O coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Bacelar, foi ao twitter nesta quarta-feira (25) fazer um alerta: “O Brasil corre o risco de desabastecimento de diesel no início do segundo semestre.”
Segundo Bacelar, o problema decorre da escassez do combustível no mercado internacional e do baixo nível dos estoques mundiais. Pode afetar o Brasil justamente quando caminhoneiros estiverem mobilizados para escoar a safra de grãos rumo a portos, período de maior consumo de diesel.
O Brasil corre o risco de desabastecimento de óleo diesel no início do segundo semestre deste ano, em função da prevista escassez de oferta no mercado internacional e do baixo nível dos estoques mundiais.
— Deyvid Bacelar (@deyvidbacelar) May 25, 2022
Bacelar afirmou que tal escassez tem relação com a guerra entre Rússia e Ucrânia. Lembrou, contudo, que o Brasil poderia estar imune a esse efeito do conflito já que é autossuficiente na produção de petróleo, matéria-prima do diesel, e tinha projetadas as refinarias necessárias transformar o óleo em combustível.
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Acontece que tudo mudou desde a Lava Jato e o golpe que destituiu a então presidenta Dilma Rousseff (PT), em 2016.
Após o impeachment de Dilma, já durante o mandato do presidente Michel Temer (MDB), a Petrobras decidiu reduzir seus investimentos em refino. Também adotou uma política de preços para aumentar sua lucratividade e abrir espaço para que importadores ampliassem sua participação no mercado nacional de combustível.
Isso, de fato, ocorreu. Em 2021, a Petrobras obteve o maior lucro de sua história: R$ 106 bilhões. Por outro lado, sua participação no mercado brasileiro de diesel também nunca mais foi a mesma, beneficiando as importadoras multinacionais.
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Em 2016, a Petrobras abastecia 77% da frota de caminhões do país com seu combustível. Em 2017, o percentual caiu para 67%. Recuperou-a partir de 2017. Em 2021, no entanto, ainda estava em 74% – ou seja, abaixo do nível de seis anos atrás e bem abaixo do que poderia estar caso investimentos não tivessem sido interrompidos.
“A obra da Refinaria Abreu e Lima (Rnest), em Pernambuco, parou pela metade por conta da Lava Jato. Tínhamos refinarias planejadas para o Ceará e Maranhão. O Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) também parou”, listou o economista Cloviomar Cararine Pereira, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). “Todas elas estariam focadas na produção de diesel.”
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“A Lava Jato proibiu a Petrobras de contratar as grandes empresas nacionais para conclusão dessas obras”, complementou Bacelar, da FUP. “Teríamos como atender nossa demanda se isso não tivesse ocorrido.”
Chantagem por preços
Dados da Agência Nacional do Petróleo (ANP) indicam que cerca de 20% do diesel consumido no Brasil hoje é importado. Isso significa que o país está hoje parcialmente vulnerável a crises internacionais de abastecimento, como a causada pela guerra.
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Para além disso, significa também que se os importadores pararem de trazer diesel para o Brasil por uma decisão unilateral, o risco de escassez tornaria uma realidade. E as empresas do ramo, que só ganharam relevância por conta de decisões tomadas pelo governo e a Petrobras, sabem disso.
Hoje, inclusive, usam essa dependência para pressionar o próprio governo contra uma mudança na política de preços da Petrobras e redução do diesel, por exemplo. Argumentam que, se o governo desvincular o preço do combustível do dólar, ficaria inviável para elas importar o necessário para suprir a demanda do país. Levando isso em consideração, o governo diz que a Petrobras não pode mudar seus preços.
“É uma baba [jogo de futebol] combinado”, disse Bacelar, em entrevista ao Brasil de Fato. “As importadoras pedem a manutenção dos preços altos para garantir o abastecimento. O governo mantém os preços altos para garantir o lucro dos importadores e dos acionistas da Petrobras.”
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Petrobras apoia importadores
No início de maio, quando a diretoria da Petrobras reuniu-se com investidores para apresentar os lucros da empresa durante o primeiro trimestre do ano, o risco de abastecimento do diesel no Brasil foi debatido. Na ocasião, a diretoria da empresa afirmou que o tema era sensível pois os estoques mundiais do produto estavam realmente baixos.
Durante a conferência, o então presidente da empresa José Mauro Coelho – demitido pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) na última segunda-feira após ficar pouco mais de um mês no cargo – afirmou que a Petrobras manteria sua política de preços para garantir o abastecimento do mercado nacional.
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Bolsonaro tem reclamado publicamente dos preços, mas ainda não tomou uma atitude concreta para que a Petrobras, que é controlada pelo governo, baixe a gasolina e o diesel.
Nesta quarta-feira (25), o conselho de administração da empresa reuniu-se para, entre outras coisas, discutir a chamada paridade de preços de importação (PPI). Ainda não houve sinalização de que essa política será alterada, apesar dos pedidos de diversos setores da população.
"A política de preços da Petrobras está esmagando a classe média e deixando os pobres cada vez mais pobres", já disse Wallace Landim, o Chorão, caminhoneiro e presidente da Associação Brasileira de Condutores de Veículos Automotores (Abrava).
Edição: Felipe Mendes