O centro de São Paulo tinha bares e restaurantes populares memoráveis
Frequentador de botecos, nestes tempos de pandemia, em que ando longe deles, tenho me lembrado de alguns que me marcaram muito.
O centro de São Paulo tinha bares e restaurantes populares memoráveis, ótimos, que nunca deviam ter sido fechados, deveriam fazer parte do patrimônio cultural da cidade.
Um deles era o Jeca. Tinha uma canja e um caldo verde ótimos e baratos. Em fim de noite, de madrugada mesmo, depois de alguma bebedeira, eu parava lá às vezes, antes de continuar a pé até meu apartamento a quase um quilômetro de distância.
Um que eu sinto não ter frequentado era o Tabu, na rua Vitória, bem no meio da Boca do Lixo, como chamavam a zona de prostituição.
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Era ponto de ex-jogadores de futebol decadentes, aos quais o dono sempre dava um prato de comida. Lá, iam também policiais, marginais, traficantes e gente comum. E conviviam sem encrencas.
Outro, que eu frequentava na hora do almoço — mais por achar divertido — era o Giratório. Ficava ao lado do largo do Paissandu.
Era um restaurante popular, estreito e fundo. Só funcionava para o almoço. Não havia mesas, a comida era servida no balcão. Só que com um detalhe: o balcão era giratório, com cadeiras que o acompanhavam. E a cozinha ficava no meio desse balcão giratório. Os pratos eram numerados, tinham suas composições escritas na parede, na entrada.
Formava-se uma fila em frente ao caixa, a gente pedia o prato pelo número e a bebida, pagava na entrada mesmo, e sentava numa cadeirinha, que ia girando junto com o balcão. Ao passar em frente a uma janelinha da cozinha, serviam o prato pedido (sempre certo) e a bebida. Eu achava o máximo.
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O balcão dava uma volta grande, com as respectivas cadeiras andando na mesma velocidade, claro, de modo que dava tempo de a gente almoçar calmamente antes de chegar à porta de saída.
Mas, sempre havia alguém que comia devagar demais, que chegava em frente à saída e continuava comendo. Aí, tinha direito de continuar, mas quem estava na fila de entrada não gostava dos vagarosos, pois era uma vaga a menos no balcão. E, frequentemente, ouvia-se uma vaia dada com gosto para algum desses retardatários.
Tinha dia que eu nem almoçava lá, mas parava na porta esperando que algum comilão vagaroso levasse uma vaia bem sonora e prolongada. E me divertia com isso.
*Mouzar Benedito é escritor, geógrafo e contador de causos. Leia outros textos.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Douglas Matos