A Alemanha registrou no ano passado o recorde de 55.048 crimes com motivação política, informou nesta terça-feira (10/05) o Departamento Federal de Investigações (BKA, na sigla em alemão).
O número representa 23% a mais do que em 2020 e é o maior em 20 anos, desde que esse tipo de dado passou a ser registrado, em 2001. Além disso, também foi a primeira vez que a marca de 50 mil foi ultrapassada.
Embora grande parte dos crimes tenha relação com extremistas de direita e de esquerda, segundo Holger Münch, presidente do BKA, o recorde se deve principalmente ao aumento significativo de novos crimes politicamente motivados que não podem ser atribuídos a essas duas categorias clássicas - como o fenômeno dos pensadores laterais ou dos negacionistas da pandemia de coronavírus.
Para Münch, apesar de as origens desse tipo de crime serem "mais difusas e diversificadas", eles não são menos perigosos para a convivência pacífica. Com 21.339 casos registrados, eles agora representam quase 40% de todos os crimes politicamente motivados – especialmente durante protestos contra o coronavírus ou eventos eleitorais. Foram contabilizadas nove tentativas de homicídio e dois homicídios consumados, entre eles o de um funcionário de um posto de gasolina em Idar-Oberstein, que foi baleado após pedir que um cliente usasse máscara.
Segundo a ministra alemã do Interior, Nancy Faeser, "os crimes politicamente motivados são um indicador da intensidade dos conflitos sociais".
"Devemos proteger a nossa democracia com todas as nossas forças", acrecentou a ministra em Berlim, durante a apresentação das estatísticas nesta terça-feira.
Extrema direita segue sendo principal ameaça
Apesar de uma leve queda nos casos em relação ao ano anterior, tanto Faeser quando Münch acreditam que os crimes cometidos por extremistas de direita ainda são o principal desafio a ser enfrentado.
Isso porque, entre os 3.889 crimes violentos cometidos em 2021, 41% das vítimas foram atacadas por perpetradores com antecedentes extremistas de direita. No caso de crimes com antecedentes antissemitas, houve um aumento de quase 29%, para mais de 3 mil casos.
"É uma vergonha para o nosso país a quantidade de agitação antissemita e o desprezo pelos seres humanos que ainda hoje se espalha", disse Faeser. "Estamos conscientes da nossa responsabilidade de lutar contra o antissemitismo com todas as nossas forças e de proteger os judeus", garantiu a ministra.
Apesar de ainda altos, o número de crimes atribuído a ideologias de extrema esquerda caiu cerca de 8% em relação ao ano anterior, para 10.113, e os de extrema direita caíram cerca de 7%, para um total de 21.964.
Cerca de três quartos das infrações dizem respeito a danos materiais, difusão de propaganda, insultos e incitação ao ódio. Atos de violência, por outro lado, variam de lesões físicas a homicídios.
Além disso, segundo Münch, o número de crimes politicamente motivados na Alemanha duplicou nos últimos dez anos. Para ele, os dados refletem "o aumento das tensões sociais e as consequentes tendências de polarização e radicalização em parcelas da população".
Relações com extremismo de direita
Embora não classificados como crimes cometidos por extremistas de direita, muitos dos perpetradores de crimes relacionados com a pandemia de covid-19 ou contra judeus têm ligação com esse grupo.
O presidente do Conselho Central dos Judeus na Alemanha, Josef Schuster, vê a pandemia como um "combustível" que acelerou o fogo, ou seja, radicalizou uma proporção alarmantemente grande da população. "Precisamos de mais educação para a democracia nas escolas e mais apoio às iniciativas da sociedade civil", disse.
Várias iniciativas de combate à violência criticam os números do BKA, afirmando que eles são subestimados.
"Vemos com preocupação que a violência de direita está sendo subnotificada", disse Robert Kusche, da Associação de Centros de Aconselhamento para Vítimas de Violência de Direita, Racista e Antissemita (VBRG). Para ele, muitos incidentes não são atribuídos ao extremismo de direita, embora a associação acredite que eles pertençam a esse grupo.
O BKA registrou um total de 9.201 ofensas criminais relacionadas à pandemia de coronavírus – um aumento de cerca de 158% em relação ao ano anterior. Em relação aos crimes na área eleitoral, o aumento foi de 420%. Neste último caso, os mais de 10 mil crimes envolveram principalmente insultos e danos à propriedade.