Eleições na França

Beneficiado por “vácuo” na UE e guerra, Macron ganha força contra extrema direita e esquerda

Na busca por segundo mandato; atual presidente espera entre Le Pen e Mélenchon o provável candidato de segundo turno

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Marine Le Pen em evento da eleição em Perpignan, sul da França - Lionel Bonaventure / AFP

O atual presidente da França, Emmanuel Macron, viu sua vantagem nas pesquisas de opinião para as próximas eleições presidenciais encolher, mas chega no pleito deste domingo (10) como líder nas intenções de voto. O seu concorrente em um provável segundo turno, todavia, é incerto, com Marine Le Pen e Jean-Luc Mélenchon buscando ocupar essa posição. 

De acordo com pesquisa da IFOP, Macron tem 27% das intenções de voto, enquanto Le Pen tem 24% e o esquerdista Mélenchon tem 18%. Quando nenhum candidato alcança mais de 50% das intenções de voto, a França realiza um segundo turno, previsto para 24 de abril.

Cerca de 20% dos eleitores ainda afirmam estar indecisos. Os índices de abstenção também são consideráveis e podem ser superiores a 30% do eleitorado, o que contribui para a imprevisibilidade do quadro.

Eleito em 2017 com a promessa de transformar a França em uma "nação startup", Macron busca agora a reeleição com dados favoráveis na economia. O PIB cresceu 7% em 2021, na comparação com 2020, e o índice de desemprego é o menor em 45 anos: 12,6%. A oposição, todavia, questiona os números e diz que parte considerável dessas vagas são de baixa remuneração.

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Outro elemento que joga a favor de Macron é a guerra na Ucrânia. Ao dialogar com o presidente da Rússia, Vladimir Putin, Macron busca capitalizar o fato de a França ocupar a atual presidência rotativa da União Europeia, bloco que perdeu a liderança da chanceler alemã Angela Merkel após ela ficar 16 anos no poder.

“A guerra na Ucrânia deu a Macron uma possibilidade maior, força e oportunidade única de fazer uma campanha sem esforço nenhum e de ganhar e possivelmente ser reconduzido para um segundo mandato”, afirma Mohammed Nadir, professor de relações internacionais da UFABC, que também avalia que o presidente francês se beneficia do "vácuo" da saída de Merkel e da apatia do atual chanceler alemão Olaf Scholz.

O atual presidente quer aumentar a idade de aposentadoria para 65 anos, ante os 62 atuais, e também prometeu reforçar o policiamento nas ruas ao liberar milhares de agentes de segurança de atividades administrativas.


Macron em evento de campanha / Ludovic Marin / AFP

E a extrema direita?

Nome tradicional da extrema direita francesa, Le Pen viu um novo candidato candidato competitivo na raia, Eric Zemmour, que chegou a ter mais intenções de voto do que Le Pen em dezembro de 2021, mas ela recuperou a dianteira do setor. O escritor e jornalista Zemmour tem hoje 8% das intenções de voto.

Opositora da imigrantes e do recebimento de refugiados, Le Pen agora admite que a França pode receber refugiados da guerra na Ucrânia. Ela deixou de ser a candidata com posições mais radicais sobre o tema já que Zemmour defende uma "imigração zero" e quer enviar de volta 100 mil imigrantes por ano para Argélia, Tunísia e Marrocos.

"Ela foi ganhando um espaço, pela primeira vez ela foi ganhando simpatias até no campo da esquerda. Então estamos a observar uma Marine Le Pen nova, com visual novo, mas apenas em termos estéticos. As ideias de fundo não mudaram bastante” , diz o professor da UFABC ao Brasil de Fato.

Pesquisador visitante da UFRJ e diretor do Instituto Francês de Pesquisa para o Desenvolvimento Sustentável, o francês François Roubaud afirma que o início da eleição foi dominado por debates sobre imigração pautados pela extrema direita, mas agora o assunto principal é a queda do poder de compra da população diante do aumento dos preços de alimentos e combustíveis por influência da guerra na Ucrânia.

"Frente à dificuldade econômica da classe baixa, popular, ou média baixa, se substitui o enfrentamento clássico entre esquerda e direita, luta de classes, [por] uma forma de luta de raças entre os nacionais e estrangeiros", diz Roubaud. "Isso se nutre também da violência concentrada nos bairros populares com muita imigração do islamismo."

Mohammed Nadir ressalta que Zemmour chamou seu partido de "Reconquista", em uma alusão à Guerra da Reconquista, um conflito de mais de sete séculos que resultou na "expulsão dos árabes, muçulmanos e judeus também, sobretudo, da Península Ibérica”.

"A relação da França com suas colônias no norte da África é muito antiga, muito forte e muito próxima. Ela é perturbada pelo passado colonial, pelo o que aconteceu na Argélia sobretudo", avalia Nadir.

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O cenário de um possível segundo turno entre Le Pen e o atual presidente é acirrado. Macron tem 53% das intenções de voto, frente a 47% de Le Pen. Em outras eleições, todavia, houve ampla coalizão para barrar a extrema direita no segundo turno: em 2002 Jean-Marie Le Pen, pai da atual presidenciável, perdeu para Jacques Chirac e, em 2017, a própria Marine Le Pen viu centro e esquerda somarem forças para derrotá-la nas urnas.

Um possível segundo turno entre Macron e Mélenchon seria mais favorável ao atual presidente. Neste cenário, Macron tem 59% das intenções de voto, frente a 41% do candidato do movimento "A França Insubmissa".

Mélenchon defende que a idade de aposentadoria seja 60 anos, aumentar o salário mínimo em 15% e retirar a França da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Em crescimento nas pesquisas, sua campanha adotou a tartaruga como símbolo: “Avanço devagar, mas canso as lebres", disse o presidenciável.

Edição: Arturo Hartmann