Para nós, feministas anticapitalistas e antirracistas, a vida deve estar no centro da ação política
Nesta semana, compartilhamos na Coluna Sempreviva um texto da Marcha Mundial das Mulheres em preparação para o 24 de abril, Dia de Solidariedade Feminista Internacional Contra as Empresas Transnacionais. O texto, muito informativo, explica a história da data, que relembra as mais de mil vítimas da queda do edifício Rana Plaza, em 2013, em Bangladesh.
Rana Plaza era um complexo de oficinas têxteis precárias, onde trabalhavam principalmente mulheres, em regime análogo à escravidão. Desde então, as famílias lutam por justiça e as organizações denunciam a impunidade das empresas transnacionais que exportavam e vendiam as roupas produzidas ali.
:: A solidariedade feminista internacional é princípio de luta e organização ::
Neste ano, a Marcha Mundial das Mulheres definiu internacionalmente que centrará suas ações da data na denúncia à indústria da guerra. As guerras e conflitos militarizados que acontecem ao redor do mundo afetam profundamente a vida das mulheres, em múltiplas dimensões. E, por trás desses conflitos, há a indústria da guerra, que lucra com a violência, a morte, as ruínas materiais e imateriais.
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O texto abaixo traz informações sobre o poder nocivo dessa indústria globalmente e na realidade brasileira.
No dia 24 de abril de 2022, mulheres do Brasil e de todo o mundo vão às ruas para denunciar o poder das empresas transnacionais, as grandes corporações que exploram nossos trabalhos, vidas, corpos e territórios.
Esse foi definido como um dia de luta porque, no dia 24 de abril de 2013, em Bangladesh, o edifício Rana Plaza desabou, causando a morte de 1138 pessoas. Elas trabalhavam nas confecções têxteis que ocupavam o prédio. Confecções que pertencem a grandes empresas transnacionais, como a Zara, a GAP e a Walmart. 80% das pessoas que morreram eram mulheres.
A mensagem que o desabamento de Rana Plaza passou era clara e perversa: para as empresas transnacionais e para o capitalismo, a vida não vale nada, o que importa mesmo é o lucro.
Desde 2013, transformamos o 24 de abril em uma data de solidariedade internacional e ação feminista
Desde 2013, transformamos o 24 de abril em uma data de solidariedade internacional e ação feminista. Ano após ano, fomos expandindo nosso debate e entendendo a lógica perversa das grandes corporações. O 24 de abril se transformou nesse dia de luta da Marcha Mundial das Mulheres contra o poder das transnacionais.
Em 2022, nossas mobilizações denunciam a indústria da guerra. Quem incentiva e lucra com as guerras que destroem a vida das mulheres e dos povos?
Mulheres em luta por paz e desmilitarização
Vivemos em um tempo de guerras. Além da guerra na Ucrânia, que é notícia dos meios de comunicação, redes sociais e assunto nas conversas informais, muitos outros povos enfrentam guerras em seus territórios. Siria, Iêmen, Palestina, Saara Ocidental... As guerras podem ter formatos de bombardeios e destruições diretas, mas também de sanções e ocupações violentas.
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As mulheres resistem e enfrentam as guerras, denunciam o impacto dos conflitos nos territórios, no aumento da fome e destruição das condições de vida.
Lutamos contra todos os mecanismos que produzem as guerras, e por isso nosso feminismo é anti-imperialista!
Mas, afinal, quem lucra com as guerras?
A guerra provoca mortes, destruição e expulsão de milhões de pessoas de seus lugares de vida. E tudo isso gera lucro e riqueza para poucos, seguindo a mesma lógica de acumulação do capital. A guerra é um mecanismo do imperialismo.
Nos últimos anos os Estados Unidos atacou sistematicamente a soberania dos povos. Em nome da “democracia”, os EUA atacaram e invadiram mais de 10 países desde 2000. Também expandem seu poder imperialista com cerca de 750 bases militares em 80 países.
O imperialismo tem vários instrumentos combinados para manter seu poder. Isso acontece em Cuba e na Venezuela, com os embargos econômicos; acontece no Brasil, com o financiamento do golpe e de setores de extrema direita; e acontece com a ocupação da Palestina, com a aliança permanente com Israel.
A lista de países e territórios onde as guerras são causadas e trazem lucros aos empresários da guerra nos EUA é grande! Cada vez que um conflito acontece, as ações das empresas de armas e tecnologias de guerra sobem na bolsa de valores.
Um dos principais instrumentos de que os EUA dispõem para exercer esse poder é a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Além dos países europeus, a OTAN está se expandido territorialmente e esse foi um dois muitos fatores que estão na origem do conflito entre Rússia e Ucrânia.
Essa guerra é na Ucrânia, mas os interesses que estão em jogo vão muito além desse território. A violência, morte e destruição fazem parte das disputas geopolíticas na ordem mundial, e quem paga a conta são os povos e as mulheres.
É preciso denunciar todos os responsáveis por essa guerra: os EUA e a OTAN que incitaram a guerra; a extrema direita fortalecida militarmente pelo governo ucraniano, que intensifica desde 2014 conflitos e assassinatos em Donbass; e a Rússia que iniciou os bombardeios e ataques em 24 de fevereiro desse ano.
Na Marcha Mundial das Mulheres a paz é nossa exigência, e a paz não pode ser alcançada com mais guerras. Nos somamos as vozes que reivindicam as negociações como único caminho para a paz.
Estamos organizadas em todo o mundo contra a militarização e pelo fim de todas as guerras. Estaremos em luta feminista pela paz, até que todas as mulheres e territórios sejam livres!
A indústria da guerra no Brasil
A “guerra” no Brasil é diferente. O que os grandes meios de comunicação chamam de guerra às drogas é, na verdade, uma “guerra” permanente contra as pessoas pobres, negras e periféricas. Esse é um ataque unilateral contra o povo e por isso escrevemos “guerra” entre aspas. Um ataque que traz lucros para a indústria das armas e para as transnacionais que produzem tecnologias de vigilância, espalhadas por todos os cantos. Essas tecnologias de vigilância são importadas de países como Israel, que tem aliança com os EUA.
No Brasil enfrentamos uma política de morte institucionalizada. A cada 23 minutos, um jovem negro é assassinado no Brasil. As mulheres negras são as que mais sofrem com isso, perdendo seus filhos para a violência policial ou pelo encarceramento em massa de jovens negros. As mulheres negras se levantam em resistência permanente.
Durante as eleições de 2018, Bolsonaro fez culto às armas, às instituições repressoras e à violência. Dias antes do segundo turno, as ações da fabricante de armas Taurus saltou 400%. É preciso compreender que existem grupos políticos e econômicos ganhando com essa política de morte e com a guerra.
A aliança entre as empresas transnacionais, a militarização e os Estados perpertua o poder e a violência. O crescimento do porte de armas no Brasil sob o governo Bolsonaro aumentou os números da violência contra as mulheres e a tornou mais letal.
:: Número de armas de uso amador circulando no Brasil já supera o da Polícia Militar ::
No campo, as empresas do agronegócio e da mineração, que promovem desmatamento e destruição, estão cada vez mais militarizadas. Pessoas ligadas a essas empresas agem com violência, expulsando as pequenas agricultoras e os pequenos agricultores e comunidades tradicionais de suas terras, para expandir sua produção e seus lucros. Tudo isso é feito com conivência do Estado que não fiscaliza, não pune e fecha os olhos para essa violência.
Não aceitamos que os interesses das empresas transnacionais e dos governos a serviço do capital estejam acima da vida. Para nós, feministas anticapitalistas e antirracistas, a vida deve estar no centro da ação política. Lutamos por paz e desmilitarização, pela soberania e autodeterminação dos povos! Não queremos apenas o fim da indústria da guerra. Queremos o fim do poder corporativo, do capitalismo racista e patriarcal. Basta de impunidade e exploração!
Queremos o fim do poder corporativo, do capitalismo racista e patriarcal
Nos organizamos por todo o mundo contra a militarização, pelo fim de todas as guerras. Neste 24 de abril de 2022, estaremos nas ruas, redes e roçados para denunciar a ofensiva neoliberal e imperialista que avança sobre a soberania dos povos e seus territórios com sua indústria bélica e fechamento de fronteiras.
Resistimos para viver, marchamos para transformar!
*A Coluna Sempreviva é publicada quinzenalmente às terças-feiras. Escrita pela equipe da SOF Sempreviva Organização Feminista, ela aborda temas do feminismo, da economia e da política no Brasil, na América Latina e no mundo. Leia outras colunas.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Rebeca Cavalcante