A operação policial que ocorreu no dia 21 de julho no Complexo do Alemão, na zona Norte do Rio de Janeiro, e deixou 19 mortos está entre as incursões mais letais da capital fluminense que passou a bater recordes de mortes nas favelas durante a gestão do governador Claudio Castro (PL). Mas por que a política de segurança pública do confronto direto tem sido cada vez mais adotada pelo governo do estado do Rio?
Para a cientista social e coordenadora da Rede de Observatórios da Segurança do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), Silvia Ramos, a alta letalidade das ações policiais no Rio não é novidade. Segundo a pesquisadora, há uma estrutura que favorece o modus operandi das policias no estado.
"As policiais e as políticas do Rio de Janeiro há 30 anos produzem esses tipos de resposta à chamada 'criminalidade'. Aqui nós tivemos aquela famosa 'gratificação faroeste', em que os policiais eram premiados por bravura com recebimento de dinheiro nos seus salários para o resto da vida se prendessem ou matassem criminosos famosos. Esse foi um momento em que se consolidou dentro das corporações a ideia de que se o opositor for 'bandido', se o opositor for da favela, pobre, negro, das classes populares então você não precisa prendê-lo, mas você pode matá-lo", comenta.
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Quem vive na pele o impacto é a população das favelas. Alan Pinheiro é cofundador do Instituto Raízes em Movimento, organização não governamental sediada no Complexo do Alemão, que há 21 anos realiza ações socioculturais na comunidade. Para ele, as operações causam cada vez mais mortes e afetam diretamente o direito de ir e vir dos cidadãos, contrariando até mesmo a própria justificativa para as incursões apresentada pelas forças policiais para os órgãos de controle.
"Durante o governo de Castro a coisa se intensificou, se deu carta branca, se ampliou o trabalho de opressão, de repressão, é quase que uma autorização para matar e as justificativas vão ao contrário do impacto que ocorre. Para o Ministério Público, eles só justificam em cima da hora e citam o direito de ir e vir do cidadão como se dessem mais garantia de segurança, o que é o oposto", explica Pinheiro que também é doutorando em Planejamento Urbano pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPPUR-UFRJ).
Licença para matar
Para Silvia, há uma relação direta também com o aumento das operações e o ano eleitoral. Na avaliação da cientista social a espetacularização das ações policiais alimenta a base eleitoral do governador.
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"Recentemente, o governador Claudio Castro disse em off para um jornalista conhecido que, se dependesse de pesquisa eleitoral, faria operação policial com morte todos os dias, indicando que ele, governador e candidato, tinha clareza que essas operações espetaculares em que a cidade para e que têm resultado em mortes com números estratosféricos, acabam, do ponto de vista eleitoral, sendo positivas para a base dele", analisa a coordenadora do Observatório.
Ela aponta que é possível exercer a segurança pública com menos violência. "Bastaria ser uma polícia que privilegiasse investigação e desarticulação, inteligência, acompanhamento à distância, sem confronto, interrupção do fluxo de armas e de munições. De quem está sendo comprado isso [armas e munições]? Quais as redes que estão fornecendo? Não é possível que a polícia não consiga interromper isso e nem identificar, mas a polícia espera que as armas entrem, as munições entrem, ela aguarda isso acontecer", afirma.
Para Alan, que vivência o cotidiano da violência do Estado é urgente que a política de segurança pública atrelada a produção de mortes dentro das comunidades seja extinta.
"Precisa ter uma política de segurança centralizada na vida e não na morte. Não há nenhum programa de segurança pública no Rio desde a redemocratização do país, no Rio não há nenhuma mudança estrutural, vivemos a mesma opressão e até mais letal do que durante a ditadura isso acontece de forma contundente nas favelas. Precisamos pensar numa política de segurança em que tenha uma centralidade da vida. Se vai colocar em risco a população e a vida do morador, não deve nem iniciar", defende.
Cadê o controle?
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Dentre as denúncias trazidas pelas organizações que participam do Fórum estão casos de execução sumária, tortura e desaparecimento forçado. Para as entidades, os mecanismos de controle do MP-RJ estão cada vez mais fragilizados, um exemplo disso, segundo o FPOPSEG, foi a extinção, em abril de 2021, do Grupo de Atuação Especializada em Segurança Pública (GAESP), órgão que acompanhava casos de violência letal e de violações de direitos humanos em favelas envolvendo agentes das forças policiais.
"Consideramos, portanto, o fim do GAESP e a negligência com aqueles mais intensamente impactados pelo descontrole das forças policiais como uma demonstração de descaso do Ministério Público. Resultado da falta de compromisso para com o controle externo da atividade policial e a garantia ao direito de sobreviventes e familiares a uma investigação eficaz", diz trecho do manifesto divulgado pelo Fórum.
Fonte: BdF Rio de Janeiro
Edição: Mariana Pitasse