Em Glasgow, na Escócia, terminou nesta sexta-feira (12) a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP26), com o direcionamento de algumas negociações entre os países participantes, como a definição das regras para a regulamentação das emissões de carbono e metas para reverter o desmatamento até 2030.
Mas o quanto dessas negociações estão influenciando partidos e lideranças políticas brasileiras a se comprometerem na contenção da crise climática, fora do âmbito do governo federal?
As mudanças no meio ambiente são tema de movimentos sociais há tempos, uma vez que impactam diretamente os mais vulnerabilizados.
Na sociedade como um todo e entre figuras políticas, no entanto, “o debate fundamental de racismo ambiental”, por exemplo, “ainda não encontra ampla adesão, ou é negado, pelos movimentos ambientalistas no Brasil”, afirma a Coalizão Negra por Direitos, no documento Para controle do aquecimento do planeta - desmatamento zero: titular as terras quilombolas é desmatamento zero. Para a organização, “falta racializar as políticas públicas ambientais”.
No âmbito das decisões políticas, a crise climática é frequentemente colocada em segundo plano diante de temas como saúde, emprego e educação. Isso porque os impactos da crise ambiental não são observados de maneira transversal a outras esferas de debate, mas apartados das urgências sociais.
O fato de não existir nenhuma publicação acerca da Conferência nos perfis do Twitter do ex-presidente Lula e do presidente Jair Bolsonaro, de espectros políticos opostos, por exemplo, representa esse distanciamento.
Indo na contramão dessa perspectiva, os movimentos sociais dizem há tempos que o enfrentamento às desigualdades sociais cada vez mais deverá ser acompanhado da luta contra a crise climática.
Isabel Tukana, da etnia Tukano, do noroeste da Amazônia, afirma que a questão ambiental “não é pauta em nenhum governo”. Das medidas que vêm sendo pronunciadas na COP26, a coordenadora do Levante Pela Terra, não vê nenhum “comprometimento” para alcançar a justiça climática.
“Por mais que a COP26 venha trazer algumas propostas, pouco se falou de como fazer. Se foi liberada uma verba mundial, como os países vão receber essas verbas? Como vão garantir que essas verbas cheguem até nós? Que todos nós democraticamente sejamos ouvidos para participação de como usar essas verbas.”
“A gente já tem um presidente que falou que não vai demarcar nenhum palmo de terra a mais os indígenas, e outros não tomam nenhuma posição”, ressalta a indígena.
::Txai Suruí, Juma Xipaia, Alessandra Munduruku: quem são as indígenas que se destacaram na COP26::
Entre a população quilombola, a sensação se repete. Francisco Chagas, assessor da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq), que está presente na COP26, afirma que “qualquer pessoa leiga vê o quanto as comunidades são excluídas, o quanto o racismo e o poder colonizador do Brasil se perpetuam de uma forma cruel”.
Para Chagas, a COP26 é um espaço em que movimentos e povos em defesa do meio ambiente podem expor suas realidades. “Nós colocamos o que nós estamos fazendo”, no entanto, ao retornar da conferência, “nós somos engolidos pelo poder”.
“O que os povos tradicionais, por exemplo, que são os que lutam, produzem orgânicos, defendem os territórios e a vida e mantêm a natureza. Mas o que se vê pelo outro lado é uma potência engolindo a cada dia esses territórios. Esse racismo estrutural que a gente vê nos órgãos ambientais serve aos senhores do poder e condena os povos que lutam pela vida natural no país”, afirma Chagas.
Segundo o integrante da Conaq, os recursos que chegam do exterior “se transformam” até chegar na ponta. “Quando chega na ponta, chega para alimentar um desejo político e fortalecer ainda mais o processo do ‘toma lá da cá’.”
Por essa perspectiva, ele avalia que a COP26 não consegue fazer coro a um fortalecimento desses movimentos dentro do Brasil e ressalta que, se não existe uma política concreta para “fortalecer a defesa climática”, há uma insegurança ambiental.
“Quando há a intensificação do processo de desmatamento no Brasil, por exemplo, os povos não conseguem assegurar a defesa do clima. Aí nós temos todo um processo de descontrole climático sociocultural. Não é de interesse de ninguém, nem de esquerda nem de centro, promover a garantia da sustentabilidade viável para esse povo, porque fazer isso desmantela o projeto do capital. A política nacional brasileira está sempre na mão do poder do capital”, afirma Chagas.
Edição: Leandro Melito