Hospitais filantrópicos e Santas Casas de todo o país correm o risco de fechar as portas em meio à falta de repasses financeiros do governo federal para os atendimentos no Sistema Único de Saúde (SUS). De acordo com levantamento da Confederação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos (CMB), nos últimos seis anos, 315 instituições tiveram que encerrar os serviços no país por não ter verba suficiente para continuar operando.
A entidade diz que a situação se agravou durante a pandemia de covid-19, com o país sob o governo do presidente Jair Bolsonaro (PL). A crise sanitária elevou a demanda e os custos, fazendo com que a dívida do setor ultrapassasse os R$ 20 bilhões. Em maio do ano passado, Bolsonaro anunciou um aporte emergencial de R$ 2 bilhões para os hospitais. Contudo, até o momento, a quantia não foi repassada.
O Brasil de Fato entrou em contato com o Ministério da Saúde, questionando a falta de repasses prometidos ao setor. No entanto, até o momento da publicação da matéria, não houve retorno. O espaço permanece aberto.
Atos pelo país
Nessa terça-feira (19), hospitais filantrópicos e Santas Casas de todo o país realizaram uma paralisação simbólica, em protesto contra a falta de repasses financeiros do governo federal. Com intuito de chamar atenção para as necessidades do setor, as organizações decidiram reagendar procedimentos eletivos. No entanto, os serviços emergenciais foram mantidos. Algumas unidades mantiveram todos os atendimentos, mas incentivaram os funcionários a usar roupas pretas.
A CMB informou que na semana de 25 a 28 de abril, ocasião em que a capital federal receberá a XXIII Marcha a Brasília em Defesa dos Municípios, reunindo prefeitos de todas as partes do país, pretende buscar reuniões com lideranças políticas. Entre elas, a presidência da República, as presidências da Câmara e do Senado e demais parlamentares, além de ministérios, para falar sobre os problemas financeiros da rede de hospitais.
Além da falta de recursos, o setor enfrenta outra preocupação: tramita na Câmara Federal, com votação prevista para os próximos dias, o projeto de lei nº 2564/20, que institui o piso salarial da enfermagem. A CMB diz que, no texto, não é indicada nenhuma alternativa de financiamento, “o que traz o sentimento de desespero do setor em como arcar com os custos, se a matéria for aprovada”. O impacto da proposta seria de R$ 6,3 bilhões.
“Não somos contrários ao projeto, muito pelo contrário, os hospitais valorizam todos os profissionais de saúde e somam esforços com as categorias profissionais na busca por uma fonte de receita que possibilite o financiamento de remunerações mais justas. Mas a nossa realidade torna o cumprimento desse projeto insustentável e estabelecendo-se definitivamente a falência dessas instituições”, diz o presidente da CMB, Mirocles Véras.
“As Santas Casas e hospitais filantrópicos requerem a alocação de recursos na ordem de R$ 17,2 bilhões, anualmente, em caráter de urgência urgentíssima, como única alternativa de assunção das obrigações trabalhistas decorrentes do projeto de lei nº 2564/20, assim como para a imprescindível adequação ao equilíbrio econômico e financeiro no relacionamento com o SUS”, argumenta Véras.
Além desta proposta envolvendo o setor, existem outros 53 projetos de lei em tramitação referentes a piso salarial de profissionais do setor saúde, o que, de acordo com a CMB, causa “evidentes preocupações sequenciais”.
União do setor
O presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Ronald Ferreira dos Santos, afirmou que a iniciativa das Santas Casas e dos hospitais filantrópicos é extremamente necessária neste momento de “desfinanciamento do SUS”. Para ele, agora é a hora de “somar todas as forças em torno da luta por um financiamento justo”.
“Não só as Santas Casas, mas boa parte da estrutura do SUS precisa dar conta das sequelas da pandemia. Nesse momento, o importante é somar todas as forças em torno da luta do financiamento justo. Não há outro caminho que não seja aproveitar o processo eleitoral e colocar no centro da pauta a revogação do teto de gastos, que traz como consequência o déficit no SUS”, avaliou Ronald.
De acordo com Santos, o sistema público de saúde enfrenta um colapso em várias de suas estruturas, que não dão conta de atender as demandas da população brasileira. Ele disse que, durante a pandemia, sem verbas destinadas à saúde pública, o SUS viveu um “quadro de agonia” e fez um “verdadeiro milagre” ao operar com os próprios recursos.
Ronald credita ao governo de Jair Bolsonaro boa parte da situação caótica em que o SUS se encontra. “Bolsonaro é o governo da morte. Ele despreza a vida. Tudo o que representa a proteção da vida e natureza é substituído. A proteção que advoga esse governo é armar a população. Esse governo é a antítese do que representa o SUS. Não é um governo, é um desgoverno. Não tem negociação com o governo da morte”, falou.
Edição: Felipe Mendes