ENERGIA

Sindicato atribui ineficiência no serviço de energia do RS a programa de demissão voluntária

Saída de mais de mil servidores da antiga CEEE e aposta na terceirização provoca queda na qualidade do atendimento

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
A Equatorial Energia fez um Plano de Demissão Voluntária no final de 2021, ao qual aderiram 998 funcionários ou 50% do efetivo da empresa - Foto: Claudio Fachel/Palácio Piratini

Um Plano de Demissão Voluntária (PDV) promovido pela Equatorial Energia - holding que comprou a companhia de energia elétrica do Rio Grande do Sul em março de do ano passado -, no final de 2021, é um dos eventos responsáveis pela deficiência no atendimento a milhares de consumidores de energia elétrica no Rio Grande do Sul, de acordo com avaliação do Sindicato dos Eletricitários (Senergisul) do estado.

Aderiram ao plano 998 funcionários - ou 50% do efetivo da empresa. Entre o cargos que estão vagos estão os de técnicos com experiência em manutenção de redes de distribuição, subtransmissão, redes subterrâneas e de subestações.

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Em nota distribuída à imprensa após vários dias com falta de luz no estado, o sindicato classifica como “desastre” o modelo de gestão da compradora da ex-CEEE.

Falta de energia

Distribuidora de energia em 72 municípios gaúchos, inclusive na capital, a CEEE-Equatorial tem sido alvo de reclamações não só dos consumidores  -- 60 mil deles ficaram sem luz durante cinco dias após temporal que atingiu a região metropolitana no começo deste mês. O Departamento Municipal de Água e Esgotos de Porto Alegre (DMAE) também cobrou publicamente a empresa pela demora em restabelecer a energia que afetou as estações de tratamento e deixou parte da capital sem água.

Da mesma forma, o Ministério Público do Rio Grande do Sul e a Defensoria Pública do estado pediram explicações à empresa. Na ocasião, em nota, a Equatorial sustentou que “não tem medido esforços para realizar melhorias em sua rede de distribuição”.

A empresa afirmou ainda que “desde a posse da concessão gaúcha, em julho de 2021, aproximadamente R$ 100 milhões já foram aplicados na rede elétrica no ano passado e outros R$ 432 milhões estão previstos para 2022”.

Os valores serão empregados “em projetos de novas subestações, expansão e melhoria de rede, manutenção e combate às perdas de energia”.  E, além disso, serão também “destinados à implementação de novos canais de atendimento e ajustes dos já existentes”, completou a nota. 

“A mão de obra especializada não existe mais”

No relato do Senergisul, a alta adesão ao PDV se deu pelo fato da Equatorial cortar benefícios dos empregados, como bônus-alimentação, auxílio ao plano de saúde, entre outros benefícios, desde março de 2021.

“O sindicato e a categoria unida dos eletricitários adquiriram, durante meses, centenas de cestas básicas para ajudar os trabalhadores que passaram dificuldades para alimentar suas famílias”, diz o texto da nota.

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“Embora com determinação judicial para o restabelecimento desses benefícios, a Equatorial descumpriu a decisão por muitos meses, forçando os empregados da antiga CEEE-D a se desligarem da empresa por total falta de condições de manter o sustento familiar com dignidade”, prossegue o documento.

Na argumentação do Senergisul, aqueles que aderiram ao PDV compunham uma parcela majoritária dos executores dos serviços essenciais operacionais da empresa. A nota afirma ainda que “para se ter uma ideia do caos”, o atendimento para manutenção de subestações “está praticamente sem profissionais qualificados e com expertise na empresa para atender quaisquer tipos de ocorrência”.

Como consequência disso, o sindicato cita “o grande incêndio” ocorrido na subestação de Viamão no dia 27 do mês passado. Avisa que, no atendimento à manutenção das redes subterrâneas no centro de Porto Alegre, o cenário é igual. “A mão de obra especializada não existe mais”, acentua, notando que, para um atendimento de qualidade, são necessários muitos anos para adquirir o conhecimento capaz de habilitar o profissional para atuar neste tipo de serviço especializado. 

Demissão também de quem não aderiu ao PDV

Para os eletricitários, a direção da Equatorial, além da adoção do PDV, “tão logo que findou a estabilidade de emprego de seis meses, imposta no edital de venda da CEEE-D, vem promovendo sistematicamente demissões em massa dos profissionais que não aderiram ao plano”.

A análise lista mais problemas. Para preencher as vagas abertas pelo PDV, a Equatorial – uma das tantas companhias do bilionário Jorge Paulo Lehmann, dono da AmBev – estaria contratando firmas terceirizadas, novatas no ramo e despreparadas para enfrentar a empreitada.

“No estado existem muitas cidades (entre as quais Bagé) que estão completamente desassistidas de eletricistas qualificados para o atendimento aos clientes”, assinala.

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Os contratados passariam por “curso relâmpago” e mandados para as ruas para atender emergências, “sem o acompanhamento e supervisão de profissionais mais antigos”. Na visão do sindicato, “não se forma um profissional do setor elétrico da noite para o dia, levando-se, no mínimo, cinco anos para que possa desenvolver suas atividades com segurança”.

De volta ao passado

O sindicato cita ainda o “desmonte promovido pela empresa no que tange aos veículos de cestos aéreos”. Teriam sido deixados de lado. “Regrediram a procedimentos antigos com o uso de escadas, com o intuito de redução de custos operacionais”, aponta.

A empresa extinguiu as equipes de podas de vegetais. Porém, boa parte dos cortes de luz se deve à interferência dos galhos de árvores nos alimentadores de média tensão e nas redes de baixa tensão. É uma tarefa que a Prefeitura de Porto Alegre deixou de fazer, cabendo as podas à distribuidora de energia elétrica.

Além da Equatorial, o Senergisul responsabiliza “a ação nefasta da política de privatização” seguida pelo governador Eduardo Leite – hoje no PSDB, mas de malas prontas para o PSD, do deputado federal Gilberto Kassab – e apoiada “pela ampla maioria dos deputados da Assembleia Legislativa”. Conforme o sindicato, a conta “já está sendo paga pela população”.

Resposta da Equatorial Energia

Na noite desta terça (15), a Equatorial enviou ao Brasil de Fato a seguinte nota sobre os problemas citados no texto:

“Nos últimos dias, a CEEE Grupo Equatorial informa que as interrupções de energia foram ocasionadas por três temporais seguidos, sendo um no domingo (6/3), de grandes proporções, além de dois na segunda-feira (7/3) nas regiões sul e metropolitana. 

Para o restabelecimento da energia aos 190 mil clientes impactados nessas intempéries, os prazos foram distintos, dependendo da complexidade de cada caso. Uma situação simples de falta de energia ocasionada por vento é diferente de outra, que envolve, por exemplo, queda de árvores de grande porte ou objetos sobre a rede elétrica

Em ocorrências mais complexas, são necessários os seguintes serviços:
- deslocamento e acesso de equipes às localidades com fornecimento interrompido, em alguns casos, dificultados pelas próprias ocorrências, alagamentos e dificuldade de trânsito;
- ações em parceria com outros órgãos públicos (Defesa Civil, SMAM, Corpo de Bombeiros, EPTC, etc.), já que alguns serviços prestados são interligados e envolvem várias atividades;
- isolamento da área afetada, retirada de objetos e reconstituição de postes quebrados e de toda a rede elétrica.

A CEEE Grupo Equatorial, conforme citado acima, nega que a demora no restabelecimento seja ocasionado pelo Programa de Demissão Voluntária (PDV) e afirma que o programa foi optativo, havendo a escolha, por parte dos funcionários, em aderir à proposta. Vale ressaltar que solicitaram saída da CEEE Grupo Equatorial 998 pessoas.

Até outubro de 2022, empresas terceirizadas contratarão 1,6 mil funcionários que prestarão serviços à companhia de energia em obras, serviços de campo e comerciais, fiscalizações e plantões de atendimento, sendo que 70% deste contingente já será efetivado no primeiro semestre deste ano”.

Fonte: BdF Rio Grande do Sul

Edição: Ayrton Centeno