Ele nasce nessa perspectiva de estar fortalecendo a defesa do território
Imagina acordar cedinho e dar de cara com um paraíso: grandes dunas de areia branca e o mar logo ali, como se estivesse no quintal de casa. Na mesa, uma fartura de encher os olhos, com insumos fresquinhos direto da horta agroecológica, cultivada pela mesma pessoa que está te hospedando.
No lugar de passeios tradicionais, a possibilidade de vivenciar a história da comunidade, aliando as belezas naturais ao contexto de luta e resistência dos povos tradicionais. Isso existe e tem nome – Rede Cearense de Turismo Comunitário – Rede Tucum, que oferece experiências diferenciadas de hospedagem na zona costeira do Ceará.
Ana Lima, agricultora e moradora da comunidade de Caetanos de Cima, também é uma das coordenadoras da Rede. Ela conta como o turismo comunitário vem afirmando suas identidades e fortalecendo suas lutas.
O turismo comunitário mostra quem somos, o que fazemos valorizando nossos produtos, o que plantamos no nosso quintal
“Ele nasce nessa perspectiva de estar fortalecendo a defesa do território, a igualdade de gênero, o respeito às diversidades, fortalecendo a economia solidária dentro dessas comunidades e trazendo uma conscientização para as pessoas que ali estão”.
Foram anos construindo essa ideia, a de um turismo que se contrapusesse ao modelo tradicional e predatório do turismo de massa. Reunindo a comunidade e pensando formas de sustento, fortalecendo territórios e chamando a atenção da sociedade para dizer que esses povos tradicionais existem e que é possível conhecer essas belezas de forma sustentável.
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“O turismo comunitário, ele mostra quem somos, fazemos valorizando nossos produtos, o que plantamos no nosso quintal, o trabalho que é feito com agroecologia nessas comunidades, valorizando a pesca artesanal, o trabalho do agricultor familiar. A gente na verdade tá na contramão de todo esse sistema perverso e capital que vem destruindo e manipulando as comunidades”, defende Ana.
As comunidades da zona costeira do Ceará possuem uma longa história de resistência à especulação imobiliária, às ameaças que projetos de carcinicultura (criação de camarão) e usinas eólicas, entre outros, trouxeram aos seus territórios.
Nesta perspectiva de turismo, tudo é pensado a partir da cultura da região, contando a história da comunidade
O turismo, assim como a agricultura e a pesca artesanal é uma das iniciativas que fortalecem a existência e ocupações dessas populações tradicionais.
Rosa Martins, socioambientalista e consultora para o turismo comunitário, afirma que as comunidades pesqueiras, as comunidades tradicionais de um modo geral, foram muito impactadas com as mudanças, com as transformações que ocorreram na zona costeira a partir da década de 1970para ocupação da terra por construtoras de hotéis, pousadas, segundas residências.
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"Elas vivenciaram inúmeros conflitos de interesse entre essa população tradicional e esses novos ocupantes. O turismo comunitário nasce no seio dessa luta, no bojo dessa luta, para de certa forma afirmar a identidade dessas comunidades e o direito de permanecerem em seus territórios tradicionais”, lembra.
Assim nasceu a Rede Tucum. Dentro dela estão comunidades quilombolas, indígenas e pesqueiras de vários municípios do Ceará, que se articularam para oferecer uma experiência diferente de turismo, aliando comunidade, sustentabilidade e gerando renda para quem nessa Rede vive.
As trilhas saem contando e mostrando a história da comunidade, dos conflitos que sofremos
“Na verdade a Rede Tucum não é um negócio, ela é uma rede de turismo solidário, ela é um movimento social baseado nas vivências da comunidades, do pescador, do agricultor, do artesão, dando oportunidade para as mulheres serem protagonistas de sua própria história”, afirma Ana.
Uma experiência diferenciada de turismo
Nesta perspectiva de turismo, tudo é pensado a partir da cultura da região, contando a história da comunidade e mostrando aos visitantes que é possível sim conhecer as belezas naturais sem impactar negativamente seu ecossistema, uma convivência harmônica e cheia de surpresas.
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Os próprios moradores organizam as hospedagens e os serviços de forma a compartilhar o trabalho e distribuir recursos.
“As comunidades se organizam com os grupos de artesãos e de pescadores que fazem os passeios. Na verdade, não é um simples passeio de barco, de canoa, é uma aula sobre o que é a pesca artesanal. As trilhas saem contando e mostrando a história da comunidade, dos conflitos que sofremos desses grandes especuladores que estão querendo tomar nossos espaços”, ressalta Ana, coordenadora da Rede.
Atualmente, onze destinos compõem a Rede Tucum: Assentamento Maceió (Itapipoca), Curral Velho (Acaraú), Caetanos de Cima (Amontada), Jenipapo Kanindé (Aquiraz), Reserva Extrativista do Batoque (Aquiraz), Reserva Extrativista da Prainha do Canto Verde (Beberibe), Ponta Grossa (Icapuí), Tremembé (Icapuí), Centro de Formação Frei Humberto (Fortaleza), Tatajuba (Camocim) e Vila da Volta (Aracati).
Saiba mais sobre a RedeTucum no site da organização ou nas redes sociais.
Edição: Douglas Matos