Visão de fora

Colunista do Washington Post alerta para os perigos do centrão para democracia brasileira

Próximo presidente será refém do grupo, que se fortalece cada vez mais, sem ideologia, apenas apetite, aponta artigo

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Ricardo Barros (direita) foi nomeado líder do governo no Congresso após falar em investigar Bolsonaro - Reprodução/Ricardo Barros


Um dos principais jornais do mundo, o estadunidense Washington Post publicou nesse final de semana um artigo de opinião no qual analisa as eleições presidenciais de outubro e conclui que a maior ameaça à democracia brasileira vem do centrão. 

Escrito por Marc Margolis, correspondente por anos no Brasil, o artigo afirma que "a problemática política brasileira não será resolvida por quem quer que assuma a presidência no ano que vem", por estar refém do centrão. Ele define o bloco como "uma amálgama de partidos políticos sem princípios ou lealdades discerníveis, apenas ambições e apetites".

"Quem assumir o cargo em 1º de janeiro enfrenta uma familiar barganha faustiana: fazer um acordo com uma legislatura fragilizada, dominada por essa aliança de oportunistas, ou seguir sozinho e arriscar a governabilidade afundar e talvez o próprio mandato presidencial."

Ele explica que o próximo presidente assumirá com poder reduzido pelo grupo, que é composto por 32 partidos, em um sistema "que beira a incoerência" e é "manipulado para auto-replicação".

"De 1988 a 2018, a lista de partidos do Brasil - um índice composto de votos e assentos no Congresso - quadruplicou."

"O centrão ajudou a arquitetar o impeachment de Fernando Collor de Mello em 1992 e de Dilma Rousseff em 2016. Ambos os presidentes os desprezaram. O centrão também sobreviveu a dois escândalos de corrupção sísmicos – um esquema de propina do Congresso em 2004-2005 e a histórica investigação da Lava Jato de 2014-2021." 

"De forma reveladora, enquanto o ex-magistrado da Lava Jato Sergio Moro caiu em descrédito por abuso judicial, alguns dos principais condenados do centrão viram seus casos anulados e registros apagados." Margolis exemplifica o que chama de "arte de manter presidentes como reféns".

"Em 2019, o parlamentar do centrão Ricardo Barros ajudou a lançar uma investigação no Congresso sobre o suposto papel de Bolsonaro na disseminação de notícias falsas, apenas para ser nomeado líder do governo no Congresso no final daquele ano. Sem surpresa, a investigação acabou fracassando."

O autor afirma que o bloco tem mais poder sobre o orçamento do que se vê em 29 das nações mais ricas do mundo. Por não ter ideologia, é adaptável a qualquer administração. 

"Falar de um golpe iminente perde o ponto. A maior democracia constitucional da América Latina está de fato em apuros – mas não por autoritarismo. O verdadeiro problema é a ameaça no centro."
 

Edição: Vivian Virissimo