democracia em risco

Trump orquestrou "tentativa de golpe" nos EUA, aponta comissão parlamentar

Investigação sobre invasão do Capitólio vê ex-presidente no "centro da conspiração" para "derrubar o governo"

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Para a vice-presidente da comissão, a republicana Liz Cheney, Trump "acendeu a chama" do ataque ao Congresso dos EUA - Reprodução/Flickr

A comissão parlamentar que investiga a invasão ao Capitólio responsabilizou o ex-presidente americano Donald Trump pelo ataque, classificando os acontecimentos como uma "tentativa de golpe". Os investigadores argumentaram que o ataque, que ocorreu em 6 de janeiro de 2021, foi resultado das repetidas e infundadas acusações – feitas por Trump – de fraude após as eleições presidenciais.

Após um discurso incendiário de Trump, que não aceitava a derrota no pleito de novembro de 2020, uma turba de extremistas de direita invadiu, ocupou e depredou a sede do Congresso dos EUA, considerado o coração da democracia americana, deixando um saldo de cinco mortos e dezenas de feridos. Na ocasião, os membros do Congresso estavam reunidos para oficializar a vitória do democrata Joe Biden nas eleições presidenciais.

O resultado da investigação aponta que, na época, Trump estava "no centro da conspiração". De acordo com o presidente da comissão, o democrata Bennie Thompson, a violência não ocorreu de maneira acidental.

"[O dia] 6 de janeiro foi o auge de uma tentativa de golpe – uma tentativa descarada, como disse um desordeiro pouco depois – para derrubar o governo. A violência não foi um acidente", afirmou Thompson.

Para a vice-presidente da comissão, a republicana Liz Cheney, Trump "acendeu a chama desse ataque". 

"Aqueles que invadiram nosso Capitólio e lutaram por horas contra a aplicação da lei foram motivados pelo que o presidente Trump lhes disse: que a eleição foi roubada e que ele era o presidente legítimo. (...) O presidente Trump convocou a multidão, reuniu a multidão e acendeu a chama desse ataque", acusou Cheney.

"A democracia continua em perigo", advertiu Thompson. "A conspiração para frustrar a vontade do povo não acabou. Há aqueles que têm sede de poder neste país, mas não têm amor ou respeito pelo que tornam os EUA grandes."

Formada por nove membros do Congresso americano – sete democratas e dois republicanos – a comissão iniciou os trabalhos há quase um ano. Cerca de 140 mil documentos foram analisados, e mais de mil testemunhas, entrevistadas.

Muitos parlamentares republicanos – membros do partido de Trump – minimizaram a investigação e os tumultos. Sem sucesso, o partido tentou contestar a legitimidade do processo, principalmente devido ao fato de a comissão ser composta por sete democratas e dois republicanos moderados, o que excluiu qualquer político que tenha votado contra a certificação da vitória de Biden.

A audiência e as testemunhas

Na primeira das várias audiências, foram exibidas imagens inéditas dos tumultos e da posterior invasão ao Congresso. Numa delas, a multidão pede que o então vice-presidente, Mike Pence, fosse "enforcado". Na sequência, um manifestante aparece lendo tuítes de Donald Trump com um megafone.

As audiências também tiveram vídeos inéditos de depoimentos de familiares de Trump e de alguns de seus colaboradores mais próximos – a maioria deles foi entrevistada de maneira remota.

Bill Barr, ex-procurador geral dos Estados Unidos, foi um dos primeiros a ser ouvido. Ele disse que, na época, alertou Trump que as alegações de fraude não tinham base.

Em áudio, o general Mark Milley testemunhou que o ex-vice-presidente, Mike Pence, pediu o envio de militares e da guarda nacional para os arredores do Capitólio a fim de reprimir a confusão, e não Trump. O chefe da equipe de Pence reforçou que o ex-vice-presidente é leal à Constituição, e não a Trump.

Além disso, os vídeos apresentados pela comissão mostraram imagens de pessoas saindo às pressas e correndo do gabinete do então líder da oposição da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, Kevin McCarthy.

A ex-conselheira do governo americano, Ivanka Trump, filha do ex-presidente, disse em seu depoimento que não acredita nas alegações de fraude eleitoral feitas pelo seu pai. O genro de Trump e igualmente ex-conselheiro do governo, Jared Kushner, também depôs.

Policial e documentarista relembram o 6 de janeiro

A policial Caroline Edwards, agredida durante a invasão, também testemunhou. Ela teve ferimentos na cabeça após cair nos degraus do Capitólio e, por isso, falou em "literalmente sangue, suor e lágrimas... Derramados naquele dia, defendendo o prédio onde passei incontáveis feriados e fins de semana trabalhando". Edwards também disse que foi ofendida nos dias seguintes ao tumulto.

O documentarista britânico Nick Quested, que estava acompanhando a movimentação do grupo de extrema direita Proud Boys naquele dia 6 de janeiro, também prestou depoimento. Ele disse que ficou "surpreso com o tamanho do grupo, a raiva e as ofensas [desferidas por seus membros]".

Pelo menos mais cinco audiências ocorrerão ao longo do mês de junho. A comissão não informou o que efetivamente planeja fazer após essas audiências, mas mais uma apresentação e um relatório final são esperados até o fim deste ano.

Para Biden, Constituição foi violada

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, que participa da Cúpula das Américas, em Los Angeles, comentou que os espectadores das audiências veriam "muitos detalhes pela primeira vez".

"Acredito que foi uma violação clara e flagrante da Constituição", disse Biden.

Trump, por sua vez, repetiu as alegações de fraude e questionou a legitimidade das investigações.

Em sua própria rede social, ele classificou a invasão do Capitólio como "o maior movimento da história de nosso país, a fim de fazer a América grande novamente".