Em pouco mais de 80 dias serão realizadas as eleições para presidente, vice-presidente, governador, senador e deputados federais e estaduais no Brasil. Diante de questionamentos, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) convocou missões de observação internacional para certificar a transparência do processo.
O poder eleitoral também aceitou responder uma lista de dúvidas e recomendações das Forças Armadas, enviadas fora do prazo previsto, para "aprimorar o sistema eleitoral".
O presidente do TSE, Edson Fachin, afirma que "há condições fundamentais" para evitar um episódio similar à invasão do Capitólio dos Estados Unidos no Brasil. Um grupo de seis congressistas democratas propôs uma emenda ao orçamento de defesa estadunidense para 2023, prevendo a suspensão da cooperação em matéria de defesa e segurança caso haja interferência dos militares no resultado eleitoral.
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O Brasil foi um dos primeiros países a automatizar o seu sistema eleitoral. Em 1996, começando com cerca de 50 municípios e, em 2009, o TSE chegou a ser premiado pelo bom funcionamento do sistema eleitoral pela George Washington University e a Business Software Aliance (BSA).
O sistema adotado no Brasil é líder em agilidade na contagem e divulgação dos votos, sendo aprovado por 94,4% dos brasileiros, segundo pesquisa realizada pelo Instituto Sensus. A urna eletrônica é um microcomputador composto de dois terminais: o terminal do mesário, onde o eleitor é identificado e autorizado a votar e o terminal do eleitor, onde é registrado numericamente o voto.
Com a circulação de notícias falsas no contexto das campanhas eleitorais, em 2019, o TSE criou o Programa de Enfrentamento à Desinformação com partidos políticos e entidades públicas e privadas.
A ONG Transparência Eleitoral é uma das entidades da sociedade civil que realizam um escrutínio independente das eleições no Brasil e acompanharam a implementação do programa de combate à desinformação.
Ana Cláudia Santano é advogada, especialista em direito constitucional e democracia, coordena a ONG Transparência Eleitoral, que reúne especialistas em sistemas eleitorais. Foi uma das fundadoras da Academia Brasileira de Direito Eleitoral (Abradep) e neste ano é uma das observadoras acreditadas com o Tribunal Superior Eleitoral.
Em entrevista ao Brasil de Fato, a coordenadora geral da ONG Transparência Eleitoral analisa os desafios das eleições gerais de 2022 no Brasil.
Brasil de Fato: O Tribunal Superior Eleitoral tem respondido a distintos questionamentos sobre a credibilidade da urna eletrônica. Esses apontamentos têm base material? O sistema eleitoral brasileiro é vulnerável a fraudes?
O sistema eleitoral passa por diversas etapas de auditoria. Até hoje não foram verificadas fraudes e também não há indícios disto. Todos os resultados das auditorias são públicos. Chamo atenção para o último teste, que é o TPS: teste público do software da urna eletrônica.
Até as eleições ainda serão realizados vários outros testes.
Você já participou de distintas missões de observação, inclusive nas últimas eleições da Colômbia, qual é a principal tarefa do observador (a) eleitoral?
A função do observador é observar os fatos e colher dados, sem emitir opinião. Ele(a) acompanha as etapas do processo eleitoral, tanto a campanha, como o dia da votação e o pós-eleição, sempre com foco na coleta de dados, de acordo a uma metodologia.
Geralmente há formulários para cada etapa do processo eleitoral e a partir destes dados são elaborados relatórios. A observação eleitoral deve ser neutra, imparcial, independente e objetiva, pautada em dados.
O observador analisa se a eleição aconteceu dentro da legalidade, dentro de um marco de integridade eleitoral: se todos os procedimentos foram realizados de acordo com o previsto em lei.
Por que é importante que o TSE decida convidar missões de observação internacional para acompanhar as eleições de outubro?
Todas as autoridades eleitorais de democracia deveriam contar com missões de observação eleitoral, não só o Brasil, mas todas as democracias, porque é isso que pode oferecer um diagnóstico de problemas que podem acontecer num processo eleitoral.
Geralmente os observadores vão identificar gargalos, por isso é tão importante a postura do TSE de contar com esse suporte para o fomento da integridade democrática.
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O Brasil foi um dos primeiros países da região a implementar a biometria e a urna eletrônica há quase 20 anos. O sistema eleitoral brasileiro pode ser considerado referência na América Latina?
Não me cabem dúvidas: o processo eleitoral brasileiro sempre foi reconhecido por ser muito eficiente, muito avançando. E isso não só na América Latina, é um paradigma internacional.
Não sou só eu que afirmo isso, vários atores de relevância internacional, que conhecem a experiência brasileira e atribuem ao nosso sistema um grande avanço no combate às fraudes que aconteciam com o voto em cédula de papel.
As eleições de outubro deste ano serão o terceiro processo acompanhado por uma missão de observação da OEA. A organização e o seu Secretário-geral receberam críticas por posturas políticas consideradas "intervencionistas" em processos anteriores, na Bolívia e Nicarágua. É possível apoiar-se na missão da OEA para confirmar a lisura do processo eleitoral?
É importante separar as instituições das pessoas, em qualquer caso, porque se não vamos passar a personalizar as instituições. Entendo que as missões da OEA são realizadas com muita técnica, em cima de uma metodologia própria e com resultados que são públicos, estão aí para o escrutínio de todos.
É inegável que muitas missões da OEA fizeram recomendações positivas para que os sistemas pudessem avançar em governança eleitoral em geral. Com certeza essas missões conseguem identificar problemas e realizar recomendações que podem ser muito úteis para cada sistema eleitoral.
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A disseminação de notícias falsas tornou-se um dos principais obstáculos do processo eleitoral no Brasil, sendo um tema de debate desde 2018. Observando a experiência de outros países, quais medidas são efetivas para combater a desinformação?
Nenhum país tem ainda essa resposta, pelo contrário, é um problema que está posto no meio da sala. Acredito que as plataformas tenham um dever muito maior de combate à desinformação do que propriamente os países. As plataformas têm muita responsabilidade no conteúdo que propagam ou no conteúdo que monetizam.
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A função passa por uma moderação mais detalhada de tudo que é difundido nas redes sociais por esses canais de desinformação. Entendo que as plataformas têm um papel fundamental nesse desafio.
Como a integração latino-americana poderia contribuir com o aprimoramento do sistema eleitoral brasileiro?
A integração latino-americana pode contribuir em muitos quesitos com o Brasil. Nós somos latino-americanos, entendo que a integração poderia identificar os mesmos problemas que nossos vizinhos têm e encontrar soluções que já foram pensadas na região e poderiam ser úteis para o nosso país.
Edição: Thales Schmidt