O governo Bolsonaro pretende lançar, ainda no primeiro semestre, o edital de privatização do metrô de Belo Horizonte. Atualmente, o serviço é de responsabilidade da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), empresa pública federal que também administra os metrôs de João Pessoa, Maceió, Natal e Recife.
De acordo com Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), a assinatura do Acórdão no Tribunal de Contas da União (TCU) está prevista para o início do mês de junho e a publicação do edital tem que ser feita 45 dias antes do leilão. O pregão está previsto para acontecer no dia 28 de julho deste ano, segundo a apresentação realizada em Audiência Pública.
Para trabalhadores do metrô e estudiosos do assunto, se for concretizada, a privatização trará aumento nas tarifas, perda de qualidade e transferência de recursos públicos para o setor privado.
Tarifa mais cara
Ao contrário do que pregam os defensores da privatização, a entrega para o setor privado não reduz o preço da passagem. Um exemplo é o Rio de Janeiro, onde o serviço era ofertado pela CBTU até 1997, quando foi privatizado.
Atualmente, as linhas de trens urbanos e metrô são administradas por dois consórcios: a Supervia, pertencente ao grupo japonês Mitsui, que cobra R$ 5 por uma viagem de trem; o MetrôRio, controlado pela Invepar S/A, que, a partir de sábado (2), cobrará R$ 6,80 por bilhete unitário.
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“No Rio, quando era da CBTU, a tarifa sempre foi mais barata que a do ônibus. Privatizada, ficou mais cara”, afirma o diretor de comunicação do Sindimetro-MG, Pablo Henrique Ramos.
Ele também lembra o caso de São Paulo, onde a Linha 4-Amarela foi entregue à iniciativa privada e o preço é o mesmo que no público. “Na linha privada, além dos R$ 4,40 que o usuário paga, o governo repassa mais R$ 1,90 por passageiro. Então, a população não paga diretamente, mas indiretamente ela também paga, no imposto”.
No caso da CBTU, antes mesmo que se efetue a privatização, as cinco cidades têm passado por aumentos na tarifa. Em Belo Horizonte, só no governo Bolsonaro, o valor pago por uma viagem cresceu 150%, desde 2019.
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Se nos 12 anos anteriores o usuário pagou R$1,80, desde 2019, o valor foi reajustado seis vezes, até chegar aos atuais R$ 4,50. Isso porque, se entre 2006 e 2018 houve uma política de subsídios ao preço da passagem, a fim de que a população pagasse mais barato, no governo Bolsonaro, essa política foi revista.
“A CBTU entrou na linha de cortes do governo, a fim de cumprir o Teto dos Gastos (Emenda Constitucional 95)”, afirma o economista André Veloso, integrante do Movimento Tarifa Zero.
Sinal para o mercado
Além disso, o aumento da tarifa pode acabar funcionando como um sinal para o mercado, abrindo caminho para a privatização, ao indicar que o investimento pode ser rentável. Foi o que defendeu, inclusive, o senador Carlos Viana (MDB), então aliado do governo, em maio do 2021. “Quanto mais obras exigirmos, dependendo do prazo, mais tem que se aumentar a tarifa”, disse.
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Investimento público, lucro privado
De acordo com o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), para efetuar a privatização, cerca de R$ 3,2 bilhões deverão ser investidos, em recursos públicos federais e estaduais.
O consórcio que adquirir o serviço terá o direito de explorar a concessão por 30 anos. Segundo o PPI, o valor mínimo de outorga no leilão será de R$ 83,4 milhões, com exigência de investimentos de R$ 703 milhões.
“Quem comprar vai ter na ‘sua conta’ 35 trens, estações, todo o maquinário e o investimento de R$ 3,2 bi! Em qual investimento você põe R$ 83 milhões e logo depois recebe R$ 3,2 bi?”, questiona Pablo Henrique Ramos, do Sindimetro-MG.
Privatização não é sinônimo de expansão
Em outubro, após encontro com Bolsonaro em Belo Horizonte, Romeu Zema (Novo) alegou que uma eventual privatização permitiria expandir o metrô, criando novas linhas. “Será de interesse da concessionária expandir, o que significará aumento de usuários”, disse o governador de Minas e aliado do presidente.
O economista André Veloso adverte: a privatização e a expansão não são a mesma coisa. “Mesmo que a operadora invista na expansão para ganhar mais dinheiro, depois, ela receberia recursos do estado. É praticamente impossível fazer um sistema metroviário que se pague só com a tarifa. Então, toda forma de operação que ele tiver demandará recursos públicos”.
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No contexto das obras para a Copa do Mundo 2014 e as Olimpíadas de 2016, em cidades como Rio, São Paulo e Salvador, o Brasil expandiu sua rede de transportes sobre trilhos em 11%, isto é, 113 km. Essa expansão não teria ocorrido sem aporte de investimentos públicos, embora considerados insuficientes.
Serviço fica pior
No dia 28 de março, passageiros da Supervia, no Rio de Janeiro, protestaram com barricadas e fogo nas estações de Deodoro, Santa Cruz, Paracambi e Japeri. Segundo os moradores, o serviço apresentava atrasos frequentes ou até interrupções inesperadas, prejudicando quem contava com o trem para ir trabalhar.
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Para os metroviários de Minas Gerais, esse e outros episódios, que se repetem quase todos os dias, desmentem o mito de que o setor público é pior que o privado e, por consequência, a privatização promoveria uma elevação na qualidade do serviço. “O metrô aqui, por conta da nossa greve, abriu às 10h. Lá no rio, o trem não tinha aberto ao meio-dia”, exemplifica Pablo Henrique.
No mundo, privatizações foram revertidas
Recente estudo do Public Service Europe Union (PSEU), sindicato que representa oito milhões de servidores na Europa, analisou os desempenhos dos setores público e privado nos transportes e em outras áreas. A conclusão foi que a eficiência do setor público é maior. O estudo também recorda casos de privatizações de serviços municipais que depois foram reestatizados.
Com relação ao transporte sobre trilhos, o estudo faz a seguinte comparação: “As vantagens da privatização não são tão grandes quanto aquelas obtidas no período posterior da gestão do setor público”.
Outra pesquisa, realizada pelo Transnational Institute, mostrou que, entre 2000 e 2017, pelo menos 884 serviços foram reestatizados no mundo. Só na Alemanha, foram 348 serviços estatizados. Na Inglaterra, 152.
Em Londres, em 2010, a prefeitura rompeu antecipadamente um contrato de parceria público-privada do metrô, a fim de obter mais agilidade e menos custos em um projeto de expansão.
Fonte: BdF Minas Gerais
Edição: Elis Almeida