Um pratinho colorido e nutritivo. Poucas coisas são tão gratificantes para os pais do que ver seu filho se alimentando bem. Afinal, ter acesso a uma boa alimentação nos primeiros anos de vida é fundamental para que a criança se torne um adulto saudável.
É o que explica a nutricionista Fabiana Fontes: “Nesse comecinho as crianças estão aprendendo a ter o paladar da fruta, a conhecer os alimentos, a ter o sentido dos sabores, saber o que é amargo, azedo, o que não é. Então a alimentação é fundamental pra você começar a criar um hábito alimentar saudável, pra que aquele adulto não coma só besteira, industrializados, então é na infância a base”.
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Mas com tantas influências externas, principalmente da indústria alimentícia, que atua de forma intensa por meio da publicidade dirigida às crianças, o trabalho de equilíbrio em casa acaba sendo um grande desafio, mesmo para aquelas famílias que puderem já iniciar a introdução alimentar escolhendo bem os alimentos.
É o que acontece na casa da empresária Ivna Pinheiro: “A alimentação é um tema que traz um pouco de aflição. Eu tenho 3 filhos e eles têm gostos bem distintos. Há uma dificuldade de montar um cardápio diverso com vários tipos de verduras, frutas e grãos, que seria o ideal, porque eles já estão numa idade - e eu tenho um filho de 8 anos, uma filha de 5 e outra de quase 3 - , em que são muito seletivos, aí fica um pouco difícil ser criativa nesses casos”, comenta.
Essa realidade seletiva não acontece só na casa da Ivna. Faz parte de um processo natural do nosso cérebro, que adora umas “facilidades” e que são, geralmente, muito bem satisfeitas pelos industrializados.
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A chefe de cozinha, educadora alimentar e especialista em alimentação infantil, Kika Hissa esclarece essa satisfação: “De forma geral eles têm muito açúcar, sal e gordura, que deixam seu sabor bem acentuado e fazem com que a gente tenha desejos por eles e que a gente queira sempre mais. E é muito mais fácil para uma criança, e até mesmo para um adulto, aceitar um biscoito, que tem sempre o mesmo padrão, a mesma cor, o mesmo sabor, do que uma fruta, por exemplo. Uma ameixa às vezes é mais azeda, às vezes é mais doce, às vezes é mais mole, outras vezes é mais firme, mais clara ou mais escura. Para o nosso cérebro é mais fácil reconhecer o que tem o mesmo padrão”.
Fabiana Fontes explica ainda que uma alimentação saudável é aquela rica em frutas, verduras, legumes e que o ideal é ofertar essa variedade de alimentos desde muito cedo. “Apresenta o brócolis, a cenoura, a batata-doce, o feijão. Vai variando as proteínas, um dia o frango, no outro dia o peixe”.
A nutricionista ensina ainda que o ideal é evitar as frituras e retardar, o máximo possível, a apresentação dos industrializados para elas. “Refrigerantes, embutidos, enlatados, sobremesas, doces, devem ser evitados. Se aquela criança não tiver o costume, ela não vai sentir falta”, garante. A especialista defende que se deve deixar as guloseimas como algo pontual.
Entretanto, dispensar as massas, frituras e os industrializados nem sempre é possível. Isso ocorre por diversos fatores que vão desde a situação socioeconômica, passando por hábitos culturais, a falta de tempo das pessoas e, vale ressaltar, pela influência da indústria alimentícia. Biscoitos e salgadinhos conseguem ser vendidos a preços mais acessíveis por serem produzidos em escala industrial. Também são mais fáceis de encontrar e de estocar.
Numa realidade de insegurança alimentar como a que vivenciamos hoje no país, tem sido ainda mais desafiador manter a qualidade alimentar das crianças que estão dentro do mapa da fome. Faltam políticas públicas que incentivem e fomentem a alimentação saudável. A julgar pelos incentivos à produção de soja, milho e outros no Brasil, os investimentos principalmente do governo federal, parecem ter outros objetivos. Enquanto o país bate recordes na exportação de alimentos, sofre com o desmonte das políticas de combate à fome.
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È o que afirma Malvinier Macêdo, Presidenta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do Ceará (Consea/CE).
“É vergonhoso, é inadmissível, é desumano é o retrato da ausência de políticas públicas. Eu considero que falta vontade política por que vários exemplos nós já tivemos do que deu certo: os equipamentos públicos de segurança alimentar e nutricional, restaurantes populares, cozinhas comunitárias, bancos de alimentos porque é inadmissível que um país que produz tanto, que tem tantas terras agricultáveis, tem gente pra trabalhar, que tenha já ciência, pesquisa, deixe a população sem ter o que comer”, declara a conselheira.
Fonte: BdF Ceará
Edição: Camila Garcia