A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) denunciou o presidente Jair Bolsonaro (PL) à Organização das Nações Unidas (ONU) pelo indulto concedido ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ). O parlamentar foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), na última quarta-feira (20), a 8 anos e 9 meses de prisão, por ataques à democracia. Em informe encaminhado ao relator especial da ONU sobre Independência de Juízes e Advogados, Diego García-Sayán, a ABI afirma que o decreto presidencial “afronta a democracia, a separação de poderes, a independência do Judiciário e a administração da Justiça”.
A denúncia foi ainda registrada como “grave violação dos direitos no Brasil”. Segundo a associação, a concessão do perdão a Daniel Silveira deve ser entendida “como uma usurpação de poderes”. A avaliação é que Bolsonaro utilizou-se de institutos públicos para interesses próprios, resultando em desvio da finalidade do ato administrativo. Daniel Silveira foi condenado pelo STF por 10 votos favoráveis, com apenas um contrário. Além da prisão em regime fechado, o parlamentar, que é amigo pessoal do clã Bolsonaro e aliado político do presidente, também foi condenado a perda do mandato e dos direitos políticos e multa de R$ 212 mil.
No entanto, com a graça concedida pelo ex-capitão, todas as penas impostas foram retiradas. O documento da ABI, elaborado pelos advogados Carlos Nicodemos e Maria Fernanda Fernandes Cunha, conclui que o ato do presidente “viola os princípios da impessoalidade e moralidade”. E “ameaça a separação de poderes e a independência do poder judiciário”. A associação ainda destaca descumprimentos a dispositivos legais internacionais, como resoluções do Conselho de Direitos Humanos da ONU que asseguram a imparcialidade, a independência e a integridade do Judiciário, assim como o Estado democrático de direito.
Contexto de ameaças
“O ato de Jair Bolsonaro merece a atenção do Exmo. Relator Especial para a garantia dos direitos humanos e da administração da justiça no Estado Brasileiro”, justifica a ABI. O informe também solicita uma reunião com urgência a García-Sayán, em conjunto com outras entidades da sociedade civil, “para discutir o contexto de ameaças à democracia” do Brasil. A associação também pede ao relator especial da ONU que se posicione frente às violações ocorridas com emissão de nota pública. E finaliza requisitando à organização internacional que acompanhe e monitore os desdobramentos do caso.
Ainda nesta segunda-feira (25), o presidente da República voltou a alegar que o decreto de perdão aos crimes de Daniel Silveira é constitucional e será cumprido. Na sexta (22), ele já havia defendido a “graça” como um “ato simbólico”. A atitude do mandatário, no entanto, vem sendo condenada também no meio jurídico, como ressaltou o advogado Fabiano Silva dos Santos, membro do grupo Prerrogativas, ao Jornal Brasil Atual. “Realmente tem um simbolismo grande esse ato dele, mas um simbolismo de desrespeito, de chacota a uma decisão judicial. É lamentável esse tipo de comportamento do presidente Jair Bolsonaro”, criticou.
Em meio à escalada de pressão entre Bolsonaro e o Judiciário, o meio jurídico também cobra ações do Congresso para evitar uma tragédia maior à democracia brasileira. Mas, segundo informações da colunista Bela Megale, de O Globo, nos bastidores a derrubada do decreto divide o STF. Uma ala avalia que Bolsonaro pode alimentar a narrativa de que a Corte interfere demais nos poderes se reagir. Mas outra parte dos ministros avalia que é preciso dar uma resposta “a mais essa afronta” de Bolsonaro, que esticará a corda de qualquer maneira.