A Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) aprovou nessa quarta-feira (28), em regime de urgência, o Projeto de Lei (PL) que cria o Programa Estadual de Regularização de Terras. Foram 48 votos a favor, 15 contrários e 2 abstenções. Ao fim da votação, a deputada Marcia Lia, líder do Partido dos Trabalhadores na Casa, afirmou que a oposição entrará na Justiça contra o projeto.
"Estamos muito chateados com a aprovação desse projeto, mas a correlação de forças na Alesp é muito desigual, tanto que apenas 15 deputados votaram contra o texto", disse a deputada. "Mas não temos dúvida de que esse PL é inconstitucional, por isso vamos entrar na Justiça contra essa aprovação", afirmou.
Segundo fontes do PT ouvidas pelo Brasil de Fato, um dos motivos que embasam a judicialização do tema é que toda proposta que envolva dispor bem público deve ser de iniciativa do Executivo, condição não cumprida pelo PL 277/2022. Ele é de autoria de alguns deputados, entre eles, Vinicius Camarinha (PSDB), o líder do governo estadual na Alesp.
O outro motivo é que o assunto ja teria sido discutido e vetado pelos deputados. Em fevereiro, ele foi excluído do PL 410 mas retornou inserido dentro do PL 277. Pelas regras da Casa, uma matéria não pode ser rediscutida dentro de uma mesma legislatura.
O texto atual autoriza que o governo, por meio da Secretaria da Fazenda do Estado, faça a regularização fundiária de terras públicas, concedendo títulos em áreas acima de 15 módulos (medida em hectares definida por cada município).
"Aprovar esse projeto significa um retrocesso a avanços que foram feitos por Monteiro e Covas, que permitiram melhores condições aos pequenos agricultores. O que estão fazendo é entregar terras para o agronegócio, que já tem seus recursos, não precisa de ajuda", afirmou o deputado Paulo Fiorilo (PT).
Carlos Gianazzi (PSOL) também lamentou a aprovação. "É inacreditável que a Alesp, no apagar das luzes do segundo semestre, aprove um projeto requentado como esse. Já tentaram aprovar essa proposta no PL 410, que foi derrotado. Eles, não contentes, voltaram com o projeto, que foi aprovado à toque de caixa nas comissões", disse. "No momento que 33 milhões de brasileiros passam fome, o governador Rodrigo Garcia quer entregar terras ao agronegócio".
Para o Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a lei institui a legalização da grilagem de terras, já que prevê que até 1 milhão de hectares de terras públicas devolutas do estado de São Paulo possam ser repassadas para fazendeiros e empresas do agronegócio. A maioria delas está na região do Pontal do Paranapanema.
"É vergonhosa a decisão da casa de regularizar a grilagem de terras no estado de São Paulo, por isso vamos fazer uma grande batalha judicial, porque é uma lei inconstitucional", afirmou Delwek Matheus, dirigente estadual do MST em São Paulo. "A lei vai trazer um grande recuo para a reforma agrária, para a luta pela terra, vai afetar a produção de alimentos, a geração de trabalho e renda no campo, trazer mais problemas ambientais, todo o conjunto de problemas do agronegócio e da monocultura".
Sem reforma agrária
Até a aprovação desse projeto, a Lei Estadual 4.957 determinava que o governo paulista tinha o dever de incorporar essas áreas ao seu patrimônio público e destiná-las para assentamentos da reforma agrária.
A legislação anterior contrariava o pensamento do governador paulista, Rodrigo Garcia (antes DEM, hoje PSDB), que assumiu o cargo com a saída de João Doria (PSDB). Pré-candidato à reeleição, ele busca angariar apoio de setores como o agronegócio, que disputa com o pré-candidato Tarcísio de Freitas (Republicanos), apoiado por Jair Bolsonaro (PL).
Rodrigo Garcia esteve no Pontal do Paranapanema em maio e defendeu o PL 277, dizendo que por meio dele centenas de propriedades rurais serão regularizadas. “A reforma agrária não deu certo no Brasil”, afirmou: “E se depender de mim, acabou”.
Em um contexto em que cerca de 33 milhões de pessoas no Brasil estão passando fome, isso significará, alerta o movimento, "uma diminuição da produção de alimentos em detrimento do avanço da produção de commodities".
Edição: Rodrigo Durão Coelho