Retrocesso. Essa foi a palavra usada por todas as pessoas entrevistadas pela reportagem do Brasil de Fato à respeito da aliança entre Jair Bolsonaro (PL), José Roberto e Flávia Arruda (ambos também no PL) e o atual governador Ibaneis Rocha (MDB) no Distrito Federal.
Em que pese a elegibilidade do ex-governador José Roberto Arruda (PL) ter sido derrubada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), ainda assim, o ex-governador vai ter peso nos palanques eleitorais, avaliam especialistas, ajudando a eleger candidatos conservadores alinhados ao bolsonarismo.
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Para Marco Baratto, da direção do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no DF, Arruda "representa a burguesia, o grande empresariado do DF. Ele é ligado à lógica neoliberal que o sustenta desde os seus escândalos de corrupção. O Arruda fez seu nome na esteirado 'rorizismo'. A esposa dele [Flávia Arruda] também veio nessa esteira. Aliada a Ibaneis e Bolsonaro, em um acordo político de conservadorismo tosco que flerta com o neoliberalismo mas não o é".
"É uma união de representantes oportunistas da elite que usa o povo brasiliense para se perpetuar no poder e prosseguir com seu projeto de dominação e, no caso do governo federal, de morte dos pobres e de seus inimigos. O retrocesso é ainda maior considerando a enorme crise social, econômica e ambiental que estamos vivendo, provocada por esse mesmo grupo que desde o golpe contra a Presidente Dilma afundou o país", afirmou Fábio Miranda, da direção do Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos (MTD-DF).
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Movimentos sociais e de luta por direitos dos trabalhadores ligaram sinal de alerta quando o Planalto azeitou a união entre os atores políticos. Com benção de Bolsonaro, a chapa viria com Ibaneis candidato à reeleição, com Celina Leão (PP), como vice, e Flávia Arruda ao Senado.
Na composição, frustrada pela recente decisão do ministro do STJ, Gurgel de Faria, José Roberto Arruda sairia candidato à Câmara dos Deputados, agregando peso político aos palanques dos aliados.
A derrocada de Arruda o retira oficialmente do páreo – pelo menos por hora, uma vez que o ex-governador aguarda decisão do STF que pode anular sua condenação por improbidade administrativa. Entretanto, os especialistas entrevistados pelo BdF concordam que, mesmo fora do pleito, Arruda vai subir aos palanques para demonstrar força política.
"É inegável o peso político de Arruda, feito nos moldes de Roriz, no cenário político do DF. Mesmo fora do páreo, conforme esperamos que o STF mantenha, ele pode causar grandes estragos nos palanques bolsonaristas e conservadores", avalia o doutor David Verge Fleischer, do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB).
Efeitos da aliança
Michelly Fernandez, pesquisadora do Instituto de Ciências Políticas da Unb (IPOL), ressaltou a estagnação das mazelas sociais do DF, com a manutenção das elites políticas à frente do governo.
"Isso significa a manutenção da realidade social no DF. Apesar de ser a capital federal e dispor de muitos recursos, a gente ainda tem muitos problemas na saúde, educação, assistência social desmantelada. A manutenção das elites no poder é também a manutenção dessa realidade em uma Unidade de Federação que tem um orçamento avantajado e poderia fazer muito pela população, mas que não o faz porque não é de interesse da elite", analisa a professora.
Um exemplo do descaso das elites com a população mais carente, enfatiza Fernandez, é o enfrentamento da pandemia no Distrito Federal. Repleta de escândalos de corrupção envolvendo cargos de alto escalão do GDF, a gestão da pandemia foi o que a pesquisadora chama de "o retrato da gestão Ibaneis".
"Escândalos na abertura de leitos de UTI, UPAs e unidades básicas desassistidas. Um alinhamento com o governo federal que atrasou as ações de enfrentamento, como a limitação da vacinação para alguns grupos. Apesar de todos os recursos dos quais o DF goza, tivemos um enfrentamento complicado e isso é o retrato de como o governo Ibaneis enfrenta os problemas sociais e a perpetuação da política tradicional no DF", encerra.
Para Camila de Caso, da coordenação do Movimento de Trabalhadores Sem Teto (MTST), a aliança de Arruda com Ibanes é a junção do fisiologismo e da corrupção. "Precisamos nos organizar e barrar para que essa aliança não ganhe o governo. Se não, veremos um aprofundamento dos desmontes sociais, da militarização e do bolsonarismo com os esquemas de corrupção e falta de transparência pública. Dois governos que ampliaram as desigualdades sociais, que resultaram em fome e desemprego", destaca.
STF
As atenções de Arruda se voltam para a Suprema Corte nesta quarta-feira (3), quando os ministros vão analisar, em repercussão geral, se a nova Lei de Improbidade pode retroagir para beneficiar quem está condenado e já com os direitos políticos suspensos.
"Não acredito que ele seja liberado para concorrer", prospectou Fleischer.
A defesa do ex-governador também tem se mexido. Em nota, um dos advogados de Arruda afirmou que a decisão de Gurgel foi equivocada e que o ministro, segundo ele, teria revogado a liminar anterior por concluir "que havia repetição de recursos da defesa". A nota termina afirmando que a decisão é uma "filigrana processual descabida e que será impugnada oportunamente, com o que certamente a legalidade será restabelecida".
No último domingo (31) durante a convenção do MDB, Ibaneis e Arruda rasgaram seda um para o outro, dando o tom da campanha da chapa.
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Corrupção
"Não é preciosismo do ministro, se é isso que a defesa de Arruda tenta sugerir. Pelo contrário, as evidências contra Arruda são factíveis. Uma decisão que o beneficiasse significaria um grande retrocesso para o STF", afirma Davi Fleischer.
Arruda foi governador do DF de 2007 a 2010, quando foi afastado do cargo por causa de denúncias de corrupção, sendo o primeiro governador preso no exercício do mandato.
Na época, a Operação Caixa de Pandora revelou que um esquema de superfaturamento nos contratos do GDF com a empresa Linknet Tecnologias e Telecomunicação. De acordo com o Ministério Público Federal, Arruda ficava com 40% da propina.
Um vídeo no qual Arruda era flagrado acomodando dinheiro de propina em sua mala foi o início da derrocada do ex-gestor.
"É um corrupto de carteirinha. Antes disso ele foi envolvido nas fraudes dos painéis de votação no Senado. Ele tem na corrupção a sua lógica política. Ele é pautado pela corrupção e dificilmente isso será superado", pontua Baratto.
"Não é concebível que um político que foi filmado recebendo maços de dinheiro e que foi pego fraudando o sigilo de uma votação do Senado tenha condições de concorrer a qualquer cargo público. É um retrocesso sem tamanho", acrescenta também Miranda, do MTD.
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Fonte: BdF Distrito Federal
Edição: Flávia Quirino