O químico José Mauro Ferreira Coelho, 57 anos, foi indicado pelo governo federal para a presidência da Petrobras. Relativamente desconhecido, Coelho vai assumir o posto que seria ocupado pelo economista e consultor Adriano Pires, que desistiu da vaga depois de questionamentos na imprensa sobre eventuais conflitos de interesses.
Pires é um dos principais executivos do mercado de petróleo brasileiro. Por meio de sua consultoria Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), presta serviços para as principais empresas do setor. Por conta dessa relação, seu nome foi inviabilizado.
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Coelho, por sua vez, praticamente não tem experiência no setor privado. Até tentou ter. Em outubro de 2021, quando ainda era secretário de Petróleo e Gás do Ministério de Minas e Energia (MME), pediu demissão avisando que buscava "novos desafios na iniciativa privada brasileira". Acabou mesmo na presidência do conselho de administração da Pré-Sal Petróleo (PPSA), estatal responsável por representar o governo nos contratos de partilha da produção do pré-sal, que dão à União parte do petróleo extraído.
Antes de chegar à PPSA e trabalhar no MME, Coelho foi diretor de Estudos do Petróleo, Gás e Biocombustíveis da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), estatal voltada a estudos sobre energia elétrica, combustíveis e outros temas. Ele trabalhou na EPE de 2007 a 2020, quando foi para o ministério. Em seu currículo disponível na internet, Coelho ostenta que foi aprovado em primeiro lugar no concurso da empresa.
O currículo também indica que Coelho é graduado em Química Industrial, com mestrado em Engenharia dos Materiais pelo Instituto Militar de Engenharia (IME). Também tem doutorado em em Planejamento Energético pelo Programa de Planejamento Energético (PPE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ele, aliás, já deu aulas na UFRJ.
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Carreira política frustrada
Como “prof. José Mauro”, Coelho tentou eleger-se deputado estadual no Rio de Janeiro, em 2006. Foi candidato ao cargo pelo PSDB. Obteve 1.437 votos e não foi eleito.
Naquela eleição, declarou à Justiça Eleitoral um patrimônio de pouco mais de R$ 82,4 mil. Desse valor, R$ 80 mil eram referentes a um apartamento financiado pela Caixa Econômica Federal no bairro da Pechincha, zona oeste do Rio.
Outros R$ 2 mil eram referentes a uma participação que ele mantinha na empresa Cage Consultoria Empresarial, que hoje é considerada inapta pela Receita Federal por conta de omissão de declarações ao fisco. Coelho já não aparece mais no quadro societário da empresa.
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Apesar de não ter conseguido uma vaga na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), Coelho recebeu em 2018 a Medalha Tiradentes, comenda mais importante do Poder Legislativo fluminense.
O reconhecimento da Alerj a Coelho foi uma ideia do então deputado Milton Rangel, na época filiado ao DEM. Rangel é membro da igreja do pastor Valdemiro Santiago, Igreja Mundial do Poder de Deus.
Apoio à privatização e PPI
O novo indicado à presidência da Petrobras também tem histórico de defesa das políticas do governo de Jair Bolsonaro (PL) para a companhia. Já defendeu a chamada paridade de preços de importação (PPI), que atrela o preço dos combustíveis no Brasil ao mercado internacional, além da privatização de partes da estatal, quando trabalhava no MME.
A PPI é apontada como a principal causa da alta da gasolina e do diesel no país. Em entrevista à TV Brasil, em 2021, Coelho disse que ela é necessária para garantir que importadores continuem trazendo combustíveis ao país, garantindo o abastecimento.
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"Temos que ter os preços no mercado doméstico relacionados aos preços de paridade de importação. Se assim não fosse, não teríamos nenhum agente econômico com aptidão ou com vontade de trazer derivados para o país", falou à época.
Já sobre a venda de partes da estatal, ele afirmou em audiência pública virtual realizada pela Câmara dos Deputados também em 2021 que é positiva pois possibilita que a Petrobras foque seus esforços no que mais sabe fazer: extrair petróleo, abrindo espaço para que outras empresas atuem no refino de combustível no país.
Por conta dessas posições, o coordenador geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Bacelar, acredita que Coelho não implementará mudanças na Petrobras e fará na estatal o que o governo Bolsonaro quer: “trabalhar para entregar a Petrobras para a iniciativa privada”.
“Vejo a indicação do José Mauro Ferreira Coelho para presidir a Petrobras com grande preocupação. Parece mais um burocrata, conveniente, cordato e defensor das privatizações e da atual política de preços dos combustíveis”, resumiu Bacelar.
“Depois do problema com o Adriano Pires, o governo nomeou para presidência da Petrobras alguém que não tem expressão, assim não cria problema”, complementou Eric Gil Dantas, economista do Observatório Social da Petrobras (OSP). “Isso contrasta com o que seria necessário para esse cargo. É preciso algum tipo de reconhecimento.”
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Derrota do governo e da população
William Nozaki, professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), disse que a indicação de Coelho é uma derrota para governo e população. O governo, segundo ele, quis agradar o mercado e partidos do chamado "Centrão" nomeando Pires à presidência. A indicação, porém, não sobreviveu a testes de governança e integridade.
Já a população perdeu, segundo Nozaki, porque o valor de mercado da Petrobras caiu durante a crise das nomeações frustradas e porque o preço do combustível continuará subindo: “Bolsonaro empurrando o problema com a barriga calendário eleitoral adentro”, avalia.
Edição: Felipe Mendes