Muita gente da minha terra, no sul de Minas, foi mandada para o hospício de Barbacena
Recentemente, o sujeito que colocaram como presidente da República vetou o nome da psiquiatra alagoana, Nise da Silveira, no livro dos heróis e heroínas da Pátria.
Ela é considerada uma grande defensora da não utilização de métodos violentos que não adiantam nada no tratamento de doenças mentais.
Ela estudava e defendia métodos mais humanizados para o tratamento, inclusive a arte.
Era de esperar, afinal, o cara gosta de violência e tem horror a qualquer coisa que signifique humanização. E odeia arte também.
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Um dos locais mais bárbaros no tratamento desses doentes era o hospício da cidade de Barbacena, em Minas Gerais.
Muita gente da minha terra, no sul de Minas, foi mandada pra lá.
E eu vou contar uma historinha interessante aqui.
Um dia, não sei quem, não sei se prefeito ou juiz de direito, decidiu mandar pra lá um doido (vou usar essa palavra aqui sabendo que não é bem vista, mas é que usavam).
Chamava-se Julinho. Como ele estava em uma fase calma, mandaram só um soldado, o Zé, levar o Julinho para Barbacena, em um trem noturno que saia de Jureia, vila próxima a minha terra.
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Só os dois viajavam no vagão e Julinho resolveu peitar o soldado.
Deu-lhe uns tapas e o obrigou trocar de roupa.
O soldado pensou que chegando ao hospício esclareceria tudo, mas chegando lá, Julinho fardado se apresentou como sendo o soldado e disse que estava levando Julio de tal , como informaram por telegrama.
Na época muita gente nem tinha documento. Estes locais nem pediam. Enquanto cuidavam da burocracia o soldado chamou o enfermeiro e disse:
- O soldado sou eu, ele que é o doido.
E o enfermeiro falou:
- Tá bom!
Mas não tomou nenhuma providência. Ele insistiu, começou a ficar bravo e colocaram uma camisa de força nele e deram-lhe uma injeção do tipo "sossega leão".
Foi internado e Julinho caiu no mundo.
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Cada vez que o Zé Soldado protestava levava choque e mais injeções.
Um mês depois, como o policial não tinha voltado, um cabo da PM foi a Barbacena tentar saber o que tinha acontecido.
No hospício constava que Julinho estava internado e o Cabo foi falar com ele para saber se ele tinha ideia do que aconteceu com Zé Soldado.
Encontrou o Zé totalmente confuso, já quase acreditando que ele era o doido e o Julinho era o soldado.
Se a Nise da Silveira tratasse as pessoas assim como tratavam no hospício, certamente seria homenageada pelo coisa, né?
*Mouzar Benedito é escritor, geógrafo e contador de causos. Leia outros textos.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Douglas Matos