Eu uso a arte como forma de remédio. Ela acaba sendo remédio pra mim, né?
Pintar o inconsciente. A vida de Édson tomou outro rumo quando ele passou a criar a partir dos sonhos. Suas obras vibrantes e cheias de cores, hoje são inseparáveis para o tratamento da Esquizofrenia.
"Essa doença me causa muito transtorno e muita dor. Às vezes eu sorrio, eu sou um cara alegre, mas a doença me traz muita muita insatisfação, muita tristeza. E um mecanismo de escape de fuga é a arte. Eu uso a arte como forma de remédio. Ela acaba sendo remédio pra mim, né? Ela acaba me deixando mais em paz, mais feliz", diz.
O artista de São Bernardo do Campo é paciente do Capes há mais de dez anos. Ele compõe o Núcleo de Trabalho e Arte de seu município, um programa da Rede de Atenção Psicossocial que atualmente atende cerca de 83 usuários.
Édson começou a pintar na infância. Mas a criação de uma linguagem artística veio somente com sua reabilitação psicossocial.
"A minha arte hoje é voltada para a saúde mental. Antes eu pintava só paisagem, cavalos, borboletas, flores. Eu pintava de uma forma mais acadêmica. Quando eu entrei na saúde mental, eu comecei a fazer uma arte mais voltada para a psiquê humana, para as questões olíricas dos sonhos. Então uma coisa mais voltada para a mente, para o superego. Essas coisas da psicologia", conta.
Quem orienta e constrói junto com os usuários no Ateliê Livre é a educadora Sueli Bonfim. Para ela, quando se dá liberdade, eles contam histórias.
"A arte tem que ser do interior para o exterior. Ela não pode ser assim uma coisa que tem que ter um tema. Não é isso. É o que você quiser. E é dentro dessa liberdade que se constrói o trabalho individual", afirma.
Na década de 1980, a Reforma Psiquiátrica começava a transformar o modelo sombrio dos manicômios e introduzir a atenção psicossocial no país.
O processo de extinguir o modelo de tratamento desumano baseado no eletrochoque, na prisão, tortura e exclusão dos usuários também defendia a prática do cuidado através da arte. Era o que pensava Nise da Silveira, que guiou o movimento.
Curadora do museu Bispo do Rosario, antigo Nise da Silveira, Diana Kolker diferencia a arte hoje e nos tempos sombrios dos manicômios.
"Eles tinham um direcionamento, um entendimento do que é a arte, do seu papel, muito diferente do que a gente entende e pratica hoje. Então, se estimulava uma uma reprodução, se estimulava a cópia a partir de modelos do que é belo, do que é a ordem, numa lógica europeia e academicista. E essa produção ela funcionava muito como uma espécie de propaganda dessa instituição desse modelo", explica.
O Atelier Gaia surge nesse contexto, na antiga Colônia Juliano Moreira, zona oeste do Rio de Janeiro. O projeto tem origem no Museu Nise da Silveira, atual Museu Bispo do Rosário.
Atualmente integram o Atelier Gaia os artistas André Bastos, Arlindo Oliveira, Clovis Aparecido, Leonardo Lobão, Luiz Carlos Marques, Patrícia Ruth, Pedro Mota, Victor Alexandre, Rogéria Barbosa e Sebastião Swayzzer.
O espaço é gerido coletivamente pelos artistas com o apoio e acompanhamento da curadoria geral e pedagógica do Museu.
"Os meios culturais, a arte, ela foi, ela é, fundamental para a reforma psiquiátrica e ela segue sendo fundamental pra gente romper com os estigmas em torno dessa ideia, dessa noção do que é a loucura, o sofrimento psíquico", afirma Diana.
Edição: Letícia Viola