Ele prometeu ir a pé até a Basílica de Aparecida se não fosse convocado
De vez em quando falo de algumas pessoas que fazem promessas esperando que um santo ajude a resolver seus problemas.
Meu avô por parte de mãe fazia promessas direto, mas era para as filhas e os filhos cumprirem. Assim é fácil, né?
Já falei dele aqui, uma vez. Filhas e genros se viam na obrigação de cumprir as promessas malucas deles, desde dar um nome esquisito a um filho a passar um tempão sem fazer alguma coisa que gosta ou fazendo o que não gosta.
Hoje vou falar de um amigo jovem.
Eu já morava em São Paulo, fui passar férias na minha terra, e um amigo, o Tião, quis me convencer a compartilhar uma promessa que tinha feito. Tinha medo de ser chamado para servir o Exército, morria de medo de ser convocado. Na minha terra todo mundo tinha horror a isso. Ele prometeu ir a pé até a Basílica de Aparecida se não fosse convocado.
Livre da convocação, tinha que cumprir o que prometeu, mas queria me incluir nessa história. Eu falei que não tinha nada com isso e não ia gastar as minhas férias para cumprir promessa dele, ainda mais isso de andar mais de 300 quilômetros a pé. Pulei fora.
Ele não desistiu e tentava me convencer, falando que seria divertido. Ia ser uma farra. Em cada final de tarde, a gente pararia pra dormir numa cidade e aproveitaria pra cair na gandaia.
Continuei não querendo e ele, falou de outras coisas que a gente ia aprontar:
⸻ Eu já fui de caminhão até lá. Vi que tem muita plantação de abacaxi no caminho. A gente vai roubando abacaxi... E tem muita laranja, banana, melancia...
Gosto muito dessas frutas, mas não topei e ainda perguntei pra ele:
⸻ Mas será que a santa vai gostar desse jeito de cumprir a promessa que fez pra ela?
Sem me convencer, andou chamando outros amigos para encarar a viagem, de vários dias, a pé, mas ninguém topava. Andar semanas a pé? Tá louco?
Me contaram que um rapaz farrista acabou topando. Voltaram de ônibus.
Logo depois da chegada, ele foi confessar e o padre lhe deu uma penitência enorme. Passou horas rezando.
E pior: o padre lhe disse que não valeu, ia ter que fazer a viagem de novo. Sem gandaias nem roubo de frutas. Não sei se cumpriu.
*Mouzar Benedito é escritor, geógrafo e contador de causos. Leia outros textos.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Douglas Matos