bispo gratuitamente, como argumentou Wassef.
Pela decisão, serão analisadas movimentações financeiras feitas entre setembro e dezembro de 2018, logo após o atentado.
Histórico
Para André Lozano, “quebrar o sigilo do advogado e não demonstrar que ele realmente estaria de alguma forma participando para a prática de algum crime é uma continuidade de uma de uma situação de ilegalidades que vem ocorrendo no Brasil desde o 'mensalão' e que se aprofundaram durante a Lava Jato”.
No âmbito da Operação Lava Jato, o ex-juiz federal Sergio Moro quebrou o sigilo telefônico de Roberto Teixeira, então advogado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e do telefone central da sede do escritório dele, o Teixeira, Martins e Advogados. Com isso, Moro autorizou o acesso a conversas de todos os 25 advogados com pelo menos 300 clientes.
Dois anos depois de o caso ter sido revelado pela imprensa, a 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região determinou, em março de 2018, a destruição dos áudios gravados.
Edição: Leandro Melito