Além de saudáveis esses alimentos vêm de técnicas que mantém a floresta de e fomentam economia local
A cidade de Altamira, no Pará, é marcada por uma série de problemas socioambientais, como a violência, a pobreza, a explosão populacional e a poluição dos rios causada pela construção da usina hidrelétrica de Belo Monte.
Mais de 10 mil famílias foram removidas de seus territórios, segundo dados do Movimento dos Atingidos por Barragens e do Instituto Socioambiental e realocadas na área urbana de Altamira.
Após mais dez anos do início do processo de remoção dessas populações que viviam às margens do rio Xingu da pesca e da agricultura por gerações, elas vivem hoje um quadro de insegurança alimentar.
Com objetivo de contribuir com o combate à fome, surgiu o projeto Agrocestas do Xingu, com alimentos agroecológicos de reservas extrativistas locais que serão distribuídos em bairros periféricos de Altamira. A iniciativa dos jovens ocorre em parceria com o SOS Amazônia e com a Fundação Amazônia Sustentável.
Gabriel Santos, de 16 anos, criador do grupo Jovens Pelo Futuro do Xingu, fará a entrega das cestas nos próximos dois meses com produtos da floresta. “O projeto agrocestas do Xingu é uma ação de combate a insegurança alimentar e incentivo à agroecologia, agricultura familiar e os alimentos orgânicos. Durante a pandemia nós vimos crescer a fome no Brasil, e observamos que também na nossa região”, explica.
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No Norte brasileiro 71,6% das famílias sofrem algum tipo de insegurança alimentar, de acordo com o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil.
Gabriel ressalta que é importante olhar pelo viés da cultura alimentar, porque a maior parte dessa população que foi reassentada, morava em áreas próximas ao Rio Xingu e tinha a alimentação intimamente ligada ao rio.
“Uma das condicionantes que não foi cumprida foi essa questão da distância dos Reassentamentos Urbanos Coletivos (RUCs) do rio. E isso prejudicou demais a alimentação, o modo de vida. Essa população pescava não só para se alimentar, mas também para vender e comprar outros alimentos, e tinha também as famílias que viviam em ilhas, em áreas rurais que produziam alimentos e vivia daquilo que plantava e que hoje não tem a mesma chance dentro de um RUC”.
Sementes amazônicas
Nascido em Altamira, Gabriel conta que as primeiras ações foram em 2019 em que mais de 11 mil litros de lixo recolhidos no Rio Xingu. Cerca de 21 jovens participam do coletivo. Gabriel acredita que para mudar o cenário da insegurança alimentar não basta apenas um projeto, mas é preciso política pública para o enfrentamento do problema.
Um dos participantes do projeto é Felipe Azevedo, 23 anos, que mora em Altamira e se engajou na causa socioambiental para contribuir para mudar a sua realidade. Ele ressalta que a juventude ficou invisibilizada e não teve voz diante da instalação desses grandes empreendimentos.
“Temos um contexto em que a juventude não assume o protagonismo em lutas que devem ser a sua pauta, o seu lugar de fala. Então eu me engajei com objetivo de trazer protagonismo a essas lutas, que são nossas. E também para engajar novas pessoas e trazer luz aos problemas da nossa região”.
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O jovem explica que o projeto Agrocestas do Xingu tem o objetivo de promover a economia local, a justiça social e mitigação dos efeitos da fome da pandemia.
“Além de serem alimentos saudáveis sem uso de agrotóxicos e que usam técnicas que não derrubam a floresta, usar esses produtos vindos das reservas extrativistas movimenta a economia local e fomenta a expansão da produção desses extrativistas que são os protetores da floresta e da biodiversidade”.
Serão distribuídas quase três toneladas de alimentos que fazem parte da cultura alimentar desta população: inhame, macaxeira, banana, entre outros produtos da floresta.
Outro projeto é a 'Escola Pelo Futuro do grupo Jovens Pelo Futuro do Xingu', um projeto de educação ambiental voltado para o público infantil que vive nos Reassentamentos Urbanos Coletivos (RUCs). A ideia é resgatar a memória dessas crianças em relação a convivência com a natureza, os impactos socioambientais em Altamira e contribuir para que no futuro elas também sejam ativas e engajadas na conservação da Floresta Amazônica.
Edição: Douglas Matos