A Justiça da Argentina decidiu liberar nesta terça-feira (13) 12 dos 19 tripulantes do avião venezuelano que está bloqueado no aeroporto de Ezeiza, em Buenos Aires, há mais de três meses.
A decisão foi tomada pela Câmara Federal de Apelações de La Plata, que suspendeu a proibição para deixar o país que pesava sobre esses tripulantes. A instância julgava um recurso apresentado no início de agosto pela procuradora do caso, Cecilia Incardona, contra a decisão do juiz encarregado, Federico Villena, quando ele já havia permitido a saída da tripulação.
Entre os liberados estão 11 venezuelanos e um iraniano. Segundo a Câmara de Apelações, o juiz agora tem dez dias para decidir o futuro dos demais membros.
Retido por decisão judicial desde o dia 8 de junho, o avião de carga Boeing 747 pertence à empresa estatal venezuelana Emtrasur e trazia autopeças para uma fábrica na Argentina.
O bloqueio da aeronave em solo argentino é resultado de um pedido feito por autoridades dos EUA, que alegam que a Venezuela teria "driblado sanções" ao comprar o avião da companhia iraniana Mahan Air, já que ambas as empresas estão sancionadas por Washington.
A Justiça portenha, por sua vez, não encontrou nenhuma irregularidade na aeronave e na tripulação até o momento e justifica a retenção do avião por conta de um tratado de cooperação judicial firmado com os norte-americanos em 1991.
Desde então, os 19 tripulantes - 14 venezuelanos e cinco iranianos, estavam com passaportes retidos e impedidos de deixar o país.
Segundo a decisão da Câmara de Apelações emitida nesta terça-feira, "nem a República Bolivariana da Venezuela e nem a República Islâmica do Irã são partes da investigação" e afirmou que o tribunal de Lomas de Zamora, onde o caso é tramitado, deve tomar uma decisão em dez dias sobre as restrições impostas "contra as pessoas e as coisas".
"A continuação do trâmite desta causa, tal como se encontra documentada, não pode continuar sem um limite temporal claro e assim também o solicita o próprio Ministério Público", informou.
O que está por trás do bloqueio
As primeiras justificativas apresentadas pela Justiça para bloquear a aeronave venezuelana resultaram de alegações feitas por deputados da direita argentina e por associações israelenses do país, que alegavam que alguns tripulantes teriam ligações com o atentado ao prédio da AMIA que ocorreu em Buenos Aires, em 1994, e deixou 85 pessoas mortas.
As acusações se baseiam no fato de que 5 dos 19 membros da tripulação do avião são iranianos. Historicamente, a Argentina, os EUA e Israel acusam o Irã de ter agido em conjunto com o grupo armado libanês Hezbollah na execução do atentado, embora a participação iraniana tenha sido descartada por órgãos de inteligência ao longo das investigações.
A defesa dos tripulantes alega que as acusações são falsas e constituem um "falso positivo" para deter os profissionais.
Além disso, a promotora responsável pelo caso chegou a alegar a existência de suposta ligação de um dos pilotos iranianos com "organizações terroristas". O que a acusação argumentava era que Ghasemi fazia parte do conselho de uma empresa iraniana de aviação de cargas que prestava serviço às Forças Quds, divisão especial da Guarda Revolucionária do Irã, um setor das Forças Armadas iranianas que é considerado unilateralmente por Washington como uma "organização terrorista".
A defesa da tripulação, por sua vez, alega se tratar de um homônimo, ou seja, de duas pessoas com o mesmo nome, e garante que Ghasemi nunca trabalhou para a referida empresa nem prestou serviços ao Exército iraniano.
Para a advogada venezuelana Olga Álvarez, que foi consultada pelo Brasil de Fato em agosto, a detenção da aeronave é ilegal, já que ela não infringiu nenhuma lei argentina ou protocolo internacional e está considerada como irregular apenas pelas sanções unilaterais dos EUA.
"A Justiça argentina se submeteu a leis que são extraterritoriais, que não têm efeito fora dos Estados Unidos, e que além disso respondem a interesses já questionados por organismos internacionais vinculados às Nações Unidas, que classificam as medidas coercitivas unilaterais como delitos de lesa humanidade”, diz.
Edição: Rodrigo Durão Coelho